O crescimento populacional global previsto para os próximos 20 a 30 anos, ainda acelerado, com efetivo aumento de cerca de dois bilhões de pessoas no meio urbano, trará importantes impactos socioambientais para os limites físicos do planeta. Crescerá a importância da segurança alimentar como prioridade de cada país, assim como aumentará substancialmente o comércio mundial de commodities energéticas e alimentares, entre outras.

Os acordos internacionais do clima, em vigência, serão fatores de aumento na pressão quanto ao uso dos recursos naturais, trazendo outra onda de preocupação global sobre as questões envolvendo o processo de concentração urbana e a necessidade de maior oferta frente à crescente demanda de commodities agrícolas e de minérios em todo o mundo.

As análises dos organismos internacionais como a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) indicam, com riqueza de detalhes, a sua crescente preocupação com os anos que virão face ao aumento médio da renda per capita global, gerando incremento no consumo de produtos derivados da biomassa, além de ações visando à redução das emissões de carbono fóssil, com maior uso de energias renováveis.

O processo de globalização, inexorável, que hoje sofre uma tentativa de enfraquecimento com ações populistas até mesmo do mundo desenvolvido, irá se manter ativo e mais envolvente, até pelas razões mencionadas neste texto, o que também acelera processos de mudança importantes, na lógica do desenvolvimento sustentável.

Nesse caldo de muitos movimentos não perceptíveis, como o Brexit, há outros claros e efetivos como a movimentação da China, que procura certificar-se por maior segurança na oferta de produtos agrícolas e energéticos.

O Brasil deve preparar-se para ser parte fundamental na segurança alimentar e energética dos países com fortes limitações de recursos naturais, não somente porque é muito rico neles, mas, sobretudo, por seu desenvolvimento tecnológico da agricultura tropical, sua forte presença no mercado internacional, mesmo com todas as barreiras desse mercado e, sem dúvidas, pela elevada competitividade do seu setor produtivo privado.

Limites naturais e possibilidades

Em 2050, segundo a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), a população mundial atingirá 9,1 bilhões – 34% maior do que é hoje. Quase todo esse aumento populacional ocorrerá nos países em desenvolvimento e cerca de 70% da população mundial será urbana (contra 49% hoje). A fim de alimentar esta população maior, mais urbana e mais rica, a produção de alimentos (líquida, sem aqueles usados para os biocombustíveis) deve aumentar em 70%. A produção anual de cereais deverá crescer para três bilhões de toneladas (das 2,1 bilhões de toneladas de hoje) e a produção anual de carne precisará aumentar até mais de 200 milhões de toneladas para atingir 470 milhões de toneladas.

As expectativas para a próxima década e as demais têm sido trabalhadas pelos diferentes “think tankers”, sempre com o foco de ganhos de produtividade na produção e necessária expansão horizontal.

A análise do crescimento da produção nos países, de 1961 a 2014, com base nos dados da FAO, mostra, mesmo no difícil período para o agronegócio brasileiro que vai de 1961 até meados dos anos 1970, a importância da acelerada expansão da oferta dos produtos brasileiros, fundamentais ao atendimento do consumo global.

Crescimento (n° de vezes) da Produção de 1961 a 2014

Fonte: FAO, 2017

Os dados do “Mundo” na tabela incluem o Brasil que, certamente, tem peso efetivo no resultado do seu crescimento.

O mesmo estudo da FAO indica que nos países em desenvolvimento, 80% do aumento de produção necessário viria do crescimento de produtividade e intensidade de cultivo, e apenas 20% da expansão das terras agricultáveis. Mas o fato é que, globalmente, a taxa de aumento nos rendimentos das principais culturas de cereais vem mostrando declínio constante, caindo de 3,2% ao ano em 1960 para 1,5% em 2000.

O desafio para a tecnologia é reverter esse declínio, uma vez que um aumento linear contínuo dos rendimentos em nível global, seguindo o padrão estabelecido nas últimas cinco décadas, não será suficiente para atender as necessidades alimentares globais.

Embora o investimento em pesquisa e desenvolvimento agrícola (P & D) continue sendo um dos mais produtivos, com taxas de retorno entre 30 e 75%, este tem sido negligenciado na maioria dos países de baixa renda. Atualmente, a P & D agrícola nos países em desenvolvimento é dominada pelo setor público. O aumento do investimento do setor privado exigirá o endereçamento de questões de direitos de propriedade intelectual, assegurando também que seja alcançado um equilíbrio para que o acesso de pequenos produtores às novas tecnologias não seja limitado.

Recente análise de Martin Wolf, no Financial Times, com base em estudos do FMI e da ONU (2017), mostra que a participação do PIB dos países ricos e dos emergentes, mudou radicalmente: os ricos, que eram 64% do PIB mundial em 1990, em 2022 serão 39%, empatando com os emergentes, enquanto o crescimento demográfico segue também a mesma lógica.

É claro que isso terá um peso importante nos próximos anos, assim como também preocupa uma desaceleração nas fontes de dinamismo na tecnologia e na produtividade, com a redução do peso relativo dos países desenvolvidos.

É conhecida a queda secular de preços reais das commodities agrícolas, na média caindo 1,5% ao ano. Isso mostra a relevância da produtividade, principalmente face aos limites de expansão de uso das terras.

Nesse sentido, duas considerações importantes em recente estudo da FAO/OCDE ganham relevância:a queda da taxa de crescimento global da demanda de commodities em relação à década anterior, que traria como consequência, para a próxima década, preços menores(cereais crescerão com cerca da metade da taxa vista na década anterior, nos próximos 10 anos, porém muito acima do crescimento da população); e o peso crescente da fatia de mercado do Brasil na Balança Comercial (segundo o Ministério da Agricultura e a Embrapa, a oferta brasileira de grãos aumentará de 288 milhões de toneladas a 344 milhões de toneladas nos próximos dez anos). Também vale salientar que, desde 2007, o uso acima de 15% de cereais e produtos açucareiros na produção de biocombustíveis criou, com o petróleo, uma fortíssima correlação de preços, mudando a lógica anterior. Os alimentos e os biocombustíveis passam a andar muito próximos em termos dos preços. E o Brasil tem forte protagonismo em ambos os produtos.

Essa nova realidade cria uma expectativa interessante face às novas variáveis, afetando a lógica do mercado dos produtos agrícolas. Um exemplo disso é a revolução norte-americana do “shale oil”, somada ao aumento da recuperação de petróleo convencional nos velhos poços, que coloca pressão contrária, pela sua competitividade, na busca pela descarbonização do planeta (vale mencionar as projeções da British Petroleum de que a frota global de veículos seria dobrada em 20 anos, e que as energias renováveis serão o grupo de maior crescimento anual global entre os combustíveis).

A época do crescimento das energias renováveis realmente chegou. Dessa forma, os biocombustíveis amarraram quase todos os preços das safras aos preços do petróleo. Isso aumenta a complexidade nas relações do agro, entre oportunidades e ameaças. Para as cadeias produtivas brasileiras da cana-de-açúcar, oleaginosas e, agora, milho, trata-se de uma grande oportunidade.

Muitos países continuarão dependendo do comércio internacional para garantir sua segurança alimentar. Estima-se que até 2050 as importações líquidas de cereais dos países em desenvolvimento mais do que dobrarão, de 135 milhões de toneladas métricas em 2008/09 para 300 milhões. É por isso que há uma necessidade de se avançar em direção a um sistema de comércio global que seja justo e competitivo; e isso contribui para um mercado confiável para alimentos.

A reforma das políticas de apoio às fazendas nos países da OCDE é bem-vinda, pois levou a uma diminuição do coeficiente de distorção comercial global de 0,96 em 1986 para 0,74 em 2007. No entanto, ainda há margem para melhorias. Há também importante ação de oferecer suporte e maior acesso ao mercado aos agricultores dos países em desenvolvimento para que eles possam competir em pé de igualdade. Os países também precisam considerar medidas conjuntas a fim de que estejam melhor preparados para futuros choques no sistema global, como ação coordenada no caso de crises alimentares, reforma das regras comerciais e/ou desastres localizados.

As mudanças climáticas e o aumento da produção de biocombustíveis representam aspectos importantes para a segurança dos alimentos no longo prazo. Embora os países do hemisfério sul não sejam os principais geradores de mudanças climáticas, eles podem sofrer a maior parte do dano sob a forma de queda nas produtividades e maior frequência de eventos climáticos extremos. Estudos estimam que a agricultura terá de se adaptar às mudanças climáticas, mas também pode ajudar a mitigar os seus efeitos, existindo sinergias úteis entre adaptação e mitigação.

O mundo tem recursos e tecnologia para erradicar a fome e garantir alimentos no longo prazo para todos, apesar de muitos desafios e riscos.

Agricultura brasileira e as revoluções tecnológicas

No bioma Cerrado, a tecnologia brasileira da Integração Lavoura, Pecuária e Floresta (ILPF), mostra ganhos por hectare, que leva à redução de pastagens de 11 milhões de hectares ou a possibilidade do uso de adicionais 50% das terras para lavouras. No caso da cana, efetiva uma redução de 40% no investimento de plantio e aumento da produtividade na consorciação com leguminosas. A agregação de valor ao alimento, no exemplo do aminoácido, que reduz de forma impressionante o volume de alimentos movimentados em todo o mundo para produzir a engorda de animais, reduz também a pressão por terras. É o poupa-terra!!
Entre 1985 e 2006, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), o efeito poupa-terra foi de 171 milhões de hectares, sendo 29 milhões da agricultura e 142 milhões de pecuária. Isso é sustentabilidade! Outros exemplos: além da agricultura de precisão, agora a pecuária de precisão da Bosch (Internet das coisas, Big Data, Inteligência Artificial).

Com riqueza em alimentos, fibras, energias renováveis, óleos vegetais, papel e celulose, e todos os subprodutos obtidos, o Brasil faz três a quatro safras ao ano em muitas propriedades, gerando renda e competitividade. A competitividade do agronegócio brasileiro está, no entanto, espremida entre dois polos: Custo Brasil, desfavorável e que rouba a produtividade obtida, e os riscos na inserção do Brasil na nova geopolítica global.

O país seguirá crescendo seu “share” em açúcar, carnes, café e outros produtos fundamentais e deverá superar os EUA como o maior produtor de soja do planeta na próxima década. Juntos, deverão responder por 70% do crescimento das vendas externas. Brasil e Argentina continuarão a aumentar suas áreas cultiváveis e outros importantes países reduzindo-as sensivelmente. Isso dá a dimensão da importância do CONE SUL na estratégia da alimentação global.

O Brasil segue como 3º maior exportador no agronegócio, mas perdeu fatia de mercado: de 7,3% em 2012 para 5,1% em 2016; nos últimos anos, a produtividade agrícola vem crescendo em taxas menores. Na logística, os armazéns, modais de transporte e portos sofrem a espera dos projetos, já em papeis amarelados e não implantados.

A espera das reformas não pode impedir outras medidas essenciais ao país como, por exemplo, a correção das distorções econômicas no mercado de combustíveis, que estimulará importantes cadeias produtivas do país, como a da cana-de-açúcar, dos óleos vegetais e do milho.

Uma das razões da relevância do Brasil no novo contexto do século XXI é no tocante à reserva de terra ainda agriculturável, por meio de processos de recuperação de solos degradados. Nosso potencial de ampliação da área plantada é bastante significativo. Acrescente-se a esses fatores novos sistemas produtivos que foram introduzidos nos diversos elos da cadeia do agronegócio.

Também nossa capacidade de inovação no campo se tornou um ativo que estimula a investir nas atividades do agronegócio brasileiro. As revoluções tecnológicas no campo, a partir dos anos de 1970, sustentaram muitos casos de sucesso apresentados nos quatro cantos do mundo.  Tivemos a domesticação do Cerrado, seguida pelo sistema de plantio direto na palha, que ganhou aprimoramento e intensidade na adoção entre os produtores. A área de aplicação desta tecnologia representa hoje em torno de dois terços da área ocupada pelas culturas anuais, agora somada à ILPF.

O trabalho desenvolvido pela Embrapa desde 1970, junto a outros órgãos estaduais, privados e produtores, engrossou esse movimento no Brasil com pesquisas aplicadas e biotecnologia. O pacote de inovações adquiriu um grau tão elevado que se tornou um dos principais responsáveis pelo país ser hoje considerado o líder mundial na moderna agricultura tropical. O Brasil transformou o Cerrado de região refratária ao plantio, naquela que atualmente responde pela metade da produção agropecuária brasileira (carnes, grãos, madeira plantada, café, cana) e fator indispensável para o brasileiro atingir o patamar de povo nutrido perante o mundo: 3.200 kcal/dia per capita e 85 kg de carnes/ano per capita, em média – níveis iguais aos europeus.

O salto de produtividade devido à nossa tecnologia tropical sustentável, pode ser comprovado da seguinte forma: do Plano Collor (março de 1990) até hoje, a área plantada com grãos cresceu 61%, enquanto a produção aumentou 310%. Se tivéssemos hoje a mesma produtividade por hectare de 1990, seriam necessários mais 91 milhões de hectares, além dos 60 milhões hoje plantados com grãos, para colhermos a safra de 2017. Em outras palavras, não foi preciso desmatar os 91 milhões hectares de Cerrado ou floresta.
Em tempos recentes, como fenômeno mundial presente nas mais diferentes atividades econômicas, chega ao campo a chamada REVOLUÇÃO AGRO 4.0. É o uso do telefone móvel e fixo, o computador, a televisão, o rádio, o satélite, a internet, os sensores, as redes, o wi-fi e o big data.

Não há como descolar a tecnologia da gestão. Quando a primeira muda, automaticamente acontece o mesmo com a segunda. Essa ligação não pode passar sem percepção. Daí a visão da cadeia produtiva do agronegócio e não apenas da agropecuária.

Outro importante aliado e fator que amplia a competitividade da agricultura brasileira é o clima tropical predominante. Graças a ele, o Brasil obtém o que nenhum outro país do mundo tem conseguido até o momento: colher três safras por ano. Além do milho, cuja segunda safra anual, a chamada “safrinha”, já se tornou tradicional na produção brasileira, diversas regiões conseguem safras de soja e de trigo consorciadas num mesmo ano e numa mesma área, como no sul do país, onde alguns produtores plantam soja ou milho no verão e trigo no inverno.

Todos esses benefícios só foram possíveis graças ao empenho, à criatividade e à perseverança dos produtores e profissionais de vários segmentos do agronegócio, que permitiram dominar os problemas de se produzir num ambiente constantemente quente, onde há uma proliferação maior de insetos, doenças e pragas. Tais problemas não afligem os principais competidores brasileiros onde o clima predominante é o temperado, muito menos naqueles de clima frio, nos quais o gelo e a neve se incumbem de neutralizar todos os vírus, fungos ou bactérias do solo, deixando a terra renovada para a próxima safra.

Por fim, outra razão para que o agronegócio brasileiro seja atraente como investimento é o surgimento de uma nova geração de produtores e produtoras rurais moderna, jovem e afinada. Trata-se de uma geração que soube conservar o rigor e a tradição dos seus antepassados com noções atualizadas sobre tecnologia da informação, gestão de recursos humanos avançada e socialmente condizente com o novo mundo, além de um sólido embasamento sobre respeito ao meio ambiente combinado com eficiência produtiva. Todos esses fatores soam como música aos ouvidos de investidores interessados por áreas promissoras, o que nos autoriza a dizer que o Brasil reúne todas as condições para ser a pátria do agronegócio eficiente e competitivo das próximas décadas.

Justificativas ao investimento no Brasil

Há uma série de aspectos que caracterizam a relevância do agronegócio brasileiro nas metas de crescimento da oferta global em relativo curto prazo, visando a atender as expectativas de aumento significativo da demanda por alimentos e energia renovável em todo o mundo.

Comentários sobre saldo comercial, Código Florestal, emissões dos gases do efeito estufa e produtividade são fundamentais e se somam ao potencial de expansão da produção de grãos e de outras culturas pelos ganhos de produtividade da pecuária, liberando áreas e recuperando áreas degradadas.
Saldo comercial: É clara a tendência do crescimento, no tempo, das exportações brasileiras do agronegócio, em relação às exportações totais do país. Trata-se de um claro processo derivado, por um lado, da competitividade brasileira e, por outro, da crescente demanda asiática por alimentos e matérias primas agroindustriais.

Fonte: Freitas, E.F.: A Agropecuária e Seus Processados na Balança Comercial Brasileira, com base em Brasil (2015)

Enquanto as importações do agro vieram caindo proporcionalmente no tempo, o saldo comercial do setor é muito expressivo.

Código Florestal: É muito expressiva a expectativa que a área total de florestas no Brasil (maduras, manejadas e regeneradas) está prevista para se estabilizar, ou até mesmo aumentar em 2050 (em comparação com 2010), face à implementação do Código Florestal. Esse aumento pode significar adicionais 32 milhões de hectares em 2030 e 53 milhões de hectares em 2050 sobre a base atual, valorizando sobremaneira o setor produtivo brasileiro.

Emissões de gases do efeito estufa: Segundo análise da Modelagem de Mudanças de Uso da Terra no Brasil, entre 2000 e 2012*, o perfil das emissões de gases do efeito estufa vem evoluindo claramente.

Fonte: Soterroni, A.C. et al.: Modelagem de Mudanças de Uso da Terra no Brasil: 2000-2050. Agricultura, Transformação Produtiva e Sustentabilidade; Brasília; 2016; pg 301.

Além disso, soma-se à Agricultura de Baixo Carbono, o etanol e a cogeração de energia elétrica pela biomassa da cana-de-açúcar.

Produtividade da agricultura brasileira: José Garcia Gasques, do Ministério da Agricultura, e outros têm trabalhado em profundidade essa relevante questão para o agronegócio e o Brasil. Lançando mão do conceito da PTF – Produtividade Total de Fatores, agregando lavouras temporárias e permanentes, produção animal e pecuária, conclui-se que o produto da agropecuária cresceu mais de quatro vezes entre 1975 e 2014. Houve aumento na taxa de crescimento da produtividade a partir da década de 1990.

Fonte: Gasquez, J.G. et al.: Produtividade da Agricultura Brasileira: A Hipótese da Desaceleração. Agricultura, Transformação Produtiva e Sustentabilidade; Brasília; 2016; p. 143