Lilian Dias é comunicadora Agro e especialista em excelência profissional. Graduada em jornalismo, acumula 15 anos de experiência no setor agropecuário. Por mais de uma década, foi gerente de jornalismo de um dos maiores canais de televisão Agro do Brasil, o Terraviva, emissora do Grupo Band, onde liderou 5 premiações de jornalismo: Allianz, FMC, CNA, Andef e LIDE. Também possui MBA Executivo pela ESPM, com foco em gestão e é autora do e-book “Os Pilares do Agronegócio”. Atualmente, é palestrante, produtora de conteúdo digital sobre capacitação no Agro e, na mídia, é embaixadora oficial da Agrishow.

Como você avalia a participação das mulheres no campo, tomando as decisões dentro e fora da porteira?

A presença da mulher no campo tomando decisões, tanto dentro quanto fora da porteira, tem sido cada vez mais forte, mas observo que ainda existe um viés de autoafirmação desnecessário que não condiz mais com a força dessa mulher do século 21. Não quero dizer que não exista preconceito e que não deva ser combatido, mas quero reforçar que essa é uma carapuça que não deve ser mais vestida pelo universo feminino. O preconceito, em qualquer âmbito, é do outro e não nosso.  Ninguém deve tomar para si o que não lhe pertence.

Se o marido morreu, a mulher assumiu a fazenda e o peão não quer receber ordens dela, é simples: demita!  Como o preconceito é do outro, ele que arque com as consequências. Agora, se a mulher está numa empresa que não promove pessoas do sexo feminino para cargos de alto escalão, tome uma atitude e peça demissão. Torne-se presidente da própria empresa. Caso não queira empreender, então busque outra organização que valorize o seu potencial humano e não o seu gênero.

As mulheres ainda confundem o ato de se impor com o de se posicionar. Pesquisas apontam que homens recebem salários 30% maiores em relação às mulheres, mas isso não ocorreu comigo, particularmente. Eu cheguei a custar o dobro do salário de um colaborador do sexo masculino que era considerado uma das estrelas de uma grande empresa. O que fez de mim a exceção? A maneira de me posicionar.

Nós, independentemente de sermos homens ou mulheres, ocupamos exatamente o lugar onde nos colocamos. Se nos posicionarmos como vítimas, seremos vítimas. Se nos posicionarmos como um ser humano de grande valor, seremos naturalmente reconhecidos por esse valor sem que haja necessidade de fazermos comparações entre homens e mulheres.

A comunicação do agro é algo que vem tomando força nos últimos anos e, atualmente, tem sido ainda mais importante, não só no quesito divulgação como também na parte de explicação, pois o agro e seus benefícios para o país, ainda são desconhecidos para grande parte da população. Como uma comunicadora do agro e influencer do setor, o que você acha que precisa melhorar nessa parte, o que ela já contribuiu e ainda tem para contribuir para o setor?

Quanto à comunicação no agronegócio, eu a enxergo em três níveis: 1º) a que é feita por parte de entidades e empresas; 2º) a comunicação produzida dentro da porteira pelos produtores rurais; 3º) a que é realizada entre técnicos e produtores rurais.

Eu vejo um grande esforço por parte das entidades e da iniciativa privada para divulgar os bastidores e o valor do agronegócio brasileiro. Recentemente, tive a honra de participar da equipe de palestrantes que integram o Programa Educacional Conhecendo o Agro, um projeto realizado pela ABAPA (Associação Baiana dos Produtores de Algodão) que tem como objetivo levar conhecimento sobre o agronegócio nacional e do Oeste da Bahia para professores e, consequentemente, alunos das redes pública e privada de ensino da região.

Por outro lado, dentro da porteira, falta uma liderança que oriente os pequenos e médios produtores a se comunicarem com a sociedade de uma forma menos truculenta, enxergando a outra ponta não só como o “povo da cidade que fala mal do Agro”, mas como um cliente, ou seja, aquele consumidor final que está cada vez mais exigente e tem o direito de saber como está sendo produzido o que ele pretende consumir. As pessoas não se alimentam mais só de comida, mas de conceitos também.

Muita gente não quer mais comprar de quem não produz pautado na preservação ambiental e na sustentabilidade e, gostemos ou não, o cliente também dita as regras do mercado porque é ele quem tem o poder de compra. É claro que também falam muita bobagem sobre o Agro, e que o nosso sangue ferve ao ler ou ouvir tolices, mas, quando isso ocorre, temos que respirar fundo e sermos gentis, didáticos e educadores desses ignorantes. Entretanto, a resposta que vem de dentro da porteira costuma ser hostil e irônica.

Há pouco tempo, circulou um post pelas redes sociais com uma frase estampada numa camisa que dizia o seguinte: “Agricultura é a arte de perder dinheiro, enquanto se trabalha 400 horas por mês para alimentar pessoas que acham que você as quer envenenar”. A mensagem denigre tanto o consumidor da agropecuária quanto o próprio setor. Sem contar que é sempre uma comunicação reativa, ou seja, a maioria dos produtores se manifesta só para se defender de algo, em vez de fazer uma comunicação positiva e ativa, que significa passar a mão no celular, de uma maneira espontânea, e gravar um vídeo mostrando para a sociedade o que tem sido feito de bom no campo.

Por fim, precisamos melhorar a comunicação entre técnicos e agropecuaristas, levando mais informação aos pequenos produtores, principalmente, sobre as novas tecnologias disponíveis. A internet não supre essa necessidade, pois o sinal ainda deixa a desejar no campo e também existem muitos curiosos no YouTube ou no Google que não são qualificados nesta missão de fornecer conhecimento com qualidade.

Mesmo com a nova realidade de convivência por causa do coronavírus, o corpo-a-corpo, nem que seja há um metro e meio de distância entre o assistente técnico e o produtor rural, não deve morrer, senão morrerão igualmente as informações, a coleta de dados feita diretamente na fonte e as experiências valiosíssimas no campo que jamais serão produzidas nas universidades e nos laboratórios de pesquisa, com todo o respeito ao conhecimento e empenho dos pesquisadores.

A Agrishow, maior feira de tecnologia para o campo da América Latina, assim como vários outros eventos do agro, foram cancelados ou adiados por conta da pandemia. Você  poderia comentar um pouco sobre os impactos e também qual sua atuação como embaixadora da Feira? 

A pandemia acelerou o processo de digitalização que sofria bastante resistência no Agro. Digo isso por experiência própria, porque há quatro anos venho disseminando conteúdo de marketing digital para produtores rurais e profissionais do setor e até então o universo deles de comercialização de produtos e serviços se restringiam aos grupos de WhatsApp para um excedente ou outro de produção.

De repente, com o fechamento de feiras e armazéns durante a quarentena, todos se viram obrigados a aderir de vez aos meios digitais para poder escoar a produção. Reforçando essa nova realidade, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) também lançou, com o apoio do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), uma plataforma nacional de comércio eletrônico para reunir produtores rurais, aplicativos, redes de supermercados e prestadores de serviço de frete para facilitar a comercialização de produtos do campo.

Quanto aos eventos digitais e à popularização de lives, o mercado digital deu um salto de cinco anos, de acordo com especialistas desse segmento. Eu já vivia essa rotina há anos e, embora lamente as circunstâncias, foi importantíssima a inserção do agronegócio neste novo cenário.

Nos Estados Unidos, já existem lojas que expõem produtos apenas como mostruários e depois o consumidor realiza a compra de casa pela internet. Acredito que esse modelo de venda se tornará uma prática nos eventos agropecuários, no sentido de que, mesmo com a volta dos eventos presenciais, a comercialização online permanecerá. Enfim, a digitalização do mercado é um caminho sem volta.

Bill Gates já havia profetizado que no futuro só existiriam dois tipos de empresas, que são as que fazem negócios pela internet e as que estão fora dos negócios. Não só as empresas, mas as pessoas físicas também devem se posicionar cada vez mais de forma profissional nas redes sociais. Isso significa parar de criticar ou falar mal da vida dos outros para começar a gerar conteúdo de valor aos seus potenciais clientes.

Existe um mito no marketing digital de que curtida gera vendas, mas é um tremendo engano. Curtida é apenas uma métrica de vaidade, porque o que converte mesmo é o engajamento que o conteúdo propiciará, mas desde que você esteja falando para o público certo. Não adianta atrair vegetariano e depois tentar vender carne para ele.

O mesmo se aplica para o número de seguidores e sou prova viva disso, pois tenho pouquíssimos seguidores, cerca de 20 mil, somando todas as redes sociais, mas, por outro lado, tenho um engajamento no setor que resulta, por exemplo, em convites para conceder entrevistas à imprensa e para ser um dos embaixadores oficiais da Agrishow 2021, que tem como missão apoiar e divulgar o evento.

E indo um pouco mais além no marketing digital, há um oceano azul a ser navegado por agropecuaristas no mercado de infoprodutos, que é a comercialização de cursos digitais. Se comparados a outros nichos, ainda existem poucos infoprodutos agropecuários nas plataformas de educação digital como Eduzz, Monetizze ou Hotmart.

Uma de minhas missões como treinadora e comunicadora do Agro é justamente incentivar que produtores rurais e profissionais agropecuários criem seus próprios cursos digitais com conteúdo de qualidade. Trata-se de uma grande oportunidade de transmitir para as futuras gerações todo o conhecimento aprendido no campo para fortalecer ainda mais a cadeia produtiva do agronegócio e, com isso, deixar um legado.

Você gostaria de deixar alguma mensagem para aqueles que vivem do agro, no agro e para o agro?

Gostaria de deixar um recado para os produtores rurais e os ambientalistas: “Caros, todo mundo precisa comer e precisa respirar bem. Na discussão entre produção e meio ambiente deve haver consenso e não vencedor. Se houver vencedor, haverá um só grande perdedor: a humanidade”.