A esporotricose é uma dermatopatia de origem fúngica, provocada pelo complexo Sporothrix schenckii e é comumente relatada em animais de companhia, como cães e gatos. Sua abordagem é relativamente negligenciada e, em se tratando de uma doença emergente e de caráter zoonótico, torna-se importante no que diz respeito à saúde pública.

O presente trabalho teve como objetivo discutir a importância clínica e epidemiológica e principalmente para a saúde pública, da Esporotricose em equinos, evidenciando o papel do Médico Veterinário enquanto agente de prevenção e controle desta zoonose, já que em relação aos equinos, há poucas informações a respeito dessa doença e a maioria dos dados são relatos de caso.

A esporotricose é uma dermatopatia de origem fúngica, provocada pelo complexo Sporothrix schenckii e é comumente relatada em animais de companhia, como cães e gatos. Sua abordagem é relativamente negligenciada e, em se tratando de uma doença emergente e de caráter zoonótico, torna-se importante no que diz respeito à saúde pública. Sob esse viés, é interessante que haja uma análise acerca da epidemiologia e características do fungo que, por ser dimórfico, está amplamente disperso no ambiente. Fato que chama atenção para a possibilidade de infecção para outras espécies e também para seu potencial de tomar proporções epidêmicas, visto que, apesar da esporotricose apresentar maior relevância em regiões de climas tropicais e subtropicais, dados epidemiológicos mostram o potencial de disseminação e evolução da doença no território brasileiro ao longo dos anos (Figura 1). Entre 2018 e janeiro de 2021, um questionário mais detalhado foi disponibilizado, pela Secretaria do Estado de Saúde do Rio de Janeiro (SES-RJ), no FormSUS, com o intuito de estabelecer o cenário epidemiológico do da Esporotricose no Rio de Janeiro (Figura 2).

Figura 1: Evolução temporal dos casos de esporotricose felina no Brasil entre 1950 e 2022. Fonte: (Rodrigues et al., 2022)

Figura 2: Casos de esporotricose no RJ em 2019 e 2020 segundo mês de notificação.

No ano de 2019 foram feitas 1.693 notificações de casos suspeitos de esporotricose no estado do RJ, com 1.586 pacientes confirmados (Fonte: SINANNET de 27/10/2020). E no ano de 2020, o número de notificações de esporotricose humana foi de 1.032, com 1.030 confirmados por critérios clínico-epidemiológicos ou laboratoriais – estes últimos, apenas em 58 casos (Fonte: SINANNET de 26/03/2021).

A princípio, quando se aborda a esporotricose, o enfoque é direcionado para animais de companhia, evidenciando, de maneira geral, as manifestações clínicas que acometem a pele, como a presença de lesões ulcerativas e o risco de transmissão, caso haja arranhadura ou mordedura, tanto em animais que coabitam, quanto humanos que manipulam esses animais infectados. Nesse sentido, vale ressaltar que pela alta dispersão do fungo no ambiente já são observados casos em animais de produção. Em equinos, por exemplo, a infecção também ocorre com a inoculação do fungo de maneira traumática e a manifestação dos sinais clínicos se dá pelo aparecimento de nódulos endurecidos, sequenciados, possivelmente ulcerados, conhecidos como “rosário esporotricótico” (Figura 3). A esporotricose, nessa espécie, ocorre em membros inferiores, e, um pouco menos comum, em região de pescoço, tronco e face. São nódulos rígidos, que podem evoluir para abscessos purulentos. Por se tratar de uma doença pouco mencionada nesses animais, os sinais clínicos podem levar a pensar em outras doenças mais comuns, o que é altamente relevante para a saúde pública e um desafio em incluir a esporotricose dentre os possíveis diagnósticos diferenciais.

Figura 3: Intensa alopecia e presença de nódulos subcutâneos, em sua maioria ulcerados, causados por Sporothrix schenckii. Fonte: Copetti M. V. et al. Esporotricose eqüina. Acta Scientiae Veterinariae. 30: 135- 138, 2002.

Assim como no cão, e diferente do gato, o diagnóstico da esporotricose para equinos também é bastante dificultado devido à escassez dos microorganismos em exames citológicos e histológicos. É necessário realizar uma diferenciação diagnóstica de modo a descartar outras infecções com características granulomatosas, como a Leishmaniose Tegumentar Equina. De acordo com Celestino et al. (2020), grande parte dos casos de esporotricose equina se resolve naturalmente após um período muito prolongado, porém podem deixar cicatrizes severas ou chegar aos órgãos internos. A terapia sistêmica mais utilizada no tratamento desses equinos, segundo os relatos de caso já publicados, são os iodetos associados com o suporte nutricional. O prognóstico é favorável com tratamento correto, se atentando a não utilizá-lo em éguas prenhas e interrompê-lo temporariamente em casos de intoxicação pelo iodo, que pode ocorrer como efeito colateral.

No olhar da saúde pública, o conhecimento das manifestações clínicas, bem como as formas de tratamento nesses animais, se faz essencial para tentar diminuir a possibilidade de infecção de pessoas, bem como a proporção enorme que a doença tem tomado nos últimos anos. Apesar da existência de apenas dois relatos de possível transmissão da esporotricose entre equinos e humanos, como citado por Celestino et al. (2020), fica claro que há um risco, em se tratando de uma zoonose com altas taxas de transmissão, juntamente ao fato de não ser muito discutida e de difícil diagnóstico clínico, pois os sinais são muito semelhantes a outras doenças que acometem os equinos.

Diante da emergência e da importância da esporotricose em animais de companhia e, cada vez mais, em animais de produção, torna-se essencial a abordagem da saúde única para prevenção e controle da doença, além de ser essencial no combate a outras doenças que podem atingir tanto os animais quanto os seres humanos. A escassez de estudos sobre a esporotricose em equinos reflete um grande desafio no diagnóstico e tratamento precoces da doença, além de ressaltar a necessidade de um maior investimento em pesquisas e estudos epidemiológicos em diferentes espécies animais. É importante destacar que, apesar de possuir alta taxa de transmissão de animais para humanos, a esporotricose é muitas vezes negligenciada, o que pode se tornar um agravo. Nesse contexto, o médico veterinário e os profissionais da saúde devem atuar de maneira integrada, visando alcançar a saúde única, buscando alternativas para a prevenção, diagnóstico e tratamento da doença em questão. Por fim, é fundamental que haja um manejo adequado e monitoramento das condições sanitárias em ambientes de criação e produção, garantindo a prevenção da disseminação de zoonoses, protegendo assim tanto a saúde animal quanto a saúde humana.

Logo, o médico veterinário não deve se ater apenas à sua atuação clínica, mas deve também trabalhar de forma integrada com proprietários e cuidadores, as formas de prevenção da doença e manutenção do bem-estar destes animais.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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