A arara-azul-grande (Anodorhynchus hyacinthinus) é conhecida também como arara-preta, arara-hiacinta e arara-una. Pertence à ordem Psittaciformes e à família Psittacidae. O Brasil é o país com maior diversidade de representantes desta família, sendo encontradas aqui 72 espécies.
Os integrantes desta família são aves majestosamente coloridas, de bico curto e muito curvo. Elas possuem pés habilidosos, costumeiramente ruidosas e sociáveis, habitam cavidades arbóreas. Diversas espécies pertencentes a esta família estão sofrendo com a diminuição das populações, sendo um dos grupos de aves mais ameaçados de extinção na região Neotropical.
Portando até 1 metro de comprimento e pesando até 1,5 kg, a arara-azul-grande é considerada a “gigante entre as araras”, e a maior representante dos psitacídeos do mundo. Seu bico é negro e robusto, parecendo maior do que o próprio crânio. A plumagem é quase que inteiramente azul-cobalto, com a face inferior da cauda e das asas de coloração negra. Já nas margens de sua mandíbula e da região ocular, está presente a cor amarela.
Distribuição geográfica
No passado, a arara-azul-grande possuía uma distribuição ampla e contínua nas regiões do sul da Amazônia até os Cerrados do Brasil Central e Pantanal. Atualmente ela vive sobretudo em remanescentes de campos abertos, buritizais e matas ciliares do Mato Grosso (Pantanal), Goiás, Bahia, Minas Gerais, Amapá, Maranhão, sul do Piauí, Pará (leste da região amazônica e oeste de Altamira) e Tocantins. Como a espécie se encontra distribuída em três regiões do Brasil, suas populações aparentemente são isoladas.
Também é encontrada na Bolívia, próximo da divisa com o Brasil e norte do Paraguai; além de haver indícios de ter sido registrada no rio Mapori, sudeste da Colômbia.
Alimentação
A arara-azul-grande, devido ao bico, notável pelo seu tamanho e força, juntamente com sua forte pressão mandibular, tem a habilidade de abrir frutos extremamente duros, por isso, possui uma dieta altamente especializada, composta principalmente por cocos de palmeiras nativas, como o buriti (Mauritia flexuosa).
No Pantanal Mato-grossense, a arara-azul-grande possui uma dieta especializada no fruto das palmeiras acuri e bocaiuva. Na região entre a Bahia, Maranhão, Piauí e Tocantins, os indivíduos se alimentam do catolé e da piaçava. Nas regiões de Altamira e Carajás, ela opta pelo babaçu, inajá, acuri e o tucum.
Hábitos de vida
A arara-azul-grande é uma ave social monogâmica, que forma casais, vivendo aos pares, famílias ou bandos, com populações consideradas sedentárias, pois realizam apenas pequenos deslocamentos diários para alimentação ou reprodução. Os casais formados permanecem juntos mesmo fora da estação reprodutiva, e, quando estão nesta, dividem tarefas, como escolha, reforma e cuidado do ninho e dos filhotes.
Na região do Pantanal, elas são encontradas em áreas abertas, entremeadas de matas com palmeiras. Já na região do Pará, utilizam as florestas úmidas, optando pelos locais de várzeas, que também possuem uma diversidade de frutos e suas respectivas sementes das quais se alimentam. Em regiões com regimes mais secos, normalmente são encontradas em platôs ou vales dos paredões rochosos.
Reprodução
A arara-azul-grande constrói seus ninhos principalmente em determinadas árvores, como em manduvis e axixás, respectivamente, nas populações do Pantanal e do Pará. Ela também pode optar por buritis, castanhas-do-pará ou até cavidades de paredões rochosos. Seus ninhos são feitos a partir de cavidades, iniciadas muitas vezes por espécies de pica-paus, pela quebra de ramo lateral da árvore ou por atividades de fungos e cupins. Então as araras utilizam de seus bicos para aumentar esses espaços, assim estabelecendo seu local reprodutivo, frequentemente por um longo período, podendo se reproduzir por mais de uma década no mesmo ninho.
As araras-azuis formam um único casal com laços sólidos, podendo se reproduzir anualmente ou apenas uma vez a cada dois anos, pois o cuidado parental persiste em média por um ano. Esta arara põe de um a três ovos que são incubados por cerca de 28 a 30 dias, sendo que a fêmea incuba os ovos enquanto o macho fica responsável pela defesa do ninho e a busca do alimento. Geralmente, há a sobrevivência de apenas um filhote, devido à mortalidade de ovos e filhotes, incluindo o abate por predadores como o tucanuçu (Ramphastos toco), gralhas, gaviões, gambás e quatis. Além disso, há perda de ovos também por inviabilidade, contaminação por fungos e bactérias, má-formação ou mau posicionamento do embrião dentro do ovo. Também pode haver perda do ninho, através de inundação dentro da cavidade ou queda da árvore. Os filhotes, nos primeiros dias de vidas, também são suscetíveis a não se desenvolverem, por inanição, baixa temperatura, doenças ou infestação por ectoparasitas. Infestações dos ninhegos por formigas carnívoras do gênero Solenopis e outros insetos, também foram observadas.
Os filhotes nascem com total dependência dos pais, sendo cuidados por ambos. Permanecem exclusivamente em seu ninho por até três meses e meio, período em que se encontram mais vulneráveis ao parasitismo e predação. A taxa de mortalidade é mais crítica na fase de incubação do ovo e da sobrevivência do filhote e vai decrescendo conforme os anos passam, até se transformarem em adultos. Mesmo após os primeiros voos, os jovens ainda precisam dos pais para obterem alimento, se tornando independentes apenas a partir de seus 12 meses, podendo chegar até os 18 meses sendo cuidados. A arara-azul só atinge a idade para reprodução após sete anos de idade.
Ameaças
A arara-azul-grande tem sido ameaçada principalmente pela destruição de seus hábitats, sendo frequente a substituição das grandes extensões de cerrado, buritizais e matas ciliares no interior do Brasil por plantações de grãos e pastagens.
Além disso, devido à sua coloração chamativa e seus hábitos diferenciados, se tornaram alvos seculares de caçadores que costumam exportá-las para países diversos, podendo vender cada arara-azul-grande por dezenas de milhares de dólares.
A densidade populacional da espécie no Pantanal chegou a níveis críticos na década de 1980, com estimativas de captura de mais de 10 mil aves para o comércio ilegal, sendo vendidas como “pets” e mortas por falta de cuidados básicos relacionados a sua dieta e dificuldades na tentativa de domesticação. Na década de 1990, o problema se agravou ainda mais, com a perda de seu hábitat, principalmente pelos desmatamentos e queimadas, resultando no tamanho populacional de apenas 1.500 indivíduos.
Apesar do comércio ilegal da espécie ter se reduzido comparado à década de 1980, a apreensão da espécie no Brasil em ações do IBAMA e polícias ambientais, assim como sua comercialização em feiras de animais domésticos na Bolívia, ainda são práticas feitas no século XXI.
Conservação
Mesmo diante de várias ameaças, houve uma significativa mudança no estado de conservação das araras-azuis-grandes, em razão de muito foco e esforço para sua preservação, especialmente na região do Pantanal. O número estimado de indivíduos da espécie em vida livre no Brasil é de 6.500 aves, e a maior parte delas se encontra no Pantanal Mato-grossense.
Ações como o monitoramento das populações de arara-azul-grande no Pantanal brasileiro, realizado desde 1990, pelo Projeto Arara-Azul, iniciativa da bióloga Neiva Maria Robalo Guedes, em que são realizados enormes esforços para a proteção e recuperação da espécie através de trabalhos de estudo e conservação, são de extrema relevância.
Mesmo diante de todos os esforços para sua conservação, de acordo com a IUCN (2015), a arara-azul-grande está incluída na categoria “vulnerável à extinção”. Já de acordo com a portaria n° 148 publicada pelo Ministério do Meio Ambiente em 2022, a arara-azul-grande deixou de constar na Lista Nacional de Espécies Ameaçadas de Extinção, como resposta aos esforços conservacionistas destinados à espécie. Entretanto, ameaças como os grandes incêndios ocorridos no Brasil, particularmente os que ocorreram no Pantanal em 2020 e 2021, retratam o agravamento e a fragilidade a que os biomas brasileiros e sua respectiva biodiversidade estão sujeitos. Neste contexto, estudos sobre a biologia, ecologia e variabilidade genética da arara-azul-grande são indispensáveis para a elaboração de estratégias preservacionistas para suas populações, além do desenvolvimento de ações de incentivo à conservação da espécie por meio de ações educacionais.