Autoras: Alana Dias Nunes do Souto, Beatriz Rendsborg Hansen dos Santos, Flávia Andrade de Souza e Lorrany Luize Leibão Torres Ferreira – Discentes da Liga de Equídeos CENTAURUS da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

Sob a supervisão de Clayton B. Gitti – Professor do Curso de Medicina Veterinária da UFRRJ

O Mormo é uma doença bacteriana de notificação compulsória dos equinos, asininos e muares, e considerada uma zoonose pela possibilidade de transmissão aos seres humanos, principalmente pelo seu caráter ocupacional. A transmissão ocorre pelo contato direto com secreção nasal ou oral de animais infectados, ou indiretamente por meio de cochos, bebedouros e materiais contaminados. A principal via de infecção é a oral, onde o animal ingere comida ou água contaminada pela bactéria (Burkholderia mallei), que penetra a mucosa digestiva e se dissemina através da corrente sanguínea.

A doença é caracterizada por apresentar as formas cutânea e a respiratória, onde são observadas a formação de abcessos caseosos que ulceram, não só nos linfonodos subcutâneos que drenam o sistema respiratório, como em outros linfonodos e vísceras do organismo do animal. O Mormo se apresenta geralmente em formas mais agudas nos asininos e muares e mais brandas e crônicas em cavalos.

Os sinais clínicos gerais são hipertermia, apatia e caquexia, seguido de sinais respiratórios como dispneia, tosse, corrimento nasal que vai do mucopurulento ao hemorrágico e pneumonia granulomatosa devido aos nódulos e úlceras que a bactéria provoca no trato respiratório. Alguns animais podem apresentar semiflexão e abdução do membro posterior devido à presença de abcessos em linfonodos profundos na musculatura. Na forma cutânea, observam-se nódulos firmes dispostos pelos vasos do sistema linfático, com formação semelhante a um colar de pérolas ou rosário, em regiões de abdômen, pescoço, costado e membros. Sobretudo, animais assintomáticos atuam como a fonte primária de disseminação da doença.

É de suma importância que medidas de prevenção sejam tomadas a fim de se evitar a infecção pela doença. Atualmente não existe vacina eficaz para animais ou seres humanos no entanto, podem ser feitas a desinfecção de instalações e fômites, higienização de utensílios como cabrestos, arreios entre outros, utilização de cochos individuais e de equipamento de proteção individual (EPI) para aqueles que forem manipular esses animais. Além disso, o controle de trânsito animal instituído pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) também contribui como medida de prevenção do Mormo, o qual, o trânsito interestadual de equídeos e a participação em aglomerações é condicionado à apresentação do documento oficial de trânsito animal aprovado pelo MAPA. Para emissão desse documento, é necessária a realização de testes laboratoriais para o diagnóstico do Mormo: o ELISA como o teste de triagem realizados em laboratórios credenciados na Rede Nacional de Laboratórios Agropecuários do MAPA com validade de 60 dias para trânsito animal.

Os sinais clínicos não permitem um diagnóstico definitivo, principalmente nos estágios iniciais ou de latência da doença. Assim, a confirmação requer análises laboratoriais. As provas para o diagnóstico laboratorial são:

  1. Detecção do agente/antígeno – confirmatórias da infecção.
  • Cultura e isolamento para identificação da Burkholderia mallei
  • Identificação por técnicas moleculares – PCR e RT-PCR em tempo real
  1. Detecção de anticorpos
  • Testes sorológicos de triagem:

– Fixação de Complemento (FC)

– ELISA (enzyme-linked immunosorbent assay ou ensaio de imunoabsorção enzimática).

A Fixação do complemento (FC) é utilizada somente para certificação de trânsito internacional e o ELISA é utilizado para triagem na investigação de suspeitas.

  • Teste sorológico confirmatório: Western Blotting (WB)

Os testes para fins de investigação epidemiológica de suspeitas ou para a eliminação de focos devem ser realizados nos Laboratórios Federais de Defesa Agropecuária (LFDA)  pelo Serviço Veterinário Oficial (SVO). A colheita de amostras para a  finalidade de trânsito animal deve ser realizada somente por médico veterinário habilitado cadastrado no SVO de seu estado.

Caso confirmado de Mormo é o caso provável considerado que atenda a um ou mais dos seguintes critérios:

  1. isolamento e identificação de Burkholderia mallei em amostra de um equídeo; ou
  2. detecção de antígeno ou material genético específico de B. mallei em amostra de um equídeo com sinais clínicos, ou patológicos compatíveis com mormo; ou
  3. detecção de anticorpos específicos de B. mallei em amostra de um equídeo com sinais clínicos ou patológicos compatíveis com mormo. As medidas de controle recomendadas pelo MAPA envolvem a interdição da propriedade possuidora do animal portador da doença juntamente com a eutanásia do mesmo acompanhada do SVO, que inclusive deve ser notificado imediatamente já no caso de suspeita da doença. A eutanásia faz-se necessária pois ainda não existe um tratamento e uma vacina capazes de retirar completamente o agente causador dos animais infectados, deixando-os suscetíveis a transmiti-la para outros animais sadios e para humanos. Feita a interdição e a eutanásia, o próximo passo é a incineração da carcaça, seguida da descontaminação de todo o material que tenha entrado em contato com o animal infectado. Por fim, a desinterdição do local será feita após a análise do SVO e após a confirmação que não há mais casos confirmados neste mesmo local.

Segundo o Food and Agriculture Organization (FAO, 2014), o Brasil apresenta, mundialmente, o quarto maior rebanho de equinos, totalizando 5.577.539 animais. Logo, a equideocultura apresenta grande impacto econômico e social no país, especialmente quando falamos do agronegócio, tendo o Mormo como uma das principais ameaças à criação de equinos, visto que os animais infectados devem ser submetidos à eutanásia, além da interdição das respectivas propriedades que apresentarem focos da doença, causando diversos prejuízos aos proprietários. Acreditou-se que essa patologia havia sido erradicada na década de 60 pela falta de registros, porém, foram notificados novos casos de Mormo em 1999 na região Nordeste do país. Desde então, ainda são observados inúmeros casos ao longo de todo o território brasileiro.  Em 2022, foram registrados 221 casos da doença no Brasil onde os cinco estados com o maior número de registros foram Amazonas (37), Pernambuco (30), Pará (22), Rio Grande do Sul (20) e Tocantins (19).

Conclui-se, então, que por tratar-se de uma doença que provoca elevado impacto na criação animal e pelo seu caráter  zoonótico, é imprescindível a conscientização dos proprietários e cuidadores de equinos acerca dos principais aspectos da doença, a fim de promover a execução de um manejo sanitário adequado na tropa, além da implementação de barreiras sanitárias e constante vigilância para controle da doença visando não só a saúde animal e humana como a manutenção e estabilidade da cadeia comercial do agronegócio equino.

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