*Edino Camoleze

GÊNESE. Chester é uma marca registrada da empresa frigorífico Perdigão S/A, que nasceu no ano de 1934, na cidade de Videira, Santa Catarina, hoje pertencente a BRF – Brazil Foods, uma das maiores empresas transnacionais de alimentos do mundo, resultante da fusão das empresas Perdigão S/A e Sadia ( 2012 ).

Etimologicamente a denominação CHESTER foi criada e escolhida pelo Departamento de marketing do frigorífico para designar uma nova ave, de sua propriedade, obtida em Santa Catarina; um derivativo da palavra inglesa Chest que traduzida para o idioma português refere-se a peito. Como a ave possuía um peito avantajado na sua conformação física estrutural, acrescentou-se à palavra inicial o sufixo (er) superlativo que quer dizer grande, como na palavra ( killer ) ficando definitivamente CHESTER, peito grande.

POR QUE CHESTER ? A ave surgiu de um projeto ambicioso da PERDIGÃO que planejou com seu técnico, Diretor Agropecuário, ( 1979 ) criar uma variedade de frango de grande porte que pudesse competir com o peru (Meleagris gallopavo) nas festas natalinas de fim de ano. O protótipo de galináceo imaginado tinha que ter características físicas semelhantes ao peru: grande, com massa muscular concentrada no peito, coxas e sobrecoxas, partes nobres das aves de corte, textura macia, magra e saborosa etc., viavelmente comercial e que pudesse agradar ao paladar e sabor dos consumidores mais exigentes. ( NOVELO EPISÓDIO,109 )

EXECUÇÃO DO PROJETO ZOOTÉCNICO. Coube, por decisão da empresa, enviar aos EEUU, em 1979, uma missão técnica com objetivo de adquirir conhecimentos e recursos genéticos para “construção” do animal planejado. Foram comissionados para essa missão espinhosa os veterinários Edésio Brandalise, geneticista e nutricionista animal, chefe da missão e Mário Ricciardi, técnicos e funcionários da empresa. A viagem aos EUA tinha um destino certo, o estado de Maryland/Baltimore que possuía, na época, os mais avançados conhecimentos sobre avicultura e material genético puro de variadas raças de galinhas para corte e postura. Em Baltimore, foram recebidos pelo renomado cientista geneticista Dr. Ira Carter (Dr. Carter) responsável pelo desenvolvimento de programas de melhoramento animal (aves) do Estado de Maryland e dos Estados Unidos.

* Dr. Edino Camoleze Cel med vet mil. Membro Titular da Academia Brasileira de Medicina Veterinária. Planejamento e Tecnologia de Alimentos. Zoogeografia da América do Sul. Contatos: edino0C44@gmail.com

 

Depois de uma longa estada em Maryland conversando com o Dr. Ira Carter e visitando instalações, laboratórios, granjas e aviários, o Dr. Edésio, chefe da comitiva, comprou um pacote genético fechado trazendo para o Brasil 3 000 a 5. 500 ovos férteis de nove linhagens puras de aves de corte, avós, para se transformar em matrizes, dentre elas White Plymouth Rock e Rhose Island Red, que incubados na incubadora Santa Gema, da Perdigão SC, iniciaram os difíceis trabalhos de cruzamentos genéticos e seleção da futura ave.

Ressalva-se nesse contexto de pesquisa genética evolutiva para obtenção de uma linhagem especial de aves, o Diretor Técnico Agropecuário da Perdigão, Dr. Edésio e sua equipe de veterinários e nutricionistas, não possuíam o computador para facilitar e mediar os cálculos dos trabalhos de seleção. Em 1979, a informática no Brasil estava se firmando através da Política Nacional de Informática – PNI para promover a indústria de computadores e software no país, sendo o primeiro computador totalmente produzido no Brasil, o COBRA, mod. 530, lançado oficialmente em 1980.

Assim, durante três anos, (1979 – 1982) todos os registros de observação e cálculos de dados zootécnicos obtidos, na formação da nova espécie, foram feitos em pranchetas e anotações por lápis ou canetas. Outro fato importantíssimo é que esse trabalho de pesquisa aconteceu e se desenvolveu sobre “ segredo industrial “, ( da sua concepção até sua conclusão )“ não permitindo vazamento de notícias ou fotos do objeto pesquisado. ( NOVELO EPISÓDIO,109 ) .

PERFIL ZOOTÉCNICO DO CHESTER. A ave denominada CHESTER, obtida do resultado do cruzamento e seleção genética ( linhagem ) de nove outras raças puras, tem as seguintes expressões fenotípicas e zootécnicas: ( Fig 01)

  • Robusto, oblongo, volumoso, pesado, com maior amplitude no tórax;
  • Branca ou branca amarelada em toda a cobertura do corpo;
  • Cabeça. Pequena em relação ao corpo, bico curto, cristas e barbelas vermelhas;
  • Normais, brilhosos, ocupando toda à cavidade orbicular;
  • Pescoço. Curto e grosso e bem encaixado na cabeça e tórax;
  • Maior massa muscular do corpo, alongado, comprido, largo e amplo da frente para trás; representa com as coxas 70% do peso do animal;
  • Curtas, grossas e largas com ossatura forte e pesada;
  • Forma cilíndrica, grossa, volumosa e com grande massa muscular;
  • Curtas, grossas, escamas amareladas, com boa sustentação corpórea.

CONCLUSÃO DO PROJETO.

Em 1982, após intensos trabalhos de observações, cruzamentos e seleção genética estava pronto a ave encomendada pela Perdigão que iria concorrer com o peru nas festas natalinas. Na verdade, técnico e cientificamente a equipe do Dr. Edésio Brandalise, formada por mais três veterinários auxiliares: Vitor Hugo Brandalise (nutricionista), Mário Ricciardi e Mário Machado, todos especializados em genética, o que fizeram, nos exaustivos três anos de trabalhos, foi um cruzamento industrial de integração e absorção genética. O cruzamento industrial explora, justamente, o fenômeno conhecido como heterose, que é o choque resultante da reunião de indivíduos de genomas hereditários diferentes, potencializando positivamente características desejáveis, resultando animais com maior vigor, produtividade, eficiência alimentar e resistência a doenças. (EMPBRAPA)

O CHESTER, super frango imaginado e concretizado, tinha uma carcaça semelhante ao peru, com 70% da massa muscular concentrada no peito e coxas, pouca gordura, carne macia, sabor e paladar inigualáveis, pele de cor amarela e boa conversão alimentar e resistência a doenças.

Surgia, assim, uma nova ave natalina, (iguaria saborosa) arquitetada e criada por veterinários com finalidade alimentar e compor a mesa dos brasileiros nas festas natalinas e do fim de ano. “ Habemus Chester “

PRODUÇÃO E CRIAÇÃO DO CHESTER.

A linha de produção do CHESTER passa por uma rigorosa inspeção zootécnica e sanitária, assim delineada pela Vigilância Sanitária e padrão da empresa.

  • Devem passar pela ovoscopia para verificar a qualidade da gema; ter o peso e tamanho padrão estabelecido; ser fresco (até 7 dias da postura); casca íntegra e sem manchas; higienizados para evitar introdução de impurezas no incubatório, ovos grandes, pequenos e deformados devem ser rejeitados.
  • Pinto de um A seleção se faz imediatamente após a eclosão dos ovos. Na triagem os pintinhos devem ter o umbigo bem cicatrizado, aparência uniforme, olhos brilhantes, peso e tamanho dentro do padrão zootécnico determinado, bicos, pernas e pés sem defeitos e bem conformados. Nessa oportunidade, as aves são sexadas e vacinadas. As aves que nascem com alguma doença ou defeito são rejeitadas. No caso do CHESTER, só os machos interessam e seguem para a produção de carne. A criação se faz intensamente no município de Mineiros/GO e deve seguir às mesmas etapas que o frango comum, isto é: pré-produção, produção e pós-produção. ( fig 02 )

Fig 02 – Galpão de criação do Chester- Mineiros -GO. Foto: BRF

  • Pré-produção. Começa com a preparação dos Galpões para receber os pintinhos. Deve ser observado: qualidade da cama, campânulas para aquecimento, ventilação, umidade, bebedouros e cortinas para aumentar ou diminuir a iluminação ambiental. A ração deve ser de crescimento e ao alcance de todo o lote. No caso do CHESTER, deve receber uma ração especial de crescimento produzida pela empresa.
  • Produção. Etapa em que as aves em crescimento permanece maior tempo no Galpão. Fundamental é o controle da água e alimentação das aves. Também a temperatura, umidade e alimentação. A vigilância sanitária deve ser permanente e constante para detectar a presença de doenças ou patógenos. A ração pode ser mudada para engorda ou acabamento dependendo da necessidade e desenvolvimento do plantel !
  • Pós-produção. Etapa em que termina a fase de criação e preparo das aves para o abate e comercialização. Nessa fase, normalmente faz-se o controle de qualidade da criação com amostragens de algumas aves, escolhidas ao acaso, para avaliação das características zootécnicas e o lote.

No caso do Chester, o período de criação é de 50 dias, 20 dias a mais que o frango tradicional, sendo o peso individual de cada ave obtido, variável de 3 kg a 5 kg, com média de 4 kg. (EMBRAPA) ( Fig 03 )

Fig 03 – Chester limpo, pronto para ser embalado e vendido. Foto: Monta Encanta.

MARKETING E COMERCIALIZAÇÃO DO CHESTER.

Fig 04 – CHESTER embalado para comercialização. Foto: empresa PERDIGÃO

Produzido durante três anos num complexo de Granjas ( Videira, Capinzal e Tangará ) de propriedade da Perdigão, Santa Catarina, o CHESTER, ave desconhecida dos avicultores, comerciantes, empresários e da população em geral, era um projeto avícola industrial, mantido sob a forma de segredo, durante todo o tempo de sua realização. Esse ocultismo, de mais de 40 anos, suscitou da imprensa mitos, lendas e fantasias sobre o bicho que estava sendo criado. ( CNN, Brasil)

A respeito da ave diziam: É uma ave transgênica, cheia de hormônios e anabolizantes. Outros afirmavam ser um bicho sem cabeça que comia tanto que não podia caminhar ou se locomover ( LUCIANA BULAU ).

Para desmistificar toda essa história fantasiosa sobre o consumo da carne do CHESTER, o Departamento de Marketing da Perdigão desencadeou em 1982/1983 uma grande campanha de propaganda de promoção de lançamento do produto, nos jornais, rádio e televisão, para que o povo conhecesse realmente a nova ave, entre elas, a famosa frase: Habemus CHESTER ! Plagiado do Habemus Papa ! ( Fig 04)

Foto de capa:  Chester, divulgação BRF