RESUMO – O presente artigo tem o objetivo de levar ao conhecimento dos leitores do site, os extraordinários avanços tecnológicos e científicos no campo da genética, manipulação do DNA/RNA, nos últimos tempos, com a criação de organismos geneticamente modificados e transgênicos e seus reflexos diretos nas ciências agrárias, melhoramento animal e vegetal, medicina humana e meio ambiente.

ABSTRACT – This article aims to bring to the attention of the readers of the journal the admirable and extraordinary technological and scientific advances in the field of genetics, DNA / RNA manipulation in recent times, with the creation of genetically modified and transgenic organisms and their reflexes agriculture, animal and plant breeding, human medicine and the environment.


 

Entende-se por organismos geneticamente modificados ou transgênicos (OGMs) aqueles, animal ou vegetal, que possuem em seu genoma (conjunto de toda a informação genética de um organismo) um ou mais genes provenientes de outra espécie ou da mesma, desde que tenham sido modificados e/ou inseridos por meio de técnicas da engenharia genética. (EMBRAPA. Brasília, 2011).

Os OGMs apareceram no mundo científico a partir das pesquisas laboratoriais do Dr. Paul Boyer & Cohen, (EUA.Califórnia,1973), quando obteve em laboratório uma cepa recombinante da bactéria Escherichia coli, capaz de sintetizar a insulina humana. Com essa fantástica descoberta, surge a biotecnologia que, superando ao processo convencional de reprodução e multiplicação biológica celular de organismos vivos, superiores e inferiores, determinou o aparecimento, pela primeira vez, na terra, de um produto biológico transgênico. Pode-se afirmar com toda a convicção que o reino animal e vegetal, depois de Boyer, não é mais o mesmo. A invenção da técnica de amplificação do DNA, in vitro, Reação em Cadeia de Polimerase-PCR, desenvolvida por Kary Mullis & Michael Smith, prêmio Nobel de Química,1993, possibilitando a identificação genética, produção e multiplicação de cópias de fragmentos de genes, constituição genética de produtos biológicos e seres vivos modificados, ganharam dimensões extraordinárias possibilitando na manipulação do DNA: excisar regiões específicas, determinar a seqüência nucleotídica de um segmento, amplificar o DNA, produzindo um número elevado de cópias, isolar genes, modificá-los por engenharia genética e reintroduzi-los em células de organismos diferentes, e ainda conhecer os mecanismos de regulação e de expressão gênica (Chaves, 2006); ampliou o leque das pesquisas científicas e descobertas, e o aparecimento de novas ciências gênicas como: engenharia genética, bioengenharia e biotecnologia.

Benefícios e malefícios

Como toda a inovação tecnológica, principalmente quando se intervém na natureza construtiva dos organismos vivos, transformando ou modificando-os, tem seus benefícios e malefícios; em síntese cronológica, apresentamos os principais resultados mundiais benéficos alcançados em biotecnologia, envolvendo OGMs, nas pesquisas de melhoramento animal e vegetal, na produção de alimentos, na medicina humana e meio ambiente.

OGMs de origem animal

Animal transgênico pode ser definido como aquele que apresenta moléculas de DNA recombinante exógenas introduzidas em seu genoma por intervenção humana através da bioengenharia (Pereira, 2008). Suínos, aves, bovinos leiteiros, ovinos, caprinos e também peixes, são exemplos de algumas das espécies de animais domésticos que estão sendo exploradas e passando por programas de bioengenharia visando à obtenção de novas proteínas, sendo a maioria, direcionada para a agropecuária, medicina humana e indústria. Um dos benefícios obtidos com esses animais transgênicos é o fato de que a proteína desejada poder ser extraída do sangue, do leite, ou de ovos, o que facilita a sua obtenção e purificação.

Em 2008, no Canadá, um projeto BioSteel, dirigido pelo pesquisador Dr. Randy Lewis da Nexia Biotechnologies Inc, uma corporação canadense, criou com cabras da raça Saanem, e apoio financeiro do Departamento de Defesa dos EUA. o rebanho BioSteel, a fibra proteica Steel, proveniente da teia da aranha (Figura 1) que tem emprego na indústria armamentista de materiais e equipamentos para proteção individual, por oferecer maior resistência e flexibilidade que o aço, além de maior leveza, sendo uma alternativa para o desenvolvimento de equipamentos para aeronaves, veículos de corrida e coletes à prova de bala, além de tendões artificiais, ligamentos, órteses e próteses humanas.

Figura 1: BioSteel.

Enviropig. Universidade de Guelph: Canada, 2001 (Figura 2). Porcos da raça yorkshire, 33 linhagens, estão sendo desenvolvidas para produzir altas taxas de fitase nas glândulas salivares e estômago, absorção do fósforo (P), encontradas nas rações de soja e cevada. A excreção de P para o meio ambiente, através das fezes, foi reduzida em 75% em suínos transgênicos em crescimento, e 56% em suínos em crescimento-terminação, sem qualquer efeito negativo na sanidade ou no desempenho dos animais. Futuramente, poderá ser a solução para a poluição ambiental, causada pela criação intensiva da suinocultura.

Figura 2: Enviropig.

Antígeno contra a malária e hormônio de crescimento Humano, GH. Behboodi et al. 2005, trabalhando com cabras transgênicas avaliaram o estado sanitário, o desempenho reprodutivo e a produção de leite expressando um gene recombinante de um antígeno da malária. Observaram que as cabras que expressavam o antígeno não glicosilado da malária produziram a proteína recombinante no leite. Este estudo demonstrou a viabilidade da produção de vacina contra a malária a partir do leite oriundo de animais transgênicos.

Salamone et al, 2006, objetivando estudar a produção de biofármacos no leite, realizaram um estudo com vacas transgênicas expressando no leite um gene recombinante do hormônio de crescimento humano semelhante ao produzido pela expressão na Escherichia coli, e verificaram que estes animais, são capazes de produzir este hormônio no leite em quantidade significativa, tornando-se uma alternativa viável para produção deste hormônio e emprego na terapia do crescimento.

Na piscicultura, de grande interesse comercial e econômico, ressalta-se o trabalho desenvolvido com a reprodução de salmões objetivando a produção de alevinos de trutas. Foram criados salmões machos capazes de produzir esperma de uma espécie de truta bastante próxima. O esperma dos salmões, quando utilizado para fertilizar ovos de truta, produz alevinos de truta saudáveis. Tal descoberta pode ser usada para incrementar a produção de peixes em cativeiro e até para tentar recuperar espécies extintas. É importante considerar que salmões e trutas estão separados por cerca de 8 milhões de anos de evolução (Russel, 2004). Esses estudos são exemplos de como a transgenia também pode ser utilizada para, além de aumentar o desempenho, melhorar características de carcaça e qualidade de carne de animais de interesse zootécnico.

 OGMs de origem vegetal

Na agricultura, os vegetais de grande valor agregado: econômico, alimentar, e industrial, “in natura” e processados, consumidos em grande escala pela humanidade, também sofreram especulações científicas genéticas no seu DNA. A primeira planta que teve suas caracteristicas originais modificadas foi o tomate (Flavr SavrTM), produzido pela empresa Calgene, (EEUU,1994), hoje Monsanto. (Figura 3). A descoberta do gen que produz a poligalacturonase, responsável pela maciez e retardamento do amadurecimento, presente nos transgênicos fez retardar essas características e aumentar o tempo de vida comercial do dessa fruta, de grande emprego na culinária e indústria. A soja transgênica resistente ao herbicida glifosato (Roundup Ready®), EUA 1995, foi a segunda experiência exitosa no melhoramento genético da planta, mundialmente empregada na alimentação humana e animal. O arroz dourado (golden rice) rico em beta-caroteno, precursor da Vitamina A, (Russel, 2004), foi criado para o suprimento de vitamina A, preventivo da Cegueira em crianças desnutridas. A batata inglesa, alimento mais consumido no mundo, foi modificada para absorver menor quantidade de óleo e portadoras de vacinas contra o rotavírus e outros germes enteropatogênicos, são as grandes descobertas dos transgênicos empregados na medicina.

Figura 3: Tomate transgênico (Flavr SavrTM)

Os avanços obtidos no campo da agropecuária e agronegócio são significativos, onde três ondas de produtos desenvolvidas pela biotecnologia podem ser identificadas. De acordo com Russel (2004), a primeira envolveu principalmente a área médica; a segunda foi a de plantas modificadas através da bioengenharia; e a terceira, a aplicação da biologia molecular. Atualmente, existem mais de uma centena de variedades de transgênicos animal e vegetal aceitos e aprovados pelo tratado de Biossegurança de Cartagena/Colômbia,1993, no mundo, sendo os Estados Unidos, a Argentina, o Canadá e a China os maiores produtores que correspondem cerca de 99% da produção mundial, e um mercado mundial orçado em 15.8 bilhões de dólares, OMS/FAO/FDA, 2016. (Figura 4)

Figura 4: Avanços na adoção de cultivos geneticamente modificados

Regulação dos OGMs

A pesquisa, criação, tramitação, comercialização e industrialização dos OGMs e subprodutos no país e internacionalmente passam por agências federal de aprovação, fiscalização e inspeção, com rigorosos testes e obdiência às Normas Técnicas do Protocolo Internacional de Cartagena, 1993.

No Brasil, a lei 11.105 de março de 2005, regulamenta o uso de técnicas de bioengenharia e a liberação de OGMs no meio ambiente. Tal legislação foi responsável pela criação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia. Cabe a CTNBio prestar apoio técnico consultivo e de assessoramento ao Governo Federal na formulação, atualização e implementação da Política Nacional de Biossegurança relativa a OGMs, bem como no estabelecimento de normas técnicas de segurança e pareceres técnicos de certificação e validação referentes à proteção da saúde humana, dos organismos vivos e do meio ambiente, para atividades que envolvam a construção, experimentação, cultivo, manipulação, transporte, comercialização, consumo, armazenamento, liberação e descarte de OGMs e derivados.