O período seco de uma vaca leiteira trata-se de uma época do ciclo produtivo na qual o animal não está produzindo leite. Ele começa no 7º mês de gestação sendo fundamental para que haja um desenvolvimento saudável do bezerro e também para que ocorra uma adequada recuperação da glândula mamária, possibilitando ao animal entrar no próximo ciclo produtivo sendo capaz de expressar todo o seu potencial genético.
Dependendo do sistema de produção, o período de lactação pode ser mais curto (como em rebanhos menos especializados) ou mais longo (rebanhos mais especializados) porém, na média, este período dura cerca de 305 dias enquanto o período seco dura cerca de 60 dias (2 meses). Com estes números, é possível conseguir uma cria/animal/ano.
Para que o período seco seja o melhor possível, tanto para a vaca e o bezerro (que precisam estar saudáveis para que consigam produzir leite e crescer de modo adequado, respectivamente) quanto para o produtor de leite (para que este não veja os seus rendimentos diminuindo enquanto os custos aumentam), são necessários diversos cuidados fundamentais onde podemos citar:
Nutrição
A alimentação durante este período, assim como nas demais etapas do ciclo produtivo, não pode ser negligenciada. Embora a vaca não esteja produzindo leite, ainda assim suas exigências energéticas são altas, pois o final da gestação é justamente o momento de maior desenvolvimento do feto (cerca de 2/3 deste ocorre durante este período). O produtor pode optar por dividir as vacas durante este período em 2 grupos: Grupo 1 (animais com 60 a 21 dias antes do parto): com fornecimento de uma dieta menos energética. Se as vacas estiverem com boa condição corporal (ECC entre 3,25 e 3,5) e em pastagem com boa disponibilidade e qualidade, não há necessidade de fornecimento de concentrado. Grupo 2 (animais com 21 dias antes do parto até o parto): as vacas já devem receber uma dieta similar à dieta das vacas do grupo de início de lactação para que a flora ruminal comece a se adaptar à alimentação. Caso o animal sofra de subnutrição, o bezerro pode nascer mais fraco, aumentando a susceptibilidade à doenças e prejudicando o desenvolvimento durante todas as etapas subsequentes do ciclo produtivo – em alguns casos, pode-se até perder o animal nos primeiros dias de vida – o que representa uma perda do investimento que foi feito naquela cria. Além disso, animais desnutridos podem apresentar problemas no pós-parto justamente por não terem energia suficiente, prejudicando assim a produção leiteira e a recuperação uterina durante o puerpério – o que atrasa o retorno à reprodução.
No caso de animais super nutridos, pode ocorrer um excesso de ganho de peso (ECC de vacas neste período deve ficar entre 3,0 – 3,5 em uma escala que vai até 5,0) o que gera um acúmulo de gordura que pode ser extremamente prejudicial no pós-parto, predispondo distúrbios metabólicos como cetose e hipocalcemia.
Úbere
No momento de secagem do animal, é importante que sejam tomados diversos cuidados com o úbere e que o mesmo passe por esgotamento de todo leite para que sejam evitados quadros de mastite. A mastite representa um enorme problema no período seco, principalmente quando ocorre próximo ao parto por comprometer a produção e a qualidade do colostro que será destinado ao bezerro – fundamental para fornecer imunidade passiva para estes animais.
A secagem do animal obrigatoriamente deve ocorrer pelo menos 60 dias antes do parto para que a glândula mamária consiga recuperar seus alvéolos e tecidos e produzir um colostro de melhor qualidade para ser fornecido ao bezerro.
A terapia da vaca seca (uso de antibiótico intramamário específico) possui o objetivo de curar possíveis infecções existentes no momento da secagem e também prevenir novas infecções durante o período seco.
Uma outra estratégia bastante utilizada durante este período é o selante intramamário que atua como uma barreira mecânica no canal do teto, proporcionando uma barreira similar à de queratina que é produzida naturalmente. É importante que o selante proteja durante todo o período seco, de modo a evitar que agentes microbianos consigam ascender pelos tetos até a glândula mamária.
Bem-Estar
Mesmo no período seco, o conforto deve estar presente na rotina do animal. Um estudo feito por Dado-Senn et al. (2020) avaliou bezerros nascidos de vacas que passaram estresse térmico no período pré-parto em comparação com bezerros que nasceram de vacas que tiveram conforto térmico durante o mesmo período e concluiu que aqueles que sofreram estresse tiveram prejuízos no seu desempenho após o nascimento.
É importante que o animal tenha acesso aos mesmos cuidados que normalmente existem durante o período de lactação, isto é: água e alimentação em quantidade e qualidade adequada, cama confortável e nas dimensões corretas, densidade animal/área respeitada no galpão/piquete, acesso a local sombreado e ventilado (se possível).
Deve-se evitar contenção dos animais, correria e situações estressantes que podem ocasionar partos prematuros e outras consequências negativas pós-parto, como a produção de colostro de baixa qualidade.
Vacinação
O manejo sanitário (vacinação e vermifugação) das vacas prenhes no período pré-parto (30-60 dias) objetiva reduzir a contaminação do bezerro nos primeiros momentos de vida e também melhorar a qualidade do colostro que a fêmea produz que será fundamental para garantir uma correta transferência de imunidade passiva e posterior sucesso do bezerro nas fases produtivas subsequentes, além de diminuir taxas de doenças e mortalidade neonatal.
A escolha das vacinas que serão aplicadas neste período pode ser conversada com o médico veterinário da propriedade, de modo a priorizar aquelas que protegem contra doenças endêmicas da fazenda.
Casqueamento
O casqueamento preventivo é recomendado durante o final da lactação e o início do período seco pois durante este período a vaca ficará em um local seco e com poucos animais, o que contribuirá para a recuperação dos cascos.
Essa recuperação é fundamental, pois animais que possuem problemas locomotores ocasionados devido a um casco defeituoso podem ter a sua produção de leite comprometida, impactando negativamente nos lucros da propriedade. Tem como objetivo corrigir o crescimento anormal dos cascos, restituir a correta distribuição do peso entre as unhas e identificação de possíveis lesões ou rachaduras que ocorreram durante a lactação.
O período seco não deve ser negligenciado por ser um momento no qual o animal não está produzindo leite, mas sim ser visto como uma janela de oportunidade para a realização de algumas medidas preventivas que impactarão não só a lactação subsequente como também a saúde da vaca e do bezerro.
Referências
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SOUZA, Renata de Oliveira. Casqueamento preventivo. MilkPoint. 2002.
https://www.milkpoint.com.br/artigos/producao-de-leite/casqueamento-preventivo-16693n.aspx