Após um período de “tempestade”, marcado por custos em alta, investigações de questões sanitárias e embargos internacionais, a indústria de carnes do Brasil vive um tempo de “bonança perfeita”. A afirmação é de dirigentes da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).

O principal fator para esse momento, que deve consolidar ainda mais a liderança do Brasil na exportação global de carne de frango, é a maior demanda da China e de outros países atingidos pela Peste Suína Africana.

A doença que tem reduzido rebanhos em várias regiões, especialmente no gigante asiático, o maior consumidor de cortes de porco, tem elevado preços, alterado fluxos comerciais globais e impulsionado a demanda por outras carnes, além da suína.

“Deu a tempestade perfeita, e agora veio a bonança perfeita: produção baixa (no Brasil), mercado interno estável, há mercados exportadores puxando as mercadorias e ambiente de custos estável (de matérias-primas). É agora o momento de consolidar a recuperação do setor”, disse o diretor-executivo da ABPA, Ricardo Santin, ao apresentar projeções para o ano a jornalistas.

Não bastassem os preços estarem maiores em dólares, com maior demanda dos importadores na esteira das compras chinesas, no Brasil o dólar forte frente ao real também tem favorecido o setor exportador.

Isso ocorre após a indústria de carnes ter sofrido reveses seguidos, incluindo o impacto da operação Carne Fraca da Polícia Federal, a greve de caminhoneiros em maio de 2018 e a alta de custos no ano passado, quando a safra de milho, principal matéria-prima do setor, registrou expressiva quebra.

“As condições de insumos estão positivas, a safra norte-americana já não é mais um temor (…) e para coroar ainda temos um dólar (favorável a exportações)”, afirmou Santin, lembrando que, após a “tempestade”, o setor está com o menor alojamento de aves em cinco anos, o que também reduz custos.

O segmento é dominado no Brasil por grandes companhias, como a BRF e a JBS. A primeira voltou a registrar lucro trimestral após nove meses no vermelho, e a segunda apresentou ganhos no segundo trimestre de mais de R$ 2 bilhões.

A ABPA, que representa os produtores de carnes de frango e suína, informou que pode terminar o ano com projeções ainda maiores de exportações do que a expectativa atual, com possibilidade de novos recordes.

As exportações de carne de frango do Brasil deverão atingir 4.3 milhões de toneladas em 2019, segundo estimativa da ABPA, projetando um aumento de cerca de 200.000 toneladas em relação a 2018. Já os embarques de carne suína do Brasil poderão crescer para 720.000 toneladas, versus 646.000 toneladas em 2018.

“O principal ‘driver’ de todos os eventos é a peste suína, que está causando uma disfunção na oferta global”, ressaltou o diretor-executivo da ABPA. “Falamos muito da China, mas é um processo da Ásia, onde outros países estão sendo afetados pela peste suína”, disse Santin, destacando que nações da Europa e da África também têm registrado casos da doença.

Além da China, houve Peste Suína Africana em Hong Kong, Bulgária, Romênia, Rússia, Ucrânia e Vietnã, além de países africanos, como África do Sul e Nigéria, segundo a Organização Mundial de Saúde Animal.

Oportunidade

O presidente da ABPA, Francisco Turra, lembrou que especialistas afirmam que a China vai levar anos para se recuperar do problema, o que pode representar para o Brasil, por outro lado, a mesma “oportunidade” oferecida pela gripe aviária, em 2005.

A doença avícola atingiu nações na Ásia, Europa e América do Norte no passado, permitindo que o Brasil, livre da doença, avançasse nas exportações. “A China não vai arrumar a casa em três anos. Eles não vão voltar com o mesmo rebanho”, disse Turra, ressaltando que o Brasil tem todas as condições de ocupar esses mercados.

Questionado se a guerra comercial entre China e EUA, cuja carne suína também é taxada pelos chineses, poderia favorecer o Brasil, Turra comentou apenas que tal disputa “fideliza” o produto brasileiro.

O dirigente ressaltou que a ABPA tem memorandos de entendimentos e está estreitando relacionamento comercial com a China, para eventualmente viabilizar mais habilitações de frigoríficos brasileiros pelos chineses. “Estamos prontos para aumentar as plantas para a China, mas quando vai aumentar, ela é que decide, é uma decisão comercial deles. Se quiserem mais, estamos aqui”, afirmou Santin.

Turra avalia que, mesmo pressionado, o governo chinês pode estar relutante em autorizar novas plantas em meio a uma estratégia comercial. Enquanto isso, aquelas unidades habilitadas a exportar aos chineses podem trabalhar com animais mais pesados e mesmo deixar de fornecer ao mercado interno como alternativa para abastecer os asiáticos.

Segundo Turra, a China pode comprar outros produtos que não são de seus hábitos alimentares. “Prova disso é o fato de o pé de frango estar valendo mais do que o peito”, disse Santin. Neste contexto, os preços no mercado interno devem seguir sustentados.

“Quem quiser comer pernil suíno, congele agora, porque vai ser difícil encontrar”, brincou o diretor da ABPA, destacando que os vendedores de carnes nos mercados interno e externo estão disputando as mercadorias.

De janeiro a julho, a exportação de carne de frango do Brasil para a China cresceu 21%, para 311.000 toneladas, segundo dados da ABPA, que apontou embarques para todos os destinos subindo quase 6% no período, para 2.4 milhões de toneladas.

Já as exportações de carne suína do Brasil para a China no mesmo período cresceram 31%, para 115.000 toneladas, informou a ABPA, que registra aumento de quase 20% nos embarques totais, para 414.500 toneladas.

De outro lado, a produção de carne de frango do Brasil deve aumentar apenas 1%, para 13 milhões de toneladas em 2019, enquanto a de suínos deve aumentar até 2,50%, para 4.1 milhões de toneladas.

 

Reuters