Este ano festejamos os duzentos anos desde o nascimento do cientista francês Louis Pasteur, que viveu de 27/12/1822 a 28/09/1895.

Foram Edward Jenner e Louis Pasteur que desenvolveram as primeiras vacinas para proteção contra infecções virais, o primeiro, de forma empírica, deixou o legado para a humanidade combater a Varíola, mesmo sem saber da existência de vírus. O segundo, de forma experimental, caracterizou os vírus da Raiva e estabeleceu o processo de imunizar as pessoas e animais contra os efeitos letais da infecção pelo vírus da raiva.

Como um químico, Louis Pasteur foi o primeiro a demonstrar o fenômeno de isomeria ótica das moléculas orgânicas e a estabelecer os critérios de controle de qualidade nos processos adotados nas atividades silvícolas, vinícolas e lacticínicas da França, contribuindo assim para a prosperidade econômica das indústrias francesas e, posteriormente, dos demais países. No âmbito alimentício e hospitalar, Pasteur nos legou, respectivamente, os processos de pasteurização e de esterilização. Experimentalmente, Pasteur estabeleceu as bases metodológicas da Bacteriologia e da Imunologia aplicadas à avicultura (Cólera Aviária) e à ovinocultura (Carbúnculo) e da Virologia e Imunologia, aplicadas à Raiva.

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Foi justamente graças às atividades desenvolvidas por Pasteur, para enfrentar as consequências letais da Raiva e também à indicação promulgada pelo Imperador D. Pedro II, que podemos celebrar, em 2022, os 135 anos de virologia experimental executados no Brasil. Conforme Santos (888), esta atividade teve início em 23 de julho de 1887, pelo próprio Augusto Ferreira dos Santos, à época, docente da Faculdade de Medicina, na cidade do Rio de Janeiro, após ter sido treinado, como estagiário residente, no setor de pesquisa sobre a Raiva, sob a orientação do próprio Louis Pasteur, em Paris, durante o período de 14/06/1886 a 04/07/1887. Como ponto alto deste referido treinamento, em 09/02/1888, foi aplicado o primeiro tratamento preventivo da Raiva no Brasil e, em 25 de fevereiro de 1888, foi inaugurado, oficialmente, o Instituto Pasteur do Rio de Janeiro, como instituição voltada para o preparo e a aplicação das vacinas contra Raiva, na Capital do Império.

Cabendo também celebrar em 2022, o Jubileu de Ouro (50 anos) do Programa Nacional de Controle da Raiva, inserido como programa de governo no Brasil.

Mais detalhes sobre o fabuloso legado científico deixado por Pasteur para a humanidade pode ser encontrado na publicação de BAXTER (2001) e VASCONCELOS & FILHO (2010). Estes autores, de forma relevante, divulgaram a vida e obra de Louis Pasteur, salientando que:

Pasteur demonstrou as vantagens de vacinar, de pasteurizar alimentos (cerveja) e esterilizar instrumentos para uso em procedimentos cirúrgicos, inclusive nas gestantes durante o parto;

Em 1864, o cientista Louis Pasteur desenvolveu o processo de conservação de alimentos por meio de um rápido processo de aquecimento (inferior a 100º C), seguido de resfriamento imediato, processo este que foi denominado pasteurização, em homenagem ao inventor. Pasteurização é um processo que visa destruir micróbios já presentes nos alimentos, sem provocar alteração no sabor ou na composição nutricional do produto, com a finalidade de conservar e aumentar a vida útil do produto final. O binômio tempo/temperatura depende do alimento e as características a serem preservadas (OETTERER et al., 2006).

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Na carreira científica de Louis Pasteur, é impressionante notar o caráter exponencial da pesquisa que ele introduziu em todos os campos que ele abriu. Ele ofereceu oportunidades fabulosas para estereótipos. Ele é reconhecido como um dos fundadores da microbiologia e de ter estudado, experimentalmente, uma virose, a Raiva. Ele descreveu a existência da anaeróbica. Ele apontou o caminho para a epidemiologia, a saúde pública e a vida bacteriológica. Fundamentado nos princípios da isomeria ótica das moléculas orgânicas, ele refutou a ideia de vida como fruto da geração espontânea. Ele, irrevogavelmente, provou a teoria microbiana das doenças infecciosas. Ele demonstrou que a virulência bacteriana poderia ser atenuada. E, last but not least, evidenciou a imunidade e descreveu os princípios fundamentais da VACINAÇÃO.

A pesquisa de Pasteur sobre a vacinação como método profilático para prevenção da doença da Raiva em cães começou em 1882. A primeira vacinação humana com um vírus da Raiva, atenuado pela exposição ao ar seco, começou em 6 de julho de 1885 e foi relatada na sessão da Academia Francesa de Ciências em 26 de outubro de 1885 (RAPPUOLI, 1885).

Em 2009, o virologista da Fiocruz Hermann Schatzmayr, publicou, junto com o Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Maulori Cabral, o livro A Virologia no Estado do Rio de Janeiro: Uma Visão Global. A obra apresenta a evolução do campo de conhecimento no Estado sob uma perspectiva global e histórica, abordando desde os primeiros fatos registrados até as epidemias modernas. Hermann fez questão de que a obra fosse divulgada gratuitamente na internet (SCHATZMAYR & CABRAL, 2012).

Características de

Geração Louis Pasteur: Pesquisa ativa, raciocínio lógico, perseverança, dedicação e experiência prática (heurística) ao longo de toda uma vida e a de seus discípulos = maior exercício do cérebro.

Geração atual: passiva, conclusões imediatistas com base em anotações de fontes não confiáveis e não testadas, sem prática de experiências comprovadas (treinamento on-line) = menor exercício do cérebro.

1822: campo aberto, sem conhecimento sobre vírus, sem equipamentos sofisticados e sem internet, ensino por estágios e ensinando como pensar por erro e acerto.

2022: campo muito explorado, equipamentos sofisticados e internet com fakenews, escolas ensinando o que pensar.

Referências

BAXTER, A.G. Louis Pasteur’s beer of revenge. Nat Rev Immunol. 2001 Dec;1(3):229-32. doi: 10.1038/35105083.PMID: 11905832 Louis Pasteur’s beer of revenge.

BERCHE, P. Louis Pasteur, from crystals of life to vaccination. Clin Microbiol Infect. 2012 Oct;18 Suppl 5:1-6. doi: 10.1111/j.1469-0691.2012.03945.x. Epub 2012 Aug 6.PMID: 22882766 Review. Louis Pasteur, from crystals of life to vaccination.

OETTERER, M.; ALCARDE, A. R. Tecnologia da fabricação de cerveja. In: OETTERER, M.; D’ARCE, M. A. B. R.; SPOLO, M. H. F. Fundamentos de Ciência E Tecnologia de Alimentos. Barueri (Sp): Editora Manole Ltda, 2006. 612p

https://brt.ifsp.edu.br/phocadownload/userupload/213354/A%20PRODUO%20DE%20CERVEJA%20AO%20LONGO%20DA%20HISTRIA.pdf

PLOTKIN , S.A. A hundred years of vaccination: the legacy of Louis Pasteur. Pediatr Infect Dis J. 1996 May;15(5):391-4. doi: 10.1097/00006454-199605000-00002.PMID: 8724058 A hundred years of vaccination: the legacy of Louis Pasteur.

RAPPUOLI, R. Inner Workings: 1885, the first rabies vaccination in humans. Novartis Vaccines and Diagnostics, 53100 Siena, Italy.

RUSAVSKAYA, T.L. 150th anniversary of Louis Pasteur’s birth celebrated in U.S.S.R. J Hyg Epidemiol Microbiol Immunol. 1974;18(2):252-6.PMID: 4153537 150th anniversary of Louis Pasteur’s birth celebrated in U.S.S.R.

SCHATZMAYR, H.G.; CABRAL, M.C. A Virologia no Estado do Rio de Janeiro: uma visão global. Rio de Janeiro; Fiocruz; 2. ed; 2012. 175 p.

VASCONCELOS, M. A. S.; FILHO, A. B. M. 2010. Conservação de Alimentos. In: OETTERER, M.; D’ARCE, M. A. B. R.; SPOLO, M. H. F. Fundamentos de Ciência E Tecnologia de Alimentos. Barueri (Sp): Editora Manole Ltda, 2006. 612p

Disponível em: https://brt.ifsp.edu.br/phocadownload/userupload/213354/A%20PRODUO%20DE%20CERVEJA%20AO%20LONGO%20DA%20HISTRIA.pdf

Phyllis Catharina Romijn é Pesquisadora científica da Empresa de Pesquisa Agropecuária do Estado do Rio de Janeiro
Nélio Batista de Morais é Coordenador de Vigilância em Saúde da Secretaria Municipal de Saúde de Fortaleza – CE
Francisco Edilson Ferreira de Lima Júnior é Coordenador-geral substituto da Coordenação-Geral de Vigilância de Zoonoses e Doenças de Transmissão Vetorial – Ministério da Saúde do Brasil
Geraldo Vieira de Andrade Filho é Diretor de Vigilância em Saúde da Secretaria Municipal de Camaragibe – PE
José Renato de Rezende Costa é Superintendente de Vigilância em Saúde e Diretor da Vigilância Ambiental e Controle de Zoonoses na Secretaria de Saúde de Contagem – MG
Josué de Oliveira Moreira é Professor da disciplina de saúde pública do Campus Ipanguaçu IFRN – RN
Maulori Curié Cabral é Professor no Departamento de Virologia do Instituto de Microbiologia Paulo de Góes, da UFRJ – RJ
Foto de capa: Agência Brasil