Mostrar as vantagens da dinâmica de sistemas aplicada ao comportamento de bovinos. Esse é um dos objetivos do método de modelagem de Dinâmica de Sistemas para simular as relações complexas entre homem, animal e ambiente num contexto socioambiental e global desenvolvido em caráter pioneiro pelo Instituto de Zootenica da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo (IZ/APTA).

De acordo com os estudos, essa simulação computacional contribui para o avanço multidisciplinar na ciência do comportamento animal aplicado de bovinos e, ainda, evitam que os animais sejam expostos à experimentação excessiva, conforme orientação da ética da pesquisa científica. “Pudemos comprovar que a modelagem do comportamento animal, por ser um processo de síntese do conhecimento, proporciona vários benefícios para a pesquisa científica, ensino e manejo dos animais nas fazendas”, informa o pesquisador do IZ, Luiz Alberto Ambrósio.

Segundo ele, na visão sistêmica, ‘o todo é maior que as somas das partes’. “Ao integrar os conhecimentos multidisciplinares, novas descobertas emergem e contribuem para resolver problemas que nenhum pesquisador sozinho daria conta de solucionar”, explica Ambrósio, que contou com a parceria de Luciandra Macedo de Toledo, outra pesquisadora do instituto. Ela acrescenta que a Dinâmica de Sistemas ajuda a entender a trajetória das coisas ao longo do tempo, como e porque as coisas estão acontecendo tal como observamos no dia a dia da pecuária.

“A sociedade tem pressionado os sistemas pecuários para melhorar o bem-estar humano, animal e a busca pela produção sustentável. Com isso, a modelagem tem ajudado a identificar e prevenir efeitos colaterais resultantes de práticas de manejo de animais, que demoram a ser percebidos na prática, e a construir um sistema de produção mais robusto e resiliente”, analisa Luciandra, e explica que eles testam as novas práticas no computador, evitando submeter animais a pesquisas ou até mesmo antes de serem adotadas pelos produtores.

Trabalho à distância

Por conta das restrições relacionadas à pandemia, a modelagem computacional tem sido uma ferramenta que auxilia a pesquisa participativa, com grupos à distância, utilizando recursos de rede de informática pouco explorados. Na visão dos pesquisadores do IZ, a modelagem será uma das inovações presentes nos projetos de pesquisa de comportamento animal, na transição para o novo normal, com a informatização interligando as partes interessadas no desenvolvimento da bovinocultura.

Segundo Luciandra, já são 10 anos de experiência na área do comportamento animal usando a modelagem de Dinâmica de Sistemas. Com base em extensa pesquisa a campo, a modelagem ajudou a desvendar, por exemplo, os fatores intrínsecos dinâmicos que contribuem para o bezerro dar a primeira mamada após o parto, em condições de pasto e em piquetes de maternidade”, exemplifica, apontando que há um grande risco dos bezerros não receberem o colostro logo nas primeiras horas após o nascimento devido a vários fatores dinâmicos identificados.  “E, fica a dica, o comportamento de cuidados diretos e indiretos da vaca é estimulado pelo comportamento do bezerro e vice-versa, construindo uma relação diádica vaca-bezerro, importante para o desenvolvimento da cria e do desempenho do sistema de criação como um todo”, esclarece a pesquisadora.

Ela destaca ainda que, na prática, pouca atenção vem sendo dada para evitar a influência de intrusos [outras vacas do rebanho, pessoas estranhas, animais domésticos, urubus] durante o período do pré-parto até o pós-parto sobre a dinâmica da primeira mamada. “Pesquisas ‘in silico’ com modelos de simulação mostraram como estes fatores dinâmicos afetam o tempo para que o bezerro receba o colostro em tempo hábil”, aponta.

Relevância da dinâmica de sistemas

Projetar a trajetória das coisas ao longo do tempo, como e o porquê de elas estarem acontecendo tal como as vemos agora e se continuarão a crescer ou degradar, se equilibrando ou desequilibrando quando houver intervenções no sistema. Além disso, a Dinâmica de Sistemas ajuda a entender que as relações entre causa e efeito formam ciclos de retroalimentação com trajetórias não lineares e defasadas no tempo. “Por exemplo, o efeito que começa com o tratador fazendo manejo inadequado de bezerras estimulará a agressividade do animal, o que, no futuro, dificultará a ordenha e retornará com prejuízos para o tratador, fechando o ciclo”, comenta a pesquisadora do IZ.

A pesquisadora também atribui maior importância à estrutura interna do sistema e seus processos desencadeadores de problemas do que aos eventos externos. “Uma grande parte dos problemas com o bem-estar animal ocorrem porque não prevenimos e não construímos a resiliência do sistema aos fatores estressantes”, argumenta. Segundo ela, a interconexão entre as coisas ajuda a entender que as boas práticas de manejo não só melhoram o bem-estar animal como também melhoram o bem-estar humano e aumenta, o rendimento financeiro. “E, com isso, pode aumentar o investimento no enriquecimento ambiental para melhorar ainda mais o bem-estar do animal. Este é um ciclo virtuoso de bem-estar”, conclui Luciandra.