ENTREVISTA
Diogo Conceição- Presidente do CRMV-RJ-Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado do Rio de Janeiro
Por Luiz Octavio Pires Leal, da Academia Brasileira de Medicina Veterinária.
Quando foi promulgada a lei que criou os Conselhos e o que ela determina?
Os Conselhos Federal e Regionais de Medicina Veterinária foram instituídos pela Lei nº 5.517, de 23 de outubro de 1968. Essa legislação estabelece as diretrizes para o exercício da profissão de médico-veterinário no Brasil e regula a atuação dos Conselhos, atribuindo-lhes a responsabilidade de fiscalizar e normatizar a profissão em todo o território nacional.
Além disso, a Resolução CFMV nº 5/69 organizou os Conselhos Regionais nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso, Bahia, Pernambuco, Paraíba, Ceará e Pará/Amapá.
Entre as principais determinações da Lei nº 5.517/68, destacam-se:
– A exigência de registro nos Conselhos para o exercício legal da profissão;
– A definição das competências dos Conselhos Federal e Regionais;
– A regulamentação das infrações e penalidades aplicáveis aos profissionais;
– A normatização da atuação técnico-profissional da Medicina Veterinária no Brasil.
Qual a razão dessa lei ultrapassada e muito limitante ainda não ter sido atualizada?
A falta de atualização da Lei nº 5.517/68 deve-se, principalmente, à ausência de mobilização política da categoria ao longo dos anos. A Medicina Veterinária é uma profissão essencial para a sociedade, e sua legislação precisa acompanhar as evoluções da área e as demandas atuais dos profissionais.
No entanto, essa realidade está mudando. A atual gestão do CFMV, em parceria com o CRMV-RJ, está atuando ativamente para modernizar a legislação, promovendo um amplo debate com parlamentares e demais órgãos competentes. A atualização da lei é fundamental para garantir um arcabouço jurídico mais eficiente, que fortaleça a profissão e valorize ainda mais o médico-veterinário.
O Sr. não acha que uma legislação ampla poderia promover uma verdadeira revolução, em termos de compreensão e de prestígio, da nossa profissão, a exemplo do que aconteceu com a EMBRAPA?
A criação da EMBRAPA, em 1973, representou um marco para o desenvolvimento da agropecuária brasileira. Com forte investimento em pesquisa e inovação, a empresa pública revolucionou o setor ao proporcionar avanços tecnológicos que tornaram o Brasil um dos maiores produtores agrícolas do mundo.
No caso da Medicina Veterinária, uma legislação mais abrangente e atualizada teria impacto semelhante, elevando o prestígio da profissão e consolidando seu papel estratégico na saúde pública, no agronegócio e na preservação ambiental.
Ao fortalecer o arcabouço legal e garantir melhores condições para o exercício profissional, poderíamos ampliar a valorização do médico-veterinário, assegurando uma atuação ainda mais qualificada e reconhecida pela sociedade.
A inscrição nos Conselhos gera uma substancial renda mensal, mas não permite ampliar muito os serviços prestados. O Sr. concorda com essa premissa? Em caso positivo, qual a solução?
O CRMV-RJ é uma autarquia pública federal regida pela Lei nº 5.517/68, e sua atuação é rigorosamente fiscalizada por órgãos de controle, como o Tribunal de Contas da União (TCU) e a Controladoria-Geral da União (CGU).
A arrecadação das anuidades dos profissionais registrados é destinada exclusivamente ao cumprimento das atividades previstas na legislação, como a fiscalização do exercício profissional, a normatização da área e a garantia da ética na Medicina Veterinária e na Zootecnia.
Embora a receita dos Conselhos seja significativa, sua aplicação segue critérios legais, o que limita a ampliação de serviços. No entanto, a atual gestão do CRMV-RJ tem atuado com austeridade e transparência, garantindo a melhor aplicação dos recursos disponíveis em benefício dos cerca de 22 mil profissionais registrados no estado.
O Presidente dos Conselhos e seus diretores são compensados financeiramente pelo tempo dedicado à administração da entidade? E qual é a sua responsabilidade legal?
Não. A Presidência e a Diretoria Executiva do CRMV-RJ são cargos honoríficos, ou seja, exercidos sem remuneração. Conforme o artigo 19 da Lei Federal nº 5.517/68, cabe ao presidente a responsabilidade administrativa do Conselho, incluindo a prestação de contas aos órgãos federais competentes.
A Diretoria Executiva (DE), composta pelo presidente, vice-presidente, secretário-geral e tesoureiro, é responsável por executar as resoluções do Plenário do CRMV-RJ e auxiliar na gestão administrativa e financeira da entidade, conforme a Resolução CFMV nº 591/92.
Além disso, o CRMV-RJ conta com um Plenário formado por 12 conselheiros (seis efetivos e seis suplentes), que se reúnem mensalmente para deliberar sobre fiscalização, ética profissional e demais questões pertinentes à Medicina Veterinária e à Zootecnia.
O MEC autorizou mais de 600 faculdades de Medicina Veterinária no Brasil, mesmo sem estrutura adequada. Como os Conselhos podem corrigir essa situação?
O CRMV-RJ tem se manifestado ativamente contra a abertura indiscriminada de cursos de Medicina Veterinária sem a estrutura mínima necessária. O Conselho tem promovido debates públicos, campanhas de conscientização e diálogo com órgãos reguladores para exigir maior rigor na autorização de novos cursos e na fiscalização da qualidade do ensino.
O problema da proliferação descontrolada de faculdades prejudica não apenas os estudantes, que pagam altas mensalidades por uma formação inadequada, mas também a sociedade, que precisa de profissionais bem capacitados para atuar com segurança e competência.
O CRMV-RJ continuará cobrando do MEC medidas mais rígidas, além de fortalecer a fiscalização do exercício profissional para garantir que apenas médicos-veterinários qualificados atuem no mercado.
O Exame de Habilitação Profissional em Medicina Veterinária é uma solução viável? Por que ainda não foi implementado?
O CRMV-RJ é totalmente favorável à criação do Exame de Habilitação Profissional em Medicina Veterinária, semelhante ao exame da OAB para advogados.
Em 2023, o Projeto de Lei nº 4262/2023 foi apresentado pelo deputado Marcelo Queiroz, com a colaboração do presidente do CRMV-RJ, Diogo Alves, para instituir esse exame no Brasil. O PL altera a Lei nº 5.517/68 e está atualmente em tramitação na Câmara dos Deputados.
O objetivo do exame não é eliminar candidatos, mas garantir que apenas profissionais devidamente capacitados obtenham o registro profissional, assegurando a qualidade dos serviços prestados à sociedade e à saúde pública.
O que motiva o Sr. a assumir a presidência do CRMV-RJ? Quais são seus planos de curto e longo prazo?
Presidir o CRMV-RJ é um compromisso com a valorização da Medicina Veterinária e da Zootecnia para as futuras gerações. Minha trajetória pessoal e profissional sempre esteve ligada ao setor agropecuário e à clinica de pequenos animais, além da defesa da classe veterinária, e vejo essa missão como uma oportunidade de fortalecer nossa profissão.
Como presidente, busco promover avanços na legislação, aprimorar a fiscalização, ampliar o reconhecimento da Medicina Veterinária e Zootecnia e garantir melhores condições para os profissionais.
A curto prazo, seguimos trabalhando para aprovar o Exame de Habilitação Profissional, fortalecer a fiscalização dos cursos de Medicina Veterinária e modernizar a gestão do Conselho. No longo prazo, o objetivo é consolidar a profissão como um dos pilares essenciais da saúde pública, do agronegócio e da sustentabilidade ambiental no Brasil.