Ovinos e caprinos para carne, leite, couro e lã são criados em todo o Brasil, pois são animais que se adaptam facilmente às adversidades e são capazes de converter materiais de baixo valor nutricional em alto valor proteico, como produtos cárneos. Os avanços na ciência do bem-estar animal fomentaram o pensamento crítico sobre a importância de prevenir e tratar o estresse, a dor e as lesões. Além disso, os consumidores estão mais disciplinados quanto às boas práticas de gestão, agregando valor aos produtos e apoiando a sustentabilidade. Existem alguns aspectos bem consolidados, ditados como “cinco liberdades” de acordo com o Comitê de Bem-Estar de Animais de Produção e aceitas internacionalmente.

São eles

1- Liberdade física;

2- Liberdade de higiene;

3- Liberdade de conduta;

4- Liberdade mental;

5- Liberdade ambiental. O estresse fisiológico é um dos indicadores mais importantes na avaliação.

O bem-estar animal é a harmonia entre o animal e seu ambiente, caracterizada por ótimas condições físicas e fisiológicas e uma alta qualidade de vida para o animal. Portanto, o tratamento realizado deve atender as necessidades adaptativas de cada animal para que ele atinja um nível adequado de bem-estar. Outro fator a ser considerado é o estresse, que se tornou um dos indicadores de bem-estar e, ao aumentar, a sensação de bem-estar se deteriora consideravelmente.

Em um sistema de criação intensivo, é muito comum ter menos espaço para um animal, o que pode comprometer seu bem-estar e, consequentemente, sua produtividade. Portanto, é importante que as instalações respeitem o “status” individual de cada animal. Por isso, devem ser asseguradas condições adequadas de sombra, comedouros, bebedouros, dieta balanceada e manejo livre de estresse.

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O transporte de animais é um fator econômico de extrema importância, pois pode causar estresse físico, mental e fisiológico aos animais de produção, além de efeitos depressores sobre a saúde, o bem-estar, o desenvolvimento dos animais e sobre a qualidade do produto finalizado. O aumento do estresse durante o transporte é consequência das condições desfavoráveis como a privação de comida e ingestão hídrica, a alta umidade e velocidade do ar e a densidade de carga. O transporte por meio rodoviário em condições precárias pode culminar em contusões, perda do couro, perda de peso, estresse e em casos mais graves, até a morte. A densidade elevada irá impedir os ovinos e caprinos de deitar para descansar e isso pode causar exaustão e lesão muscular, principalmente durante as viagens longas. Existem indústrias que sugerem que os animais devam ser transportados em densidades mais elevadas para ajudá-los a se equilibrar. Entretanto, evidências já comprovadas experimentalmente dizem que os animais requerem espaço para se posicionarem bem e propiciar seu equilíbrio. Ovelhas não tentam se sustentar em suas companheiras, mas tentam propiciar seu equilíbrio de forma independente, e quando existe falta de espaço isso se torna mais difícil. A concentração de cortisol sérico de cordeiros, antes e depois do transporte, tem crescimento de 44% em sua concentração.

Em viagens que tenham duração superior a 12 horas, os animais devem receber água e alimento durante o transporte. Em viagens mais longas, há uma perda progressiva de peso e de carcaça. A perda de peso vivo gira em torno de 5,5 a 6%, depois de 15 horas de duração, e de 7 a 8%, depois de 24 horas de viagem, sendo que a maior parte das perdas acontecem nas primeiras 15 horas. Depois de 24 horas de transporte, é preciso 24 horas de repouso para que a concentração de cortisol no sangue chegue a valores perto dos níveis normais.

É conhecido que o estresse que ocorre durante o manejo pré-abate dos animais, principalmente durante a viagem e o tempo de espera, culmina em consequências no bem-estar animal e apresenta alterações na qualidade da carne. Imediatamente após o desembarque no matadouro, é importante que os animais tenham acesso a um local onde possam ficar o tempo suficiente para se acalmarem e descansarem da viagem antes de passarem para as próximas etapas do abate. É ideal que os currais sejam construídos no mesmo nível que o piso dos veículos para eliminar as rampas durante a entrada e saída dos animais, mas quando isso não for viável, o ângulo formado pela rampa de acesso ao caminhão em relação ao solo não deve ser maior que 20°, sendo almejável um ângulo de 15°. Além disso, há a necessidade de treinar os grupos envolvidos no manejo de animais. As etapas de carga, transporte, descarga, repouso, atordoamento e sangria dos animais são essenciais para o abate e qualquer sofrimento desnecessário deve ser evitado.

Hoje em dia existem selos de certificação animal que, quando impressos na embalagem dos produtos, certificam que o animal foi criado e abatido em condições de bem-estar animal adequadas. Para os produtores, o selo de certificação é uma importante forma de posicionar a empresa no mercado de proteção animal, dando credibilidade para atrair mais consumidores. Quem seguir as regras pode receber o selo “Certified Humane”, que garante que os animais sejam criados de acordo com diretrizes escritas por um comitê científico de renome.

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Algumas das regras de criação na ovinocaprinocultura para a obtenção da certificação são

Todos os animais devem ter acesso à alimentação nutritiva e ingestão hídrica suficientes para manter boa saúde, conforme a idade ou estágio reprodutivo;

Não é permitido oferecer aos animais alimentos que contenham proteína advinda de mamíferos ou aves, exceto leite e seus derivados.

De acordo com as normas

Não é permitido o uso de antibióticos ou outras substâncias para propiciar o crescimento ou melhorar o desempenho;

Os cordeiros não devem ser retirados do aleitamento antes das cinco semanas de vida. Já os cabritos não devem ser retirados do aleitamento antes das seis semanas de idade;

Ovinos e caprinos, desde as duas semanas de vida, devem ter acesso a uma fonte de fibra, que pode ser feno e capim;

A ingestão hídrica deve ser livre, incluindo os que estão sendo criados a pasto;

Deve-se observar se há algo que possa causar ferimentos ou contusões aos animais no ambiente;

As construções internas dos currais e alojamentos devem ser construídas de materiais de fácil limpeza e desinfecção;

O ambiente do animal deve ser climatizado com temperatura agradável, respeitando o clima de conforto da espécie e raça, com ventilação, evitando o excesso de umidade e reduzindo o risco de doenças que afetam o trato respiratório. Em caso de calor ou frio excessivo, é importante ter um plano “B”;

Ovinos e caprinos precisam de um abrigo que pode ser natural ou não, quando habitam livres no pasto, para abrigo da chuva, vento e calor quando em condições extremas;

Ovelhas não deverão ser tosquiadas no período de inverno, a menos que sejam adotados métodos que garantam a sua proteção contra o frio;

Deve ser dado cuidado especial aos recém-nascidos, que são mais suscetíveis a hipotermia;

Nos alojamentos é imprescindível que os níveis de poeira inaláveis não ultrapassem 10mg/m3 da altura dos animais. Também é ideal que o nível de amônia não exceda 25 ppm.

Em suma, observamos que o estresse gera diversos problemas e possui influência na qualidade dos produtos produzidos por esses animais. Oferecer um manejo excelente e de forma correta é uma maneira de minimizar esse mal-estar e, consequentemente, valorizar a qualidade dos produtos gerados. Obter animais saudáveis produzindo em sua plenitude sem componente estressante do ambiente e de práticas de manejos inadequadas permite oferecer ao consumidor produtos de melhor qualidade.

Referências

Bittar, Thais Gabriela Taveira. “Panorama da pesquisa científica em bem-estar de caprinos e ovinos no brasil.” (2021).

Ruffino, Luís Alberto Linhares. “Indicadores de bem estar em ovinos e caprinos.” (2015).

Conheça os principais pontos das normas de bem-estar animal para cabras e ovelhas. Certified Humane Brasil bem-estar animal: https://certifiedhumanebrasil.org/conheca-os-principais-pontos-das-normas-de-bem-estar-animal-para-cabras-e-ovelhas/

Autores:

Raquel Rangel Teles Nunes – Discente do Grupo de Estudos Liga de Bovinos – LiBovis Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, UFRRJ)
Mylena Santana Coelho – Discente do Grupo de Estudos Liga de Bovinos – LiBovis Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, UFRRJ)
Ana Paula Lopes Marques – Orientadora do Grupo de Estudos Liga de Bovinos – LiBovis Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, UFRRJ)
Clayton Bernardinelli Gitti – Orientador do Grupo de Estudos Liga de Bovinos – LiBovis Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, UFRRJ)
Foto de capa: Pexels