Autora: Giulia Patricio Moraes – Discente do Curso de Medicina Veterinária da UFRRJ
Sob a supervisão de Prof. Clayton Bernardinelli Gitti e Prof. Edson Jesus de Souza – Docentes do Curso de Medicina Veterinária da UFRRJ
A leptospirose é uma doença zoonótica de ampla relevância global, que representa uma das principais causas de morbidade no cenário de saúde pública. É uma doença intrinsecamente ligada à pobreza, afetando principalmente populações em áreas de recursos econômicos limitados. Além disso, a leptospirose é classificada como uma “Doença Tropical Negligenciada” (DTN), uma categoria designada para doenças predominantes em comunidades carentes que, devido à falta de interesse por vezes do próprio governo, enfrentam desafios substanciais na pesquisa e desenvolvimento de tratamentos e vacinas eficazes.
É caracterizada por ser uma enfermidade zoonótica infecciosa febril aguda ou crônica, de etiologia bacteriana, causada por espiroquetídeos do gênero Leptospira, composto por cerca de 250 tipos de sorovariedades, sendo os principais: as Leptospiras icterohaemorrhagiae e a canicola. Em cães, a enfermidade pode se manifestar de duas maneiras: de forma discreta, sem sinais visíveis, ou de maneira clínica, com sinais que podem ser agudos ou crônicos. Assim como os roedores, os cães infectados também podem excretar a bactéria da leptospirose em sua urina, tornando-se assim propagadores da doença. Os sinais clínicos podem variar dependendo do tipo de Leptospira envolvida; por exemplo, o grupo icterohaemorrhagiae frequentemente resulta em icterícia como sinal principal, enquanto o grupo canicola pode levar a vômitos, diarreia, úlceras na boca e necrose da língua. É importante notar que a infecção também pode ocorrer de forma assintomática, ou seja, sem apresentar sinais evidentes de doença.
Apesar de sua alta prevalência no Brasil e da exigência de notificação compulsória, a leptospirose muitas vezes não recebe a atenção e o investimento necessários por parte das autoridades de saúde. Isso a coloca em uma posição peculiar de ser duplamente negligenciada no país, devido às suas características epidemiológicas que a torna particularmente desafiadora de combater. A negligência em relação à doença é um problema que merece destaque e ação imediata, uma vez que essa doença impacta significativamente a saúde pública e representa uma preocupação crescente, tanto no Brasil quanto em todo o mundo.
Sua transmissão geralmente ocorre através do contato com a urina de animais reservatórios. Isso é especialmente preocupante em áreas urbanas propensas a enchentes, onde a doença pode se espalhar mais facilmente. As bactérias Leptospira, sobrevivem em ambientes com umidade e temperaturas específicas (28-32°C) e em pH neutro a levemente alcalino (7,2-7,6), o que favorece sua persistência no ambiente. Esses fatores influenciam a disseminação da leptospirose em locais propensos a inundações e com uma população significativa de animais reservatórios.
Quanto à capacidade dos cães domésticos de servirem como reservatórios da leptospirose, essa é uma questão relevante que merece mais investigação, pois dado seu potencial reservatório, seu consequente papel na epidemiologia da leptospirose nas cidades não deve ser negligenciado. Sabemos então que a leptospirose em cães representa um sério desafio em termos de saúde pública, não apenas devido à severidade de sua manifestação clínica, mas também devido ao seu potencial de transmissão para os seres humanos, uma vez que há uma proximidade significativa entre ambos. Dessa maneira, a vacinação de cães e condições sanitárias adequadas contribuem para atenuar a ocorrência da doença.
O documento elaborado pela Associação Veterinária Mundial de Pequenos Animais (WSAVA) sobre diretrizes para vacinação de cães e gatos, considera a vacinação contra a leptospirose como não essencial, porém reconhece que é impossível de se produzir um conjunto de diretrizes que sejam igualmente aplicáveis a cada nação membro da Associação. Portanto, embora haja uma associação internacional que classifique a vacina contra a leptospirose como não essencial para cães, é fundamental considerar o contexto brasileiro. Isso se deve ao fato de que, de acordo com o próprio documento elaborado, existem diferenças significativas entre os países e regiões geográficas em relação à presença ou ausência de doenças infecciosas, bem como sua prevalência. Além disso, a disponibilidade de vacinas, a quantidade de cães e gatos de estimação em comparação com aqueles que vivem ao ar livre, e as condições socioeconômicas desempenham um papel importante nessa decisão.
Dessa maneira, a abordagem da vacinação e reforço sanitário desempenham um papel crítico na promoção da saúde pública. Além disso, é imperativo considerar as variáveis regionais, econômicas e de acesso a serviços veterinários, que variam significativamente em todo o país. A disponibilidade de produtos vacinais e a prevalência de animais abandonados são fatores que devem ser levados em conta na formulação de estratégias de vacinação.
Fontes de Consulta:
https://www.arca.fiocruz.br/bitstream/handle/icict/51680/1729.pdf?sequence=2&isAllowed=y
https://www.arca.fiocruz.br/bitstream/handle/icict/27060/Rodrigues_2017.pdf?sequence=2&isAllowed=y