Autores: Breno Reis Corrêa Arigoni, Daniel Yusa Dominguez Freitas, Jaqueline Lima de Miranda e Mariana Oliveira Lourenço – Discentes do Curso de Medicina Veterinária da UFRRJ

Sob a supervisão de Prof. Clayton Bernardinelli Gitti e Prof. Edson Jesus de Souza – Docentes do Curso de Medicina Veterinária da UFRRJ

A Cinomose Canina (CC) é uma doença infectocontagiosa multissistêmica, de caráter cosmopolita, causada por vírus da Família Paramyxoviridae e do gênero Morbillivirus, responsável por ser altamente patogênico e provocando altas taxas de mortalidade (DEZENGRINI et al. , 2007), podendo chegar a 80% dos animais acometidos (CATROXO, M.H.B. 2003). Sabe-se que não somente os canídeos domésticos (Canis lupus familiaris) são acometidos mas também canídeos silvestres como o Cerdocyon thous (cachorro-do-mato) e o Chrysocyon brachyurus (lobo-guará), sendo estes tidos como hospedeiros acidentais visto que o ciclo do vírus comumente não apresenta a participação destas espécies. No Brasil, com o avanço, desenfreado e mal planejado ecologicamente, do urbanismo e consequente crescimento das cidades, há mais e mais vezes a invasão dos ambientes naturais das espécies silvestres, levando ao aumento do seu contato com os canídeos domésticos, configurando assim uma das hipóteses para o crescimento da porcentagem de canídeos silvestres acometidos pela Cinomose Canina.

No Brasil, cerca de 9% da mortalidade de lobos-guará é decorrente de doenças contagiosas, sendo o Vírus da Cinomose Canina (VCC) responsável por 19,4% dos óbitos ocorridos. Também é necessário citar que ainda falta monitoramento destes animais e mais informações quanto ao desenvolvimento desta doença e outras doenças contagiosas (JORGE e JORGE, 2014).

Em relação a etiologia, o Canine Distemper Virus (CDV) é um agente viral RNA- de fita simples. possuindo alta capacidade infectante via transmissão por meio do contato direto com secreções contaminadas advindas de animais doentes e aerossóis, além da contaminação ambiental (presença do agente no solo e água). A partícula vírica apresenta também um envelope lipoproteico, sendo este um fator de virulência importante para o controle do agente no ambiente, visto que o envelope apresenta fragilidade a produtos lipossolúveis, facilitando assim a destruição e inativação do vírion (PORTELA, V.A.B et al., 2017).

A partir da inalação dos vírions, o VCC se dirige ao tecido linfóide cervical (linfonodos bronquiais e retrofaríngeos), além das tonsilas, se replicando nestas estruturas, ocorrendo assim a primeira viremia (ocorre num período de 2 a 4 dias). A partir disso, há migração para o tecido linfóide sistêmico (medula óssea, baço, placas de Peyer, timo, dentre outras…) e ali ocorre segunda viremia (ocorre num período de 4 a 6 dias), quando se tem o segundo pico febril e imunossupressão. Após isso, o vírus se dirige para os órgãos e sistemas orgânicos mais afetados, levando ao surgimento dos principais sinais clínicos.

Sendo a Cinomose uma doença com caráter multissistêmico, os sinais clínicos surgem a partir de diferentes sistemas orgânicos, sendo os mais acometidos o sistema nervoso, tegumentar, ocular e respiratório. De forma geral, os sinais clínicos mais decorrentes da doença são secreções nasais e oculares, hiperqueratose dos coxins e digitais e do focinho, dermatite pustular, tosse, dispnéia, febre, enterite catarral podendo evoluir para hemorrágica, broncopneumonia, conjuntivite e lesões no sistema nervoso que podem ocasionar em ataxia, paralisia dos membros posteriores, vocalização e mioclonias. (Gebara et al., 2004a; Koutinas et al., 2004; Silva et al., 2005; Greene e Appel, 2006; López, 2007; Sonne et al., 2009; Arns et al. 2012; Silva et al., 2005; Amude et al., 2007; 2012; apud PORTELA, V.A.B et al . , 2017). É importante frisar que a sintomatologia clínica é semelhante entre os canídeos domésticos e os silvestres, variando de acordo com a espécie, cepa, condições ambientais, idade, estado geral e imunológico do indivíduo. (GOMES, 2006).

O diagnóstico para Cinomose Canina é feito a partir da análise dos sinais clínicos, porém, pela característica multi-sistêmica, erros podem ser cometidos na hora do diagnóstico (FRASER et al., 1997). Dessa forma é possível utilizar diagnósticos complementares para embasar a sua análise e diagnóstico clínico, como : Isolamento Viral, Técnicas Sorológicas, Histopatológico, Técnica de Reação em Cadeia pela Polimerase Precedida de Transcrição Reversa (RT- PCR), Análise do Líquido Cefalorraquidiano, Teste de Imunofluorescência. (NASCIMENTO, D.N.S, 2009).

Semelhantemente às diversas patologias de origem vírica que acometem os canídeos domésticos e silvestres, a Cinomose Canina não apresenta recurso terapêutico específico, como tratamento à base de antivirais e quimioterápicos, à disposição no mercado. Com isso, o tratamento sintomático (com uso de antibioticoterapia, antipiréticos, antieméticos, fluidoterapia e anticonvulsivantes, etc.) e de suporte somado ao uso de técnicas integrativas (como terapia com uso de células-tronco, acupuntura, laserterapia, dentre outras), continuam sendo os métodos mais empregados.,Sabe-se que o mesmo protocolo terapêutico utilizado para os canídeos domésticos pode ser usado no tratamento dos canídeos silvestres, contudo deve-se atentar quanto às particularidades na posologia dos fármacos. (NISHIOKA & ARIAS, 2005).

O VCC é capaz de sobreviver em torno de 20 minutos em exsudatos, sendo sensível a maioria dos desinfetantes e solventes lipídicos em decorrência do envelope que o circunda, por isso o isolamento de cães doentes deve ser realizado em conjunto com a desinfecção do ambiente para o controle efetivo da Cinomose. Porém, a medida profilática mais efetiva é a vacinação, que pode ser baseada na inativação viral ou na recombinação, e mesmo tendo isso em mente, a vacinação contra o VCC em espécies silvestres é uma medida pouco estudada. As vacinas, quando testadas em espécies silvestres (lobo guará) em cativeiro tiveram imunização de 72% para Cinomose quando usadas vacinas de vírus atenuado, sendo importante reforçar que mais estudos nessa área são necessários (MAIA & GOUVEIA, 2001).

Percebe-se que, com o passar dos anos, o maior contato entre os cães domésticos e cães silvestres aumentou a ocorrência de Cinomose Canina entre os canídeos silvestres, demonstrando que a doença apresenta grandes impactos na saúde animal e ambiental. Com isso, é necessário frisar a importância dos métodos de profilaxia, em especial a vacinação e o isolamento e tratamento dos animais acometidos, a fim de evitar a disseminação do agente etiológico por entre as populações canídeas, tanto domésticas quanto silvestres.

Referências bibliográficas:

DEZENGRINI R et al. 2007. Soroprevalência das infecções por parvovírus, adenovírus, coronavírus canino e pelo vírus da cinomose em cães de Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil. Ciência Rural 37: 183-189.

CATROXO,M.H.B. Divulgação técnica Cinomose Canina . Biologico. http://www.biologico.sp.gov.br/uploads/docs/bio/v65_1_2/catroxo.pdf .Data de acesso (30/10/2023).

JORGE, M. Luísa   S.; JORGE, Rodrigo S.P. Capítulo 36 Carnivora – Canidae (Cachorro-do-mato, cachorro-vinagre, lobo-guará e raposa-do-campo). In: 766-768.

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