Luiz Octavio Pires Leal, médico veterinário, jornalista e organizador do seminário, e Alfredo Navarro, engenheiro agrônomo. Foto: SNA

A Sociedade Nacional de Agricultura (SNA) realizou, no dia 18 de fevereiro, o seminário “Produção de Proteínas de Origem Animal no RJ – Presente e Futuro”.

Os palestrantes do evento apresentaram sugestões e propostas para o desenvolvimento da avicultura, suinocultura, piscicultura e bovinocultura de leite e de carne no Estado do Rio de Janeiro. Participaram do encontro veterinários, zootecnistas e empreendedores.

“Precisamos saber por que o Rio de Janeiro, que conta com uma área territorial maior que a de outros países e com melhores condições geográficas, além de ter um grande mercado consumidor, é um pobre produtor de proteínas de origem animal. Queremos sugestões para corrigir essa deficiência”, destacou o organizador do seminário, Luiz Octavio Pires Leal, editor da revista Animal Business Brasil e um dos responsáveis pela modernização da avicultura no País.

“A velha afirmação de que o Estado Rio não tem capacidade de comportar uma produção relevante de produtos de origem animal é falsa. O que falta é decisão política. Os empresários precisam se libertar do paternalismo, achando que cabe ao governo fazer tudo. Isso é coisa do passado. Quem tem de assumir esse papel é a iniciativa privada”, disse Leal.

“Até 1970, o Estado do Rio era um dos maiores produtores de carne de frango e ovos do Brasil, contribuindo significativamente com a economia e balança comercial fluminense e brasileira. Atualmente, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Rio não está classificado entre os dez maiores produtores brasileiros”, informou o professor e engenheiro agrônomo Alfredo Navarro, que durante o evento representou o historiador e coronel veterinário de reserva, Edino Camoleze.

Ações

Na ocasião, o palestrante traçou um painel da produção de proteína animal desde o descobrimento do Brasil até os dias atuais e propôs algumas ações para alavancar o setor no Estado do Rio, entre elas, o processamento de produtos mais sofisticados, favorecendo a agregação de valor; a promoção de produtos com selos de qualidade, como os orgânicos, por exemplo, e a definição de nichos de mercado que valorizem produtos customizados (artesanais).

Navarro defendeu ainda a criação de produtos com Denominação de Origem Controlada (DOC); a organização de pools de compra para obter vantagem de escala; a promoção do turismo rural focado na produção sustentável e ambientalmente correta de aves e ovos, e a integração com os produtores de olerícolas, visando à produção de fertilizantes de qualidade. “Já existem tecnologias que podem aumentar o valor nutricional do esterco”, ilustrou o especialista.

Rômulo Spinelli, presidente Conselho Regional de Medicina Veterinária do Rio de Janeiro. Foto: SNA

Oportunidades

Rômulo Spinelli, presidente Conselho Regional de Medicina Veterinária do Rio de Janeiro (CRMV-RJ), abordou as oportunidades que o estado pode ter para aumentar sua produção no setor de proteína animal. Segundo ele, o apoio tecnológico de universidades e de instituições como a Pesagro, Emater, Instituto Vital Brasil, núcleos da Embrapa, entre outras, são importantes para alavancar o desenvolvimento da atividade.

“Temos genética exportada para o mundo, obtida com muita competência e determinação. Não temos quantidade, mas temos qualidade”, ressaltou Spinelli, que também falou sobre a importância dos cursos de capacitação, como o de inspeção de produtos de origem animal. “Há muitos profissionais despreparados para a atividade”, ressaltou o palestrante.

No âmbito legislativo, o presidente do CRMV defendeu a modernização da Lei 5.517, de 1968, que dispõe sobre o exercício da profissão de médico veterinário e cria os Conselhos Federal e Regionais de Medicina Veterinária.

Francisco Almeida, presidente do Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV), falou sobre o trabalho realizado pela entidade junto ao Congresso Nacional com assessores parlamentares, e destacou o relacionamento do Conselho com o Poder Executivo e com o Ministério Público Federal para o desenvolvimento de políticas públicas.

“Nosso papel é fazer política de classe e fiscalizar o exercício profissional. Estamos lutando para que a atividade seja fiscalizada somente por médicos veterinários ou zootecnistas, e não por fiscais de nível médio, que não estão preparados para essa finalidade”, declarou o executivo.

Na ocasião, ele anunciou a aprovação, pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), das novas diretrizes curriculares par os cursos de Medicina Veterinária, que deverão entrar em vigor no próximo ano.

Francisco Cavalcanti de Almeida, presidente do Conselho Federal de Medicina Veterinária. Foto: SNA

Desafios tecnológicos

Em mensagem enviada ao seminário, o presidente honorário da Academia Brasileira de Medicina Veterinária (Abramvet), Milton Thiago de Mello, afirmou que a agricultura no Estado do Rio precisa estar antenada aos desafios tecnológicos do presente, que surgem com os avanços da ciência, “principalmente nos campos de genética e do meio ambiente”, disse ele, citando como exemplos os tratamentos que utilizam células-tronco, as carnes artificiais produzidas a partir de células adultas e ainda o surgimento de novos padrões como o de Governança Ambiental, Social e Corporativa (ESG, na sigla em inglês).

Pecuária leiteira

Ao falar sobre pecuária leiteira, o diretor técnico da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA), Alberto Figueiredo, informou que o Brasil produz atualmente 35.4 bilhões de litros de leite por ano, em um cenário de baixa produtividade média por área ocupada, com pastagens degradadas, concentração em propriedades com maior volume de produção e distanciamento entre produtores, indústrias e comércio varejista.

Além disso, pontuou Figueiredo, o setor enfrenta um custo de produção elevado, com 36 para 55 litros de leite por saco de ração; baixa competitividade no mercado internacional, com a possível influência dos subsídios, e um consumo per capita inferior ao indicado, devido ao reduzido poder aquisitivo da população.

No caso do Rio de Janeiro, o diretor da SNA disse que, apesar do solo e clima adequados para produção, do grande mercado consumidor, da renúncia fiscal de quase 15% sobre o preço pago ao consumidor e da tradição da atividade em todos os municípios, a pecuária leiteira produz menos de 20% do que é consumido e sofre com dificuldades de comercialização.

Alberto Figueiredo, diretor técnico da Sociedade Nacional de Agricultura. Foto: SNA

Questionamentos e sugestões

“Será que essa renúncia fiscal de quase R$ 150 milhões por ano está chegando no bolso do produtor? Será que o poder público estadual está utilizando adequadamente a política tributária à favor da produção interna? Estamos nos aproveitando da proximidade entre a produção e o mercado consumidor para ofertar produtos mais nobres? Será possível a adoção de uma inteligência comercial entre as cooperativas na busca de racionalização de custos?”, questionou Figueiredo.

Como possíveis propostas para melhorar a atividade no estado, o diretor da SNA sugeriu o incremento ao programa de aumento da produtividade por área nas fazendas, com pastagens melhoradas e alimentos suplementares para o rebanho; investimentos em pesquisas sobre produtos alternativos para a alimentação do gado; maior fiscalização na utilização dos recursos do programa de incentivo do governo estadual; incentivo a contratos de médio e longo prazos entre produtores, indústrias e varejistas, com a valorização de produtos personalizados (“da fazenda para a mesa”); investimento em campanhas para aumentar o consumo de leite, e busca de oportunidades para a exportação de produtos lácteos.

Carne bovina

O médico veterinário Carlos Alberto Magioli traçou um quadro sobre a produção de carne bovina no Rio de Janeiro. “Atualmente, o rebanho de corte no estado totaliza 1.635.134 cabeças. Em 2020 foram abatidos 127.020 bovinos, com produção estimada de 33.599,30 toneladas para um consumo de 651.382,91, ou seja, a produção corresponde a 5,16% do consumo.”

Carlos Alberto Magioli, médico veterinário. Foto: SNA

Citando dados do relatório dos seminários Estratégias de Enfrentamento ao Abate Clandestino, Lixões e Criação Irregular, realizado pelo Ministério da Agricultura e outras entidades e associações do Rio de Janeiro, Magioli disse que 60% dos abatedouros, localizados em municípios como Quissamã, Sapucaia, Campos dos Goytacazes, Itaperuna, entre outros, funcionam com 60% de ociosidade.

Nestes estabelecimentos, acrescentou o especialista, é preciso “observar o processamento tecnológico do abate, as boas práticas de higiene, a inspeção sanitária adequada, o aproveitamento dos resíduos comestíveis e não comestíveis, os materiais específicos de risco, a frigorificação, o transporte e a distribuição.”

Além disso, destacou Magioli, “os estabelecimentos devem dispor de programas de autocontrole desenvolvidos, implantados, mantidos, monitorados e verificados por eles mesmos, com registros sistematizados e auditáveis que comprovem o atendimento aos requisitos higienicossanitários e tecnológicos para assegurar a inocuidade, a identidade, a qualidade e a integridade dos seus produtos, desde a obtenção e a recepção da matéria-prima, dos ingredientes e dos insumos, até a sua expedição.”

Na ocasião, o palestrante abordou a lei Lei 7889/89, que dispõe sobre inspeção sanitária e industrial dos produtos de origem animal, e falou sobre a importância do Sistema Brasileiro de Inspeção de Produtos de Origem Animal, dos consórcios de municípios que favorecem a ampliação do mercado nacional de produtos das agroindústrias, da regionalização do abate e dos produtos alimentícios de origem animal produzidos artesanalmente.

Produção orgânica

Já a produção orgânica no setor de proteína animal ainda é bastante pequena no estado, observou a diretora da SNA, Sylvia Wachsner. “Quanto ao leite e laticínios orgânicos, há um volume de produção um pouco maior, mas ainda sem destaque. Precisamos de sistemas mais sustentáveis, de insumos mais naturais e biológicos. Por outro lado, há um mercado disposto a consumir esses produtos”, disse.

“Mais importante do que conseguir uma produção orgânica, é preciso ter, sobretudo, um produto diferenciado, mais sustentável, com menos herbicidas. Pensar no bem-estar dos animais também é fundamental.”

Sylvia Wachsner, diretora da Sociedade Nacional de Agricultura. Foto: SNA

Suinocultura

Josélio de Andrade Moura, presidente da Abramvet, abordou o cenário atual da suinocultura, disse que a erradicação da peste suína africana no Brasil foi um marco para o setor e destacou que o consumo mundial de carne suína em 2050 será de 94 milhões de toneladas, contra 88 milhões de toneladas no ano 2000. No entanto, observou o executivo, “a capacidade de produção não está acompanhando a demanda.”

Moura também falou sobre os avanços tecnológicos na suinocultura, entre eles, a criação de granjas verticais para suínos na China. “Quem não estiver na mais alta tecnologia de competitividade, com respeito ao meio ambiente e às leis sociais, está fora do mercado”, disse.

No caso do Rio de Janeiro, acrescentou o palestrante, “temos de nos basear nesses exemplos não só para produzir com alta qualidade e produtividade, mas também com baixos custos.” No entanto, segundo Moura, há fatores limitantes como os parasitos, que devem ser considerados.

Sobre a produção brasileira, Moura disse que em 2010 o volume de carne suína era de 3.2 milhões de toneladas, e em 2020 esse número cresceu para 4.4 milhões de toneladas, segundo dados da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).

Josélio de Andrade Moura, presidente da Abramvet. Foto: SNA

Pesca e aquicultura

O extensionista André Medeiros, da Fundação Instituto de Pesca do Estado do Rio de Janeiro (Fiperj), falou sobre o atual cenário brasileiro e fluminense da aquicultura.

A partir de informações do anuário da PeixeBr, ele mostrou que a produção de peixes de cultivo no País avançou 5,9% em 2021, atingindo mais de 800.000 toneladas, com destaque para a produção de tilápia e tambaqui.

Medeiros mencionou ainda um relatório de 2018 da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), estimando que o Brasil deverá registrar um crescimento de 89% na produção da pesca e aquicultura até 2030.

Ao traçar um painel do Estado do Rio, o palestrante falou sobre a predominância da pesca industrial, destacando as as sardinhas como as espécies mais capturadas, e na aquicultura citou novamente a tilápia como o carro-chefe do setor.

André Medeiros (Fiperj). Foto: SNA

Outros números da PeixeBr, divulgados por Medeiros, indicam que a produção da piscicultura no Rio, que em 2019 registrou 4.700 toneladas, em razão da pandemia fechou 2020 com 3.340 toneladas. Quanto aos principais destinos do pescado, tanto na pesca industrial como artesanal, os atravessadores detêm a maior parcela.

“Geralmente os pequenos pescadores não conseguem inserir seu produto na indústria, então os atravessadores aparecem e pagam um preço mais baixo para esses pescadores, que revendem esse peixe com valor agregado, mas com qualidade baixa”, explicou o especialista.

Já a cadeia da aquicultura, tanto de corte quanto ornamental, que também ganha força no estado, é mais organizada, e com melhor controle sanitário, disse o especialista. Porém, segundo ele, “falta gestão no setor”.

Entraves

Por fim, Medeiros chamou a atenção para alguns desafios que englobam as atividades de pesca e o cultivo de peixes. Entre eles, a necessidade de maior conhecimento sobre a aquicultura nativa e de facilitar o licenciamento ambiental  como forma de combater o trabalho ilegal e favorecer a concessão de crédito para o produtor; investir em pesquisa e tecnologia e na elaboração de dados oficiais; melhorar a infraestrutura das embarcações (quando muitas delas estão em desacordo com a legislação higienicossanitária); melhorar o escoamento da produção nos terminais pesqueiros; promover o beneficiamento adequado do pescado e incentivar políticas públicas e programas governamentais para a abertura de mercados.

 

Juliana Virgínio, médica veterinária. Foto: SNA

Destaque fluminense

A médica veterinária Juliana da Silva Virgínio, ex-secretária de Agricultura de São José do Vale do Rio Preto, destacou o potencial agrícola do município fluminense. Segundo dados recentes da Emater-Rio, São José é o maior produtor hortifrutigranjeiro e o maior produtor avícola do estado, sendo reconhecido por sua larga produção de frangos, ovos, chuchu, caqui e café.

Ricardo Ferreira, gerente técnico da Emater-Rio. Foto: SNA

Linhas de crédito

Ricardo Belo Ferreira, gerente técnico da Emater-Rio, forneceu dados sobre as linhas de crédito que os pequenos, médios e grandes produtores rural dispõem para financiar suas atividades, destacando ainda o Programa Especial de Fomento Agropecuário e Tecnológico (Agrofundo).

O seminário “Produção de Proteínas de Origem Animal no RJ – Presente e Futuro” contou com o apoio do CRMV/RJ e da Abramvet.

Equipe SNA