Os répteis possuem grande relevância no equilíbrio dinâmico da maioria dos ecossistemas, devido, a exemplo, à predação e consequente controle populacional de muitos invertebrados e pequenos vertebrados. Atualmente são conhecidas mais de 11600 espécies de répteis ao redor do mundo. O Brasil ocupa atualmente o terceiro lugar em riqueza de espécies desse grupo, contando com 848 espécies registradas em nosso território. Desse total de espécies encontramos 38 quelônios, seis jacarés, 82 anfisbênias, 292 lagartos e 430 serpentes, segundo valores apresentados pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio, 2023).
Os répteis podem ser classificados, de modo generalista, como animais vertebrados, tetrápodes e amniotas. Possuem o corpo impermeável, com poucas glândulas e coberto por escamas e/ou placas ósseas. Tais aspectos permitem que os animais da classe Reptilia se desenvolvam em ambientes terrestres.
Além das características citadas, a temperatura corporal dos répteis geralmente varia de acordo com o ambiente (ectotermia), eles excretam ácido úrico, possuem sexos separados e a fecundação é interna.
A Ordem Squamata, subdividida por muitos autores, nas Subordens Serpentes (Ophidia), Anfisbena e Lacertília (Sauria), a qual inclui os lagartos com diferentes famílias e engloba a espécie recém-descrita, Stenocercus canastra.
O S. canastra teve sua primeira descrição por Teresa C. Ávila, Cristiano de C. Nogueira e Márcio Martins em um artigo publicado em maio de 2019. O trabalho faz uma análise comparativa de seis espécies do gênero Stenocercus e uma nova descrição da espécie Stenocercus tricristatus.
Distribuição geográfica
A família Tropiduridae, ao qual o S. canastra faz parte, é nativa do Sul da América, incluindo as ilhas de Trindade (ao norte do Atlântico) e Galápagos. Por esse motivo, a família é conhecida como família dos neotropical ground lizards, ou seja, dos lagartos continentais (terrestres) do neotrópico. Eles possuem uma maior diversidade de espécies no Equador e no Peru.
Os tropidurideos habitam uma vasta gama de habitats, incluindo florestas tropicais de planície, savanas, desertos, e prados de alta montanha acima da linha das árvores. Alguns vivem nas rochas, outros na areia; outros ainda são terrestres ou arborícolas.
O Stenocercus canastra foi recentemente descoberto, e até onde sabemos, a espécie está presente apenas na região da Serra da Canastra, em Minas Gerais. Esta, é caracterizada por uma vegetação típica do Cerrado sendo ela arbustiva e com a presença de gramíneas (campos limpos e campos sujos), presença de formações rochosas (campos rupestres) e com certas áreas de vegetação densa, como matas ciliares.
Os registros obtidos por Avila, Nogueira e Martins (2019) são descritos em paisagens rochosas do Chapadão do Parque Nacional da Serra da Canastra, enquanto os dois registros fotográficos efetuados por um dos autores deste artigo são em campos limpos desse mesmo Chapadão.
Morfologia
Atualmente, o gênero Stenocercus possui mais de 30 espécies distintas que, apesar de um padrão corporal básico comum, apresentam uma grande variedade morfológica. De modo informal são nomeados “Ophryoessoides” as espécies que possuem como características escamas cefálicas grandes, somadas a uma fileira de escamas supraoculares e escamas ventrais quilhadas.
A caracterização do animal recém-descoberto foi efetuada conforme alguns parâmetros comparativos com outras espécies da mesma ordem, entre elas a S. tricristatus. Dentre os aspectos observados, considerou-se o número de escamas na região do corpo e na região torácica e entre os membros anteriores, assim como, o formato das escamas que se encontram na porção anterior à abertura auricular. A nova espécie, S. canastra, possui cabeça piramidal e alargada, escamas dorsais supraciliares bem projetadas parecidas com um pequeno chifre. Ela possui traços bem similares ao S. tricristatus, se diferenciando em detalhes como em sua cabeça mais alongada, um maior número de escamas em seu corpo, escamas pré-auriculares mais “suaves” e aparentemente um corpo mais robusto (AVILA; NOGUEIRA; MARTINS, 2019).
Ameaças
Como esse lagarto ainda é pouco conhecido e estudado, não é possível afirmar, categoricamente, nenhuma ameaça específica. Seu estado de conservação é desconhecido até então. Entretanto, é possível enumerar certas potenciais ameaças, como os frequentes atropelamentos de fauna que ocorrem nas Unidades de Conservação e isso inclui o Parque Nacional da Serra da Canastra. O histórico de incêndios nesta Unidade também é potencialmente preocupante, embora com a adoção de queimas prescritas, parte do Manejo Integrado do Fogo (MIF), adotado nos últimos anos nesse Parque, a ameaça por incêndios pode ser minimizada (BRUNO, et al., 2020).
Referências
ALVARENGA, Jefferson. A Classe dos Répteis. In: ALVARENGA, Jefferson. A Classe dos Répteis. [S. l.], 2019. Disponível em: https://www.biotadofuturo.com.br/a-classe-dos-repteis/.
ATLAS of Brazilian Snakes: Verified Point-Locality Maps to Mitigate the Wallacean Shortfall in a Megadiverse Snake Fauna. [S. l.: s. n.], 2019. South Am. J. Herpetol.; 14(sp1): 1-274.
AVILA, Teresa C. S.; NOGUEIRA, Cristiano C.; MARTINS, M. A new ‘horned‘ Stenocercus from the highlands of southeastern Brazil, and redescription of Stenocercus tricristatus: Reptilia: Tropiduridae. Zoologia, [s. l.], v. 36, p. 1 – 16, 14 maio 2019. DOI https://doi.org/10.3897/zoologia.36.e22909. Disponível em: https://zoologia.pensoft.net/article/22909/.
BRITO, Diego. PAISAGEM GENÉTICA E HISTÓRIA POPULACIONAL DE Tropidurus hispidus (SQUAMATA: TROPIDURIDAE) AO LONGO DE UM MOSAICO ADAPTATIVO DO NORTE E NORDESTE DO BRASIL. UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS DEPARTAMENTO DE ZOOLOGIA, [s. l.], p. 1 – 62, 15 maio 2012. Disponível em: https://repositorio.ufpe.br/bitstream/123456789/10157/1/Disserta%C3%A7%C3%A3o%20Diego%20Brito%202012.pdf.
BRUNO, S. F.; SOUZA, R. O.; RIBEIRO, P. V.; CARVALHO, C. M. S.; BARBOZA, D. V. Org. de Livro: Fogo na Canastra: Reflexões sobre o fogo no Cerrado. Brasília, DF: Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio, 2020, 65p.
CARVALHO, André; JACKAL, Adriana; NISA, Carolina. A novel epidermal gland type in lizards (α-gland): structural organization, histochemistry, protein profile and phylogenetic origins. Zoological Journal, [s. l.], 4 ago. 2021. DOI https://doi.org/10.1093/zoolinnean/zlaa140. Disponível em: https://academic.oup.com/zoolinnean/article/192/4/1137/6048369?login=false.
FILOGENIA e evolução dos Tropidurus do grupo torquatus: Squamata: Tropiduridae. São Paulo: [s. n.], 2015. 61 p. Disponível em: https://teses.usp.br/teses/disponiveis/41/41133/tde-17072015-140133/publico/Marco_Sena_SIMPL.pdf.
HERNÁNDEZ RUZ, Emil José. A morfologia de Stenocercus dumerilii Steindachner (1867) (Squamata, Iguanidae) e suas implicações filogenéticas. 2004. 56 f. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Pará, Museu Paraense Emílio Goeldi, Belém, 2004. Programa de Pós-Graduação em Zoologia.
ICMBio, 2023. ANFÍBIOS e Répteis do Brasil. Goiânia/GO, CEP 74605-090, Setor Leste Universitário, Rua 229, Nº 95, Edifício IBAMA, 4o andar, 13 fev. 2023. Disponível em: https://www.icmbio.gov.br/ran/anfibios-e-repteis-do-brasil.html.
LAGARTOS: subordem Sauria. In: Lagartos: subordem Sauria. [S. l.], 13 jun. 2022. Disponível em: https://www.biodiversity4all.org/taxa/85552-Sauria.
RÉPTEIS. In: ARAGUAIA, Mariana. Répteis. [S. l.], 13 fev. 2023. Disponível em: https://mundoeducacao.uol.com.br/biologia/os-repteis.htm.
RODRIGUES, Miguel; RODRIGUES, Cristiano. The Genus Stenocercus (Squamata: Tropiduridae) in Extra-Amazonian Brazil, With the Description of Two New Species. South American Journal of Herpetology, [s. l.], p. 149-165, 8 dez. 2006. DOI http://dx.doi.org/10.2994/1808-9798(2006)1[149:TGSSTI]2.0.CO;2. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/216898070_The_Genus_Stenocercus_Squamata_Tropiduridae_in_Extra-Amazonian_Brazil_With_the_Description_of_Two_New_Species.
SENA, Marco. Filogenia e evolução dos Tropidurus do grupo torquatus: Squamata: Tropiduridae. São Paulo: [s.n.], 2015. 61 p. Disponível em: https://teses.usp.br/teses/disponiveis/41/41133/tde-17072015-140133/publico/Marco_Sena_SIMPL.pdf.
SMITH, Rebecca; SMITH, Paul. Additional observations on the nest and eggs of Stenocercus caducus (Squamata: Tropiduridae) with a report of nest usurpation. Short Communication, Universidade de São Paulo – ESALQ, 2019. DOI http://dx.doi.org/10.11606/issn.2316-9079.v18i2p259-263. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/phyllo/article/view/165158/158244.
STENOCERCUS empetrus FRITTS, 1972. [S. l.], The Reptile Data Base. Disponível em: https://reptile-database.reptarium.cz/species?genus=Stenocercus&species=empetrus.
STENOCERCUS squarrosus NOGUEIRA & RODRIGUES, 2006. [S. l.], The Reptile Data Base. Disponível em: https://reptile-database.reptarium.cz/species?genus=Stenocercus&species=squarrosus.
VENEGAS, Pablo et al. Four new species of Stenocercus Duméril & Bibron, 1837 (Squamata, Iguania) from the Department of Amazonas in northeastern Peru. Evolutionary Systematics, [s. l.], n. 4, p. 79-108, 18 nov. 2020. DOI 10.3897/evolsyst.4.57578. Disponível em: https://evolsyst.pensoft.net/article/57578/list/8/.
TORRES, Omar. PHYLOGENETIC SYSTEMATICS OF SOUTH AMERICAN LIZARDS OF THE GENUS STENOCERCUS: SQUAMATA: IGUANIA. Department of Ecology and Evolutionary Biology and the Faculty of the Graduate School of The University of Kansas, [s. l.], p. 1 – 464, 11 nov. 2005. Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/213427657.pdf.