O Brasil destaca-se mundialmente como um dos maiores produtores e exportadores de carne suína.  Com apenas 5% do total do rebanho efetivo mundial, é o país que tem as melhores condições para aumentar o plantel de suínos. O clima tropical, a extensão territorial, a topografia, a grande produção de grãos (milho e soja, dentre outros), a mão-de-obra acessível e, em adição, a relativa facilidade para manejo e tratamento de resíduos são algumas dessas condições.

Suínos em fase inicial em condições de conforto e bem-estar. (Foto: Rafaella Andrade)

Apesar do crescimento da disponibilidade interna de carne suína no Brasil e das campanhas de esclarecimento da população, o consumo ainda permanece abaixo do potencial. Por outro lado, isso abre perspectivas para investimentos em melhorias no processo de produção e, consequentemente, no consumo e nos resultados econômicos. Ou seja, o panorama sinaliza o potencial de crescimento de um mercado a ser explorado, que vem a ser enfatizado diante da notória maior demanda por alimentos e que sejam de melhor qualidade.

É fato, porém, que em paralelo à questão do crescimento populacional e consequente maior demanda por alimentos, surge a necessidade da intensificação das produções e a inevitável geração de resíduos. Dessa forma, é constante a preocupação com a preservação do meio ambiente e produzir com sustentabilidade passa a ser a ação de ordem. No caso da suinocultura, tal desafio é ainda maior, tendo em vista a significativa quantidade de resíduos  gerados ao longo do processo produtivo e ainda, o efetivo potencial poluidor dos mesmos. Assim, técnicas adequadas de manejo e tratamento desses resíduos são essenciais. Na produção de suínos ocorre também a geração de gases de efeito estufa, cujos efeitos sobre o meio ambiente e biota são incomensuráveis e, portanto, necessitam de controle. Ademais, há a questão dos odores, que são fortes nesse tipo de produção, exigindo atuação efetiva dos envolvidos.

Além da importante abordagem da sustentabilidade, o desafio de uma produção suinícola promissora exige acertos que vão desde a escolha dos animais, da nutrição adequada, do manejo da produção e da reprodução até a adoção de instalações corretamente planejadas e se necessário, acondicionadas, de forma a garantir o conforto e o bem-estar dos animais e pessoas envolvidas. Exige ainda que o custo associado à todos esses alvos seja minimizado. Diante do exposto, pode-se afirmar que não é possível atingir o patamar visado de acertos sem se passar pela aquisição de conhecimento acerca desses temas.

A carne suína

Ao longo do tempo, em nível mundial, pôde-se observar, com relação à carne suína, que houve uma crescente tendência de utilização de animais produtores de carne mais magra, considerada de melhor qualidade. Em um período concentrado nos últimos 30 anos, foi possível apresentar ao mercado, uma carne suína com significativa redução na espessura da camada de gordura subcutânea. Esse passo foi resultado conjunto de excelência genética atingida com base em exaustiva pesquisa, que se difundiu pelo Brasil, além de modernização no manejo reprodutivo, nutricional e sanitário.

Nesse processo evolutivo de tantas facetas, que se instaurou com velocidade acentuada, os consumidores, em adição, se conscientizaram cada vez mais no sentido de conhecer a origem dos produtos que consomem, ou seja, de entender sobre a forma adotada para a criação dos animais.

Características da produção

Com muitos tipos já adotados de processos produtivos, como por exemplo, a produção em sítio único, a produção de leitões, a produção de terminados e a produção de reprodutores, novas tendências despontam no país, como a adoção de sítios de preparação de leitoas ou primíparas. Esses tipos de produção são definidos em função do produto final a ser comercializado, ou seja, pelas exigências de mercado, que resultam na opção por fases específicas de criação a serem conduzidas em uma dada propriedade. O sistema de criação predominante no país é o intensivo, no qual o foco é a produtividade.  Nesse caso, um número maior de animais é confinado em um espaço que anteriormente estaria sendo utilizado para uma densidade menor, é mantido em instalações criteriosamente planejadas e projetadas, e recebe alimentação balanceada com ingredientes de boa qualidade, adequados à cada fase, com o objetivo de aumentar o desempenho produtivo e otimizar o resultado econômico.

A suinocultura industrial brasileira adota a produção integrada, na qual a indústria processadora fornece ao integrado insumos e tecnologia, bem como métodos e procedimentos de trabalho. O integrado tem a missão de produzir de acordo com as normas e fornecer o produto com a qualidade e as características solicitadas pela indústria, que por sua vez, é responsável por processar e distribuir aos pontos de venda e finalmente promover o produto para o mercado consumidor com ações de marketing.

Conforto e bem-estar

Existem muitos conceitos sobre o bem-estar animal, sendo que o mais utilizado foi elaborado na Inglaterra pelo Farm Animal Welfare Council (FAWC), e se fundamenta nas cinco liberdades essenciais aos animais: a liberdade fisiológica (ausência de fome e de sede); a liberdade ambiental (edificações adaptadas); a liberdade sanitária (ausência de doenças e de fraturas); a liberdade comportamental (possibilidade de exprimir comportamentos normais) e; a liberdade psicológica (ausência de medo e de ansiedade).

Vista externa de instalação para suínos, localizada em Portugal, com detalhes construtivos voltados ao manejo de resíduos. (Foto: Acervo do Ambiagro)

Grande parcela da condição de conforto e bem-estar dos suínos está relacionada com o ambiente térmico, definido pelas variáveis temperatura e umidade do ar e ainda, pela ventilação gerada nesse meio. Os suínos são animais homeotérmicos, o que significa que são capazes de manter a temperatura corporal dentro de uma faixa aproximadamente constante, diante de algumas variações nas variáveis térmicas do ambiente no qual estão inseridos. Variações muito acentuadas em tais fatores geram desconforto e perdas na produção e caracterizam situações de estresse para os animais.

As condições de conforto e bem-estar impostas tanto no ambiente térmico quanto no aéreo, no químico, no social e no físico nos quais os animais estão inseridos, de igual forma, estão relacionadas à sua idade ou fase e são estabelecidas com base em padrões pré-definidos.

Após o nascimento os suínos são sensíveis ao frio. Do nascimento até dois dias de vida, as temperaturas efetivas ambientais devem ser controladas para limites entre 32 e 35°C, permanecendo ainda acima de 30°C, aos sete dias de vida. A dificuldade dos leitões de se adaptarem à temperaturas abaixo dessas ocorre principalmente devido ao sistema termorregulador pouco desenvolvido nessa fase. Quando submetidos ao estresse por frio, os leitões ativam mecanismos para manter a temperatura corporal, através da minimização da perda de calor corporal.

Suínos adultos, ao contrário, são muito sensíveis ao calor, o que tem sido limitante para adaptação de algumas raças em determinadas regiões.  Em fase de terminação, por exemplo, maior grau de conforto dos suínos pode ser obtido em ambientes cuja temperatura efetiva esteja na faixa de 15 a 18°C. Certa adaptabilidade do animal pode até ocorrer, o que pode ser medido pela sua capacidade em se habituar a condições ambientais diferentes dessas, com a mínima perda no desempenho e na taxa reprodutiva, com maior resistência às doenças e com menor índice de mortalidade. O grau com que isso ocorre está intimamente relacionado à fase da produção, mas de qualquer forma, condições adversas devem ser evitadas.

O grau de conforto e bem-estar pode ser avaliado por meio de indicadores fisiológicos e comportamentais dos animais. Medidas fisiológicas associadas ao estresse têm sido usadas pelo fato de que, se o estresse aumenta, o bem-estar diminui e o animal o exterioriza via respostas fisiológicas. Assim, são comuns os registros de temperatura corporal e/ou frequência respiratória para associação com o nível de estresse. Quando submetido ao estresse por longo tempo, o suíno, em uma específica fase de criação pode apresentar prejuízos de desempenho nas demais etapas de criação. Dessa forma, tem-se na avaliação dessas respostas fisiológicas, um importante aliado no processo de manejo ambiental. As respostas comportamentais indicam a forma com que o animal está interagindo com o ambiente. Os leitões, por exemplo, se agrupam com o objetivo de aumentar a carga de calor corporal, sinalizando a necessidade de ajuste de um ambiente com temperaturas efetivas abaixo das preconizadas para essa fase. Respostas comportamentais ditas “negativas”, como é o caso do canibalismo e alto nível de agressividade, verificadas com frequência entre os suínos, podem ser indicativas de condições inadequadas num ambiente de criação, que necessita de ajuste..

Com base em resultados de pesquisas na área comportamental, constatou-se que suínos submetidos ao estresse por calor permaneceram menos tempo na posição “em pé”, mais tempo na posição “deitado” e menos tempo praticando a atividade “alimentar”. Observou-se também, que o estresse por calor provocou redução no consumo de ração, no ganho de peso, piorou a conversão alimentar dos animais e afetou negativamente as características qualitativas da carcaça de suínos em terminação.

Além das possibilidades mencionadas para se estimar o bem-estar de suínos, ainda na área comportamental, pode destacar a avaliação por meio do monitoramento da vocalização expressa durante as diferentes fases de produção. A vocalização é uma ferramenta objetiva e não invasiva que evidencia a condição de bem-estar do animal baseada na liberação de padrões vocais distintos.

Alguns pesquisadores observaram condição de bem-estar de suínos, para uma intensidade de ruído inferior ou igual a 73,87 dB; porém, a intensidade de som externado, variando de mais de 73,87 a 80,18 dB, nessas pesquisas específicas, foi associada à condição de sede dos animais, ou seja, conforto e bem-estar comprometidos por esse parâmetro.

Essa interferência no grau de conforto e bem-estar dos animais, como já mencionado, é diretamente relacionada à interação das variáveis que compõem o ambiente de criação. No que diz respeito ao ambiente aéreo, por exemplo, se o animal se encontra em ambiente com baixa qualidade do ar, ou seja, com concentrações de vapor d’água, amônia, gás carbônico, gás sulfídrico e/ou poeiras (os mais comuns nos ambientes de suinocultura), que ultrapassem os limites ditados pelas normas vigentes, fica ainda mais difícil atingir um padrão adequado de bem-estar. Os animais podem externar essas condições inadequadas por meio de enfermidades respiratórias. Sendo assim, o controle da qualidade do ar nos ambientes de produção animal, principalmente por meio de ventilação, é essencial para o aumento da produtividade.

O fato é que aqueles animais de produção aos quais seja garantida adequada condição para alcance do máximo bem-estar, apresentam como consequência, melhor desempenho e maior produtividade, ou seja, produto final em maior quantidade e de melhor qualidade.

Algumas técnicas recentes são utilizadas como ferramentas de manejo voltadas para aumento da sensação de bem-estar do animal. O enriquecimento ambiental para suínos é uma delas e consiste na modificação dos ambientes de criação, com inserção de elementos que simulem situações que ocorreriam na natureza. É mais utilizado na fase pós-desmame (creche), mas pode ser utilizado em qualquer fase de criação. Os elementos básicos utilizados para o enriquecimento ambiental são palhadas, feno, cordas, correntes e até brinquedos para as fases iniciais. Elementos construtivos nas instalações também podem ser usados com esse fim, como por exemplo, as rampas para facilitação dos deslocamentos e até mesmo as lâminas d’água, localizadas em pontos estratégicos, como meios físicos para auxílio na perda de calor.

Seleção de áreas para a Unidade de Produção

Recomenda-se que a unidade de produção de suínos seja instalada em locais de topografia plana ou levemente ondulada e com solo de boas características de drenagem. Água à disposição e energia, elétrica ou outra, alternativa, são fundamentais. O espaço físico disponível deve ser suficiente para prover correta orientação e afastamento entre instalações, de forma que se consiga evitar a incidência de sol no ambiente interno e que uma não atue como barreira à ventilação natural da outra. Além disso, os planos para expansões futuras devem ser considerados.

O clima do local selecionado deve ser um dos fatores balizadores da escolha do tipo ideal de instalação. Devem ser levados em conta os registros das mais altas e mais baixas temperaturas ocorridas, da umidade do ar, da direção e intensidade dos ventos, buscando-se projetar instalações que minimizem os efeitos indesejáveis desses elementos sobre os suínos.

Em adição, o local deve estar próximo do mercado consumidor e munido de vias de acesso. Outros fatores importantes são o acesso á crédito e assistência técnica.

Instalações

Nenhum dos resultados de produção atinge os patamares almejados, sem a criteriosa observância das questões anteriormente mencionadas, diretamente relacionadas à adoção de instalações bem planejadas, isto é, corretamente concebidas, que sejam capazes de fornecer aos animais as condições adequadas de alojamento com o conforto e o bem-estar, necessários para o alcance do desempenho otimizado.

Além disso, a adoção de técnicas adequadas para o manejo alimentar, sanitário, de produção e reprodução figura como fator essencial ao alcance da condição de bem-estar para os suínos criados de forma intensiva.

Instalações bem planejadas e práticas devem ser adequadas à especificidade do manejo de cada uma das diferentes fases de criação, adotado em cada um dos distintos tipos de produção. O manejo adequado, intimamente ligado às instalações, reduz custos de produção devido a maior eficiência de mão-de-obra, além de gerar maior conforto, salubridade aos animais e mais satisfação do produtor.

O sistema de produção de suínos abrange as fases de reprodução, gestação, maternidade, creche, crescimento e terminação. Os aspectos construtivos das instalações são diferentes para cada uma dessas fases de criação, devendo-se atentar, durante o planejamento das mesmas, às necessidades específicas do animal na sua respectiva fase.

Instalações para a fase de gestação de suínos – localizada em Portugal. (Foto: Acervo do Ambiagro)

Instalações para a fase de reprodução de suínos – localizada em Portugal. (Foto: Acervo do Ambiagro)

Durante as fases de crescimento e terminação é importante que os suínos estejam com o peso adequado para as respectivas  idades, o que irá depender de um apropriado manejo durante as fases de maternidade e creche, que lhes garanta conforto e bem-estar. Para suínos na fase de crescimento os valores de temperatura efetiva ambiental, considerados ideais são: 18 °C a 25 °C, sendo a temperatura crítica inferior, 15ºC e a crítica superior, 26 °C.

Instalações para suínos – fase de creche – localizada em Portugal. (Foto: Rafaella Andrade)

Instalações fase de maternidade de suínos com detalhe do sistema de aquecimento de ambiente para leitões – localizada em Portugal. (Foto: Rafaella Andrade)

As condições ambientais ideais nas instalações podem ser obtidas via planejamento e projeto acertados, primeiramente, com uso de técnicas construtivas e materiais adequados. É impreterível definir tipologias adequadas que conjuguem tipos e materiais de cobertura, alturas de pés-direitos e larguras de beirais, aberturas de iluminação e ventilação bem dimensionadas e posicionadas, pisos eficientes e estruturas internas e externas de coleta, contenção e disposição dos resíduos. Porém, tais condições podem ser controladas e ajustadas para atender as necessidades de cada fase dos animais, por meio da agregação às instalações, de técnicas e equipamentos de acondicionamento térmico ambiental. Podem ser citados: uso de pisos aquecidos ou de campânulas para a fase dos leitões; uso de ventiladores, exaustores, aspersores, forros, cortinas e até mesmo pintura externa de telhado com cores claras, além de implantação de cobertura vegetal nos arredores das instalações, para minimização do estresse por calor nos suínos adultos.

O piso das instalações para suínos pode ser totalmente compacto, compacto e dotado de cama, totalmente ripado ou parcialmente ripado. O piso ripado é construído sobre um fosso, cujo objetivo é facilitar a coleta e posterior remoção dos dejetos, permitindo maior higiene e limpeza do local. O uso de piso ripado sobre fosso é bastante comum, por permitir o isolamento dos animais com relação ao local onde são depositados os dejetos.

Ademais, torna-se imperativo associar a essas instalações de criação, as estruturas para o tratamento e disposição dos resíduos gerados. Na suinocultura, os resíduos gerados podem ser sólidos (dejetos, frações de alimentos, camas, carcaças e restos de parto)  ou líquidos, nesse último caso, classificados como águas residuárias (AR). Sendo assim, a tomada de decisão acerca do processo de manejo e tratamento dos resíduos está intimamente relacionada com o tipo de resíduos gerados no processo produtivo. O que deve estar claro é que não são admitidos mais os planejamentos e projetos de unidades de produção, que não levem em conta o aspecto do cuidado com o meio ambiente, ou seja, da sustentabilidade. Pode-se então afirmar, que as estruturas de manejo de resíduos mais comumente adotadas nas granjas suinícolas, com essa finalidade, são as composteiras/esterqueiras, as lagoas  e os biodigestores, cujos projetos devem abordar desde a recolha e contenção nas próprias instalações de criação até o transporte e disposição nos pontos de manejo.

Considerações finais

O conforto e o bem-estar dos suínos estão relacionados ao manejo do ambiente gerado nas instalações e ao manejo geral dos animais, que, se conduzidos de forma adequada durante as diferentes fases de criação, resultarão em melhores índices de produtividade, sem dor ou sofrimento. E se o planejamento e o projeto da unidade de produção forem elaborados de forma que o meio ambiente seja minimamente impactado, então se atingirá a melhor resposta produtiva com alicerce na sustentabilidade.


Cecília de Fátima Souza Ferreira, Ilda de Fátima Ferreira Tinôco e Fernando da Costa Baêta (Professores do Depto. de Eng. Agrícola/Universidade Federal de Viçosa e pesquisadores do AMBIAGRO) e Rafaella Resende Andrade (Pós-graduanda  e pesquisadora do AMBIAGRO).