Introdução

O urubu-de-cabeça-preta é uma ave necrófaga ou detritívora pertencente à ordem Cathartiformes e à família Cathartidae. Seu nome científico é Coragyps atratus e, popularmente, é também chamado de urubu-preto ou de apenas urubu. Em outros idiomas é conhecido como black vulture e gallinazo. São reconhecidas três subespécies: Coragyps a. atratus, Coragyps a. brasiliensis e Coragyps a. foetens. A família Cathartidae está presente apenas no continente americano, abrangendo mais quatro espécies de urubus (urubu-rei, urubu-de-cabeça-vermelha, urubu-de-cabeça-amarela e urubu-da-mata) e duas espécies de condores (condor-dos-andes e condor-da-califórnia).

O urubu-de-cabeça-preta tem sua plumagem negra, exceto nas pontas das asas, que são claras, uma característica da espécie. Atinge grandes altitudes, tendo o hábito de utilizar correntes de ar quente para subir. Planam e, assim, não desprendem tanta energia em seu voo.

Como outros membros de sua família, possui a cabeça e pescoço desnudos, facilitando a higiene após a alimentação e evitando o acúmulo de restos de alimento em seu corpo. Ao contrário de outras espécies de urubu, o urubu-preto  não possui um bom olfato, usufruindo, entretanto, de sua visão apurada para localizar seu alimento. Mede em torno de 56 a 76 cm de comprimento, com envergadura de asas de 142 cm, pesando cerca de 1,6 kg.

Foto: Sávio Freire Bruno – O urubu-de-cabeça-preta tem pés adaptados para firmar a carcaça e bicos fortes e cortantes para dilacera-la

Distribuição geográfica

Sua distribuição é ampla, sendo encontrado desde a região central dos Estados Unidos até a região central do Chile e da Argentina. No Brasil, está presente em todos os biomas, podendo habitar tanto áreas de mata quanto áreas rurais e urbanas, raro ou mesmo ausente apenas em áreas densamente florestadas.

Foto: Sávio Freire Bruno – Urubus-de-cabeça-preta podem formar grandes bandos. Cada ponto minúsculo e enegrecido na foto corresponde a um espécime. Arredores do município de São Pedro da Aldeia, RJ, 2006

Dieta

Devido ao seu hábito necrófago/dentrítico/saprófago, sua dieta é, portanto, composta preferencialmente por carcaças de animais mortos e restos de matéria orgânica em decomposição. Em certas oportunidades, no entanto, pode se alimentar animais feridos, como pequenos mamíferos, filhotes de tartarugas, ovos e aves. Em ambientes urbanos, é comum se alimentar de restos de comida encontrados em sacos de lixo despojados na rua ou em lixões.

Tem sido relatado que os urubus-pretos são passiveis de retirarem ectoparasitas ou partículas orgânicas do pelo de animais domésticos, a exemplo, de equinos e bovinos (Sazima, 2010). Além disso, há relatos deste hábito de limpeza em capivaras (Sazima, 2007).

 

Foto: Sávio Freire Bruno – Os urubus-de-cabeça-preta frequentam diferentes ambientes. Aqui ele se aproxima de uma carcaça de um peixe marinho, às margens da Laguna de Araruama, RJ

Foto: Sávio Freire Bruno – Urubu-de-cabeça-preta (Coragyps atratus) se alimentando de uma carcaça de peixe (detalhe)

Hábitos

O urubu-de-cabeça-preta tem hábitos diurnos e vive em bandos de, às vezes, dezenas de indivíduos. No chão, andam de forma peculiar e tendem a manifestar uma corrida saltitante singular, às vezes com as asas semiabertas. Ao longo do dia voam com frequência em busca de alimento, em geral, carcaças de animais sem vida. Em seu planar característico, usam as térmicas que se formam a partir do aquecimento do solo pelos raios solares e, assim, atingem alturas consideráveis sem gastos excessivos de energia.

Foto: Sávio Freire Bruno – Os urubus-de-cabeça-preta (Coragyps atratus) são exímios planadores

Já em repouso, é frequente o empoleiramento “comunitário”. Disputas nesses momentos de empoleiramento e ao redor de carcaças são comuns entre urubus. Como pressuposto, o indivíduo adulto exerce dominância sobre o subadulto e o jovem.

Os comportamentos de manutenção incluem a limpeza de suas penas em busca de ectoparasitas e o alisamento delas (preening). Ocasionalmente, um indivíduo realiza esse comportamento em outro (allopreening). Esse comportamento pode ser intraespecífico ou interespecífico, como visto comumente com carcarás (Caracara plancus) por Souto e Franchin (2009). No entorno do Parque Nacional da Serra da Canastra já o observamos, igualmente, exercendo esta mesma interação com os carcarás.

 Hábitos reprodutivos

 Os urubus-de-cabeça-preta têm hábitos monogâmicos. No Brasil, a estação reprodutiva ocorre na primavera, cerca de quatro a seis semanas antes do início do processo de nidificação. Antes, porém, o casal costuma passar longos períodos empoleirados próximos a área que intencionam nidificar, permitindo assim que as aves avaliem a qualidade do local e a ausência de perturbação.

No ambiente natural, os ninhos são feitos em ocos de árvores mortas, entre pedras de penhascos e outros locais abrigados, enquanto que no ambiente urbano, preferem prédios altos abandonados, em locais de baixa iluminação e que propiciem a ovipostura. A fêmea põe cerca de dois ovos de coloração branco-azulados manchados com pontos marrons, os quais são incubados entre 38 e 39 dias.

Foto: Sávio Freire Bruno – Filhote de Urubu-de-cabeça-preta. Município de São Roque de Minas, MG, 2007

Principais ameaças

De acordo com ICMBio/MMA (2018), o urubu-de-cabeça-preta está na categoria “pouco preocupante (LC), em síntese, a menos preocupante em grau de risco de extinção. Esta espécie possui poucos predadores naturais, sendo jibóias, sucuris e alguns mamíferos carnívoros os mais comumente relatados.

Em contrapartida, as principais ameaças aos urubus são antrópicas, sendo a caça, frequentemente pela má fama dessas aves, a destruição de habitats e, muito frequentemente, o atropelamento de fauna. Urubus-de-cabeça-preta são vítimas de atropelamento, principalmente por serem atraídos por carcaças de animais já atropelados ao longo da estrada, tornando-se eles mesmos, as novas vítimas.

Foto: Sávio Freire Bruno – Urubu-de-cabeça-preta (Coragyps atratus) ao lado de tatu recém-atropelado

No Brasil, urubus-de-cabeça-preta tem sido uma das espécies mais associadas à colisão de aves com aeronaves, sendo um desafio para a segurança da aviação e para o bem estar das aves em geral (Bruno e Barreto, 2016).

Referências

BirdLife International. Coragyps atratus. The IUCN Red List of Threatened Species 2016. Disponível em: <https://www.iucnredlist.org/species/22697624/93624950>

Buckley, N. J., B. M. Kluever, R. Driver, and S. A. Rush (2022). Black Vulture (Coragyps atratus), version 2.0. In Birds of the World (P. G. Rodewald and B. K. Keeney, Editors). Cornell Lab of Ornithology, Ithaca, NY, USA

Bruno, S. F.; Barreto, J. R. Aves e aeronaves: riscos e desafios para a ciência e sociedade quanto ao perigo aviário. 1. ed. Niterói: Editora da UFF – Eduff, 2016. v. 1. 122p .4

ICMBio/MMA (2018). Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção: volume 1. 1° edição. Brasília – DF, 492 p

Menq, W. (2018) Urubu-de-cabeça-preta (Coragyps atratus) – Aves de Rapina Brasil. Disponível em: < http://www.avesderapinabrasil.com/coragyps_atratus.htm >

Sazima, I. (2007). Unexpected cleaners: Black Vultures (Coragyps atratus) remove debris, ticks, and peck at sores of capybaras (Hydrochoerus hydrochaeris), with an overview of tick-removing birds in Brazil. Rev. Bras. Ornitol. 15(3): 417-426.

Sazima, I. (2010) Black Vultures (Coragyps atratus) pick organic debris from the hair of a domestic dog in southeastern Brazil. Revista Brasileira de Ornitologia, 18(1):45-48.

Sick, H. (1997). Ornitologia brasileira. Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 921p, 1997.

Silva, C, J. (2018) Urubu-preto – Wikiaves. Disponível em: <http://www.wikiaves.com.br/wiki/urubu-preto>

Souto, H. N., A. G. Franchin, and O. M. Júnior (2009). New record of allopreening between Black Vultures (Coragyps atratus) and Crested Caracara (Caracara plancus). Sociobiology 53V1–5. Disponível em: <http://www.lorb.ib.ufu.br/artigos/allopreening.pdf>

Sávio Freire Bruno é Professor Titular do Departamento de Patologia e Clínica Veterinária, Faculdade de Veterinária, Universidade Federal Fluminense; Professor Colaborador do Curso de Ciências Biológicas e do Curso de Ciência Ambiental (UFF)

Felipe de Abreu Appolinário e Eric Vinicius Rezende Bispo são Acadêmicos do Curso de Medicina Veterinária, Universidade Federal Fluminense
Foto de capa: Sávio Freire Bruno – Urubu-de-cabeça-preta ou urubu-preto (Coragyps atratus)