Por Edino Camoleze*
1. Origem
Muito utilizada na fabricação de ração, para uso animal, a monensina é um inóforo – composto químico que facilita o transporte de íons de sódio, potássio, cálcio e cloretos através das membranas celulares – produzida pela fermentação da bactéria Streptomyces cinnamonensis empregada como antibiótico para aves e bovinos e aditivo alimentar na promoção do crescimento, ganho de peso e absorção alimentar. (PIZZARO & FERREIRA, 2014)
Quimicamente classificada como um ionóforo carboxílico constituído de 36 átomos de carbono, 20 átomos de hidrogênio, 04 átomos de oxigênio e 2 átomos de sódio, além de um grupo de hidroxila e um grupo metila (RAMOS,B), sintetizada pela primeira vez por Agtarap, A. Chamberlin, em 1967, vem sendo utilizada desde 1970 nos EEUU, nos rebanhos bovinos de produção de carne e leite com objetivo de melhorar o desempenho zootécnico, ganho de peso, conversão alimentar, redução de custos e resistência animal. ( Fig 01 )

Fig 01. Monensina sódica utilizada como aditivo na ração animal
Altamente recomendada como aditivo nutricional na ração de bovinos, ovinos, aves etc., a monensina não é indicada para os equinos por ser demasiadamente tóxica e apresentar alto grau de letalidade.
Tabela 1. Toxidade (Dose Letal 50% – DL 50 mg/kg de peso vivo) dos principais ionóforos utilizados em diferentes espécies.

Fonte: Adaptado de Borges et al. (2001)
2. Aditivo nutricional animal
Conforme define o MAPA: São “substâncias, micro-organismos ou produtos formulados, adicionados intencionalmente à ração animal, que não são utilizados normalmente como ingredientes, tenha ou não valor nutritivo e que melhore as características dos produtos destinados à alimentação animal, o desempenho dos animais sadios ou atenda às necessidades nutricionais – IN 13/04 (alterada pela IN 44/15)”, MAPA (2021) .No Brasil, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento ( MAPA ) estabelece as Normas para a fabricação, importação, exportação, comercialização e uso dos aditivos alimentares para a alimentação animal. Também, a Instrução Normativa – IN 13 2004, alterada pela IN nº 44 215, regula a avaliação, registro, comercialização e uso desses aditivos, visando proteger a saúde humana, animal e o meio ambiente.
3. Intoxicação experimental em equinos
Conforme consta da Revista “Pesquisa Veterinária Brasileira“ 20 (3):102 – 108. Depto de Patologia da Universidade de Santa Maria-RS, pesquisa realizada pelo professor Pedro Soares Bezerra Jr & Col, em “ Experimental monensin poisoning in horses “, monensina sódica empregada na ração animal, em quantidade variada (mg) em sete cavalos, verificou-se: dois cavalos receberam 3-4 kg de ração/dia de uma ração comercial suspeita de intoxicação contendo 180 ppm +- 20 da droga; um outro recebeu 5mg/kg/dia e um outro recebeu 4 doses diárias de 1mg/kg/dia. Esses quatro equinos morreram ou foram sacrificados “ in extremis “, 3-8 dias após o início da administração da droga. Um quinto equino recebeu dose única de 5mg/kg de monensina, ficou levemente doente e se recuperou. Dois outros equinos receberam 0.5mg/kg em dose única ou fracionada em 3-4 kg da ração não desenvolveram a intoxicação.
Dos sete equinos do experimento, dois tiveram morte espontânea, dois foram sacrificados quando moribundos, um adoeceu levemente e se recuperou e dois não apresentaram sinais clínicos. O início dos sinais clínicos variou de 2 a 5 dias e a duração do quadro clínico, de 24 a 76 horas.
4. Sintomatologia aguda e crônica
4.1 Sintomas agudos

Fig 02 – Cavalo intoxicado por monensina – incoordenação motora
Os sintomas em animais, equinos, estabulados aparecem entre 24/72h após a ingestão da ração, assim observados: adinamia, apatia, anorexia, polidipsia, ataxia, desordem motora, diarreia, dispneia, salivação, sudorese etc. (POTTER et al. 1984). ( Fig 02 )
4.2 Sintomas crônicos
Taquicardia, arritmia, gemidos, incoordenação motora, sudorese, congestão conjuntival, demência, decúbito esternal, decúbito lateral, hipotermia, deitar e levantar repetidos e com dificuldade, até se tornarem incapazes de levantar, ranger de dentes, tremores musculares, nistagmo, pedaleios e morte. ( BEZERRA & al, 2000 )
4.3 Achados de necropsia
Músculos esqueléticos dos membros anteriores e posteriores: quadríceps femoral, adutor, pectíneo, grácil, semimembranoso, supra espinhoso, supraespinhal, subescapular, braquicefálico etc., apresentavam edema gelatinoso e translúcido entre as fáscias musculares. Áreas ou estrias branco amareladas focalmente extensas ou difusas, bilaterais e simétricas. ( NUYTTEN et al. 1981).
Exames histopatológicos em tecidos de vários órgãos: fígado, coração, pulmão, rim e cérebro, etc., de animais necropsiados pela mesma causa, intoxicação por monensina, mostram alterações patológicas compatíveis com os sinais clínicos “in vivo“ apresentados.
Estudos complementares feitos com 70 cavalos submetidos à exposição acidental com monensina na ração, em mar de 2020, na Inglaterra, para verificar sequelas, na forma aguda, subaguda e crônica, verificou-se que: anormalidades cardíacas foram detectadas em 31 de 70 cavalos durante o período crônico ( 4 a 10 meses após exposição ); após ( 16 meses ) 34 dos 64 cavalos (53%) retornaram a sua condição de saúde inicial, 13 (20%) foram relatados como intolerantes ao exercício e 14 (22%) vieram a óbito. ( EQUINE VETERINARY JOURNAL – BEVA, 2020 )
5. Ração da fábrica Nutratta “Forrage Horse” sob suspeita

Fig 03. Cavalo Kiko da Associação Amigos Cavaleiros de Resende – Intoxicado por Monensina/Monocrotalina – Foto Tadeu R. Matos
Alertado pelo Serviço de Defesa Sanitária Animal e pela mídia, televisiva e radiofônica de vários estados, principalmente, Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás e Alagoas, sobre a ocorrência de mortes inopinadas de cavalos em Haras, Clubes, Associações e Sociedades Hípicas, que mantém animais estabulados, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA, em investigação sanitária e epidemiológica, em Nota Oficial, determinou o recolhimento de todos os produtos destinados a equídeos fabricados pela empresa Nutratta Nutrição Animal, com data de fabricação a partir de 21 de novembro de 2024.
O ofício do Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal proibia, de modo cautelar, o consumo da ração para equinos fabricadas a partir de 8 de março de 2025, após “constatação de indícios da presença de contaminantes que podem prejudicar a saúde animal”.
A Nutratta Nutrição Animal, com sede em Itumbiara-GO, fundada em 18/12/2012, é conhecida por sua tecnologia inovadora chamada Smart Fiber, que oferece uma fonte de fibra funcional com benefícios para a saúde animal e para os produtores. A empresa atua no fornecimento de ração para diversas espécies, incluindo equinos, suínos, aves e bovinos.
A Smart Fiber é uma tecnologia inovadora na produção de ração animal que melhora a saúde do trato gastrointestinal com maior produção de ácidos graxos voláteis (AGV), maior bem-estar e redução estresse, redução na incidência de cólicas, diarreia, prolapso retal, compactação e torção intestinal. Produção de 30% da energia de mantença. ( NUTRATTA, 2025)
6. Mortes de cavalos no Brasil
De acordo com o levantamento estatístico efetuado por um Grupo de Criadores e Proprietários de Cavalos de São Paulo, conforme Tabela 2, abaixo, que pretende entrar na justiça com uma ação judicial coletiva de “ Perdas e Danos “ contra a Nutratta Nutrição Animal, pela intoxicação alimentar e morte de animais pela substância Monensina Sódica, contida na ração para equinos “ Foragge Horse “; do efetivo de mais de 900 equinos intoxicados, levantados até a presente data, 24/06/2025, em 05 estados e 47 municípios do país: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Goiás e Bahia, 512 foram a óbitos, com os seguintes números por Estado: ( Fig 04 )
Tabela 2. Animais intoxicados por Estado/Municípios – Situação Animal. 

Fig 04. Morte de cavalos em Alagoas – Foto Tribuna do Sertão / Alagoas
7. Tratamento
Não há um tratamento terapêutico específico para a toxicose de Monensina sódica em cavalos. A gravidade da intoxicação depende da quantidade do aditivo (mg) consumida na ração animal e nos sintomas clínicos apresentados por cada animal, como ficou demonstrado na pesquisa experimental realizada pelo prof. Pedro Soares Bezerra Jr & Col, em “ Experimental monensin poisoning in horses “, Depto de Patologia da Universidade de Santa Maria-RS, no ano 2000.
a) Nas toxicoses agudas recomenda-se.
– Descontaminação gastrointestinal para remover a ração contaminada, período de 24 horas, com sonda nasogástrica;
– Medicação com carvão ativado para reter e eliminar a toxina;
– Fluidoterapia.
b) Nas toxicoses crônicas. ( fig 5 )
– Controle e monitoramento das funções vitais do animal;
– Fluidoterapia intravenosa com aplicação de soros;
– Suplementação com tiamina ( Vit B1 ) ou Vitamina E;
– Cardiotônicos para manter o rítmo cardíaco e protetores hepáticos;
OBS. O prognóstico da toxicose por Monensina é “RESERVADO” e depende da quantidade da substância ingerida e do grau de dano cardíaco causado. ( RICARD. M, VETSTER, 2023 ).

Fig. 05. Fluidoterapia em cavalos da Associação Cavalos Amigos de Resende – Tratamento de urgência. Foto: Tadeu R. Matos
8. ALERTA
A monensina é altamente tóxica para cavalos, e não há um antidoto específico para o tratamento da toxicose. Os animais que sobrevivem podem ter sequelas cardíacas permanentes que os impossibilitam seu emprego em atividades esportivas de alto rendimento.
8.1 ADENDO
Durante a elaboração desse artigo, Nota Oficial do Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal (Dipoa), do Ministério de Agricultura e Pecuária, Ofício-Circular nº 36/2025/CGI/DIPOA/SDA/MAPA, notificou a presença de outros alcaloides pirrolizidínicos, notadamente a Monocrotalina, em concentrações que a literatura técnico-científica indica como capaz de causar doença e morte em equídeos e outras espécies.