Manejo do ambiente interno em galpão para frangos de corte. (Foto: Kelle Pardim – Ambiagro/DEA/UFV)

Atualmente, no âmbito do agronegócio brasileiro, vivencia-se uma era de marcada modernização de processos produtivos com transformações tecnológicas, ambientais, sociais e culturais, que envolvem bem-estar animal e produção socialmente justa, atrelados às condições climáticas e amparados em temas como a agricultura e a zootecnia de precisão, a rastreabilidade e a sustentabilidade. Nas práticas agropecuárias há atividades interdisciplinares que necessitam da atuação de diversos profissionais, cujas formações, em sua maioria, estão agrupadas dentro do campo das “Ciências Agrárias”.

Nas práticas agropecuárias há atividades interdisciplinares que necessitam da atuação de diversos profissionais, cujas formações, em sua maioria, estão agrupadas dentro do campo das “Ciências Agrárias”. Um dos importantes cursos desse grupo é o denominado “Engenharia Agrícola”, cujo programa foi criado no Brasil no ano de 1972, primeiramente instalado na Universidade Federal de Pelotas, Rio Grande do Sul, em 1973 e, em seguida, na Universidade Federal de Viçosa, Minas Gerais, em 1974. O programa inicial do curso visava preparar o profissional para aplicar conceitos de engenharia na solução de problemas associados ao meio rural, com vistas à majoração, tanto da produtividade vegetal quanto da animal.

Ao longo do tempo o curso foi sendo instalado em outras instituições brasileiras, sempre à base de modificações curriculares, que visassem adequar a formação profissional às demandas correntes.

Atualmente, no âmbito do agronegócio brasileiro, vivencia-se uma era de marcada modernização de processos produtivos com transformações tecnológicas, ambientais, sociais e culturais, que envolvem bem-estar animal e produção socialmente justa, atrelados às condições climáticas e amparados em temas como a agricultura e a zootecnia de precisão, a rastreabilidade e a sustentabilidade.

Recentemente a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), preocupada com a demanda por alimentos e segurança alimentar mundial em 2050, para uma população estimada em 9,2 bilhões de pessoas, previu os seguintes desafios: aumento de 160% na emissão de gases de efeito estufa, diminuição da área cultivada per capitade 24%, redução de 8% na produtividade agrícola, redução de 33% da biodiversidade e diminuição de 33% na disponibilidade de água para a agricultura.

Com a referida modernização da agropecuária, associada aos respectivos impactos ambientais verificados na atualidade, tornou-se necessário que se incluíssem essas questões, mencionadas anteriormente, nos cursos das Ciências Agrárias.   Antecipando esse cenário, a Universidade Federal de Viçosa (UFV), uma das primeiras instituições brasileiras a oferecer o curso de “Engenharia Agrícola” no seu formato inicial, passou a oferecer, à partir do no ano de 2000, o curso, agora denominado “Engenharia Agrícola e Ambiental”, que em seu novo formato, agregou questões relativas sim à aplicação da engenharia para majoração da produtividade agropecuária, porém, embasada em forte correlação com a integridade ambiental. O Ministério da Educação reconheceu esse novo curso da UFV por meio da portaria 1627, de 03 de junho de 2004.

O Engenheiro Agrícola e Ambiental é, dessa forma, o profissional que desempenha atividades de engenharia  que incluem diagnóstico, planejamento, projeto, avaliação de impactos ambientais e sociais, de sistemas agrícolas e agroindustriais, envolvendo energia, transporte, estruturas e equipamentos, nas áreas de irrigação e drenagem, construções rurais e ambiência, eletrificação, máquinas e implementos agrícolas, agricultura de precisão, mecanização, automação e otimização de sistemas, processamento e armazenamento de produtos agrícolas, tratamentos de resíduos e saneamento. O profissional atua também no controle da poluição, na conservação e planejamento ambiental, na gestão de recursos hídricos, na análise de susceptibilidade e vocações naturais do ambiente, na elaboração de estudos de impactos ambientais, na proposição, implementação e monitoramento de medidas mitigadoras e ações ambientais.
Pode-se considerar a atuação do profissional “Engenheiro Agrícola e Ambiental” nasseguintes áreas: engenharia de água e solo, máquinas e mecanização agrícola, construções rurais e ambiência, energia, meteorologia agrícola, armazenamento e processamento de produtos agrícolas, dentre outras.

Especificamente, considerando a atuação do profissional na produção animal, no que tange às diferentes áreas de atuação, pode-se enfatizar o seguinte:

Engenharia de Água e Solo

A agricultura e a pecuária estão intrinsecamente relacionadas ao indispensável recurso “água”, o qual requer manejo adequado e preservação. Para os animais a água é vital tanto para a dessedentação quanto para a higienização corporal, de utensílios e de instalações. Neste sentido, a água servida deve ser tratada e os efluentes ou águas residuárias devem ser descartados adequadamente. Por muitas vezes, essas águas residuárias resultantes dos processos de produção podem ser manejadas e tratadas de forma a adquirir novas possibilidades de uso, como geração de energia e produção de fertilizantes, ou mesmo de reuso ou recirculação. Na agricultura, com ênfase no cultivo vegetal (plantio e produção) voltado à alimentação dos animais, um dos principais processos envolvidos é a irrigação, que requer rigoroso planejamento e projeto.

Pode-se afirmar que a irrigação representa uma ligação indireta com a produção animal, pois a alimentação dos animais é geralmente conduzida à base de pastagens (volumosos) ou de rações (concentrados), sendo que estas últimas têm como únicos ou principais componentes produtos agrícolas como soja, milho ou sorgo. Tão importante quanto a água é o solo, pois seu manejo (uso e conservação) adequado é fundamental para a produção dos alimentos de origem vegetal, inclusive os destinados aos animais. Há que se considerar ainda que a recuperação de áreas degradadas, muitas vezes pela própria forma de produção animal, é de suma importância para a continuidade do processo produtivo sustentável.

Irrigação por pivô central. (Foto: Catariny Aleman – DEA/UFV)

Mecanização

Com a escassez da mão-de-obra, todo processo produtivo envolve, de alguma forma, o uso da mecanização. Na cadeia da produção animal, as máquinas são usadas nos processos de limpeza e desinfecção de sítios de criação e no transporte de rações, animais, insumos, produtos finais e dejetos. A mecanização é importante para a produção animal pelo fato de compor suporte significativo no processo de produção de grãos e, consequentemente, interferir na utilização destes em rações. Tanto no caso das pastagens, quanto dos grãos, a mecanização interfere também na qualidade dos solos para cultivo e posterior manejo e tratamento dos mesmos, como é o caso da descompactação, conduzida com uso de maquinários específicos e implementos.  Há que se considerar ainda que muitos dos processos de manejo e tratamento de resíduos da produção animal são mecanizados. Outra vertente atual considera que vários processos produtivos da agricultura e pecuária podem ser inspecionados e controlados com o uso de veículos aéreos não tripulados (drones), capazes de coletar e armazenar imagens auxiliares à tomada de decisões. Trata-se de um processo de mecanização associado ao conhecimento específico nas áreas de eletrônica, robótica, automação, climatologia e climatização, agricultura e zootecnia de precisão e inteligência artificial, dependendo do grau tecnológico da unidade de produção.

Revolvimento mecanizado durante compostagem de dejetos de galinhas poedeiras. (Foto: Jadson Rocha– Ambiagro/DEA/UFV)

Máquinas e mecanização agrícola. (Foto montagem: Domingos Sárvio Valente – DEA/UFV)

Construções Rurais e Ambiência

A produção animal eficiente, principalmente aquela em escala comercial, tem sido pautada no emprego de unidades de produção instaladas em áreas devidamente selecionadas, onde primeiramente o mercado consumidor seja conveniente. Em adição, a infraestrutura (água, energia, insumos, assistência técnica, vias de acesso, acesso a crédito, etc.) deve ser propícia, o clima (radiação solar, temperatura, umidade e movimentação do ar, etc.) deve ser adequado às necessidades da espécie e o espaço físico disponível deve apresentar características viáveis de solo e topografia (facilidade para drenagens, escoamentos gerais e circulações).

Depois da seleção da área, segue-se a espacialização das instalações necessárias ao processo produtivo, obedecendo ao espaçamento e orientação das mesmas, às regras de fluxo de pessoas, animais, veículos, insumos e resíduos. Sequencialmente, definem-se as tipologias e passa-se ao dimensionamento de cada uma delas, com base em fluxos internos e em processos específicos e requerimentos ambientais da espécie criada. Questões relativas aos materiais apropriados para cada componente construtiva, que gerem microambientes que atendam aos requerimentos ambientais da espécie criada devem ser consideradas.

Ademais, entender perfeitamente e aplicar técnicas construtivas adequadas são passos que tornam a edificação mais sólida e eficiente no que diz respeito tanto à interação do animal com o ambiente gerado, quanto ao manejo geral que poderá ali se desenvolver.

Ainda como parte do processo de projeto, levando-se em conta que caso não seja possível atingir um ambiente propício, apenas seguindo-se as etapas anteriores ou utilizando-se os meios naturais, pode-se adotar o acondicionamento térmico artificial por meios mecânicos, com base nos requerimentos ambientais da espécie, para uma fase ou idade específica. Ainda, fazem parte deste processo de projeto, as instalações para captação e tratamento da água potável e para tratamento e disposição dos dejetos, além das estimativas dos custos de construção por etapa e o planejamento de tempo para execução das obras.

Vale ressaltar que, em qualquer atividade, sempre há a necessidade de algum tipo de infraestrutura.

Material isolante aplicado em cobertura de aviário para galinhas poedeiras. (Foto: Diogo Rezende – Ambiagro/DEA/UFV).

Detalhes da construção de galpão para avicultura de corte em Portugal. (Foto: Kelle Pardim – Ambiagro/DEA/UFV)

Tratamento de águas residuárias de suinocultura com uso de lagoas. (Foto: Jadson Rocha –Ambiagro/DEA/UFV)

Energia

Na produção animal a energia é usada em programas de iluminação, aquecimento e resfriamento de microambientes, acionamento de equipamentos de acondicionamento ambiental, processos de ventilação e automação em geral. Pode-se afirmar ainda que conversões das diferentes formas de energia são processos cruciais no resultado produtivo. Recentemente, por exemplo, tem sido fundamental o aproveitamento da energia solar para aquecimento ou para a geração de energia elétrica, por meio dos painéis solares instalados sobre as coberturas das construções. A degradação biológica de resíduos, principalmente aqueles resultantes da própria produção animal, para tratamento e conversão em biogás, que pode ser queimado diretamente ou transformado em energia elétrica, também tem sido largamente empregada nas unidades de produção animal. Além disso, levando-se em conta a necessidade de manejo e tratamento de tais resíduos, a energia é de fundamental importância em vários dos métodos empregados.

Conversão biológica de dejetos de animais em biogás e posterior conversão em energia elétrica para o meio rural. (Foto: Jadson Rocha– Ambiagro/DEA/UFV)

Meteorologia agrícola

Considerando-se que o conforto e bem-estar animal é primordial para a produção eficiente, o clima, com suas mudanças intrínsecas, interfere na produção de maneira extremamente significativa. Caso sejam adotados os sistemas extensivos ou mesmo semi-intensivos de criação, os indivíduos e os resultados produtivos sofrerão influências diretas do clima local. No caso dos sistemas intensivos ou à base de confinamento, a definição do microclima gerado nos ambientes de criação animal ocorre devido às interações entre elementos climáticos impostos no espaço de contorno, tais como temperatura, umidade relativa e movimentação do ar, até mesmo quando utilizados os processos artificiais ou mecânicos de acondicionamento térmico dos ambientes. Para além do contorno das instalações animais ou do dossel de cultura ou ainda da própria unidade de produção, há a questão da importante difusão dos gases de efeito estufa para a atmosfera e respectivo controle, cujo conhecimento é construído na área de meteorologia

Vale ressaltar ainda que o estudo do clima, bem como as previsões climatológicas são fundamentais em qualquer processo produtivo animal, quer na seleção do local, quer no processo de gerenciamento da produção.

Torres meteorológicas de monitoramento de clima em propriedade agrícola nos EUA. (Foto: Williams Ferreira)

Armazenamento e Processamento de Produtos Agrícolas

A nutrição animal é baseada em um correto balanceamento de rações, com ingredientes que em sua maioria são grãos. A alimentação animal também pode ser conduzida à base de silagens e fenos. Dessa forma, é primordial o processo eficiente de armazenamento e processamento desses produtos agrícolas, que deve considerar o transporte, a lavagem, a secagem e o controle de qualidade nas diversas etapas. Além do planejamento e projeto acertado das unidades armazenadoras, com a previsão de estoques e manutenção das reservas alimentícias em boas condições e submetidas a processos corretos, busca-se evitar o desenvolvimento de microrganismos prejudiciais aos animais e, consequentemente, anular os prejuízos financeiros. Ainda há que se considerar, do mesmo modo, que os produtos derivados animais devem receber atenção no armazenamento, transporte e processamento, pois muitas vezes são frágeis e muito perecíveis.

Estrutura de Armazenagem implantada em propriedade rural. (Foto: Luis César Silva – DEA/UFV)

 Considerações Finais

Pode-se afirmar que o profissional de Engenharia Agrícola e Ambiental é capaz de projetar pensando nas externalidades de cada processo de produção agrícola e pecuária, com competência para saber gerir os recursos e assim agregar valor ao processo produtivo. Em um mercado competitivo e exigente, diante da conjuntura política e econômica, a produção agropecuária eficiente e diferenciada, baseada em conceitos de sustentabilidade e bem-estar animal, focada na produtividade e na qualidade, requer sem dúvida a atuação do Engenheiro Agrícola e Ambiental.

Cecília de Fátima Souza Ferreira, Fernando da Costa Baêta, Alisson Borges (Professores do DEA/UFV), Roberto Precci (Professor e atual coordenador do Curso de Engenharia Agrícola e Ambiental do DEA/UFV), Rogerio Silva Ribeiro Jr. e Marcelo Brandão Cabral Dutra (Graduandos do curso de Engenharia Agrícola e Ambiental da UFV).