CID-11: 1B92 Mormo

Sinonímia

“Lamparão”, “Farcino Equino”, “Catarro do Mormo”, “Catarro de Burro” ou “Catarro Bravo”.

Etiologia

Bactéria Gram-negativa Burkholderia mallei, um bacilo imóvel, aeróbio, bipolar, mesófilo e não esporulado. Pode sobreviver de 6 semanas a vários meses em áreas contaminadas e permanecer viável em água tratada por pelo menos um mês, mas é inativado após 24 h de exposição direta à luz ultravioleta ou 10 minutos a 55°C. Sua cápsula de polissacarídeos é considerada um importante fator de virulência e aumenta a sobrevivência.

Distribuição geográfica

Apesar de o bacilo ser disseminado devido à sua sobrevivência telúrica, a doença foi erradicada em muitos países. A distribuição atual é pouco conhecida, com casos esporádicos ocorrendo na África, Ásia, Oriente Médio e Américas Central e do Sul. A ocorrência natural não é reportada nos Estados Unidos desde os anos 1940s, porém o micro-organismo tem uso potencial em bioterrorismo a ser considerado. No primeiro semestre de 2018, Brasil e Irã reportaram focos à OIE.

Ocorrência no homem

Atualmente é uma excepcionalidade. As cepas asiáticas, mais frequentes, são de menor virulência. Veterinários, tratadores de cavalos, laboratoristas e magarefes têm de considerar a exposição laboral como perigo potencial.

Ocorrência nos animais

Com a intervenção veterinária e programas de controle nacionais, a prevalência diminuiu consideravelmente.

Equinos e ocasionalmente felídeos são suscetíveis, e a suscetibilidade já foi demonstrada também em camelos, ursos, lobos e cães. Asininos são mais sensíveis, muares um pouco menos e os equídeos mais resistentes, desenvolvendo formas crônicas. Continua a ser reportado no Brasil, China, Índia, Irã, Iraque, Mongólia, Paquistão, Turquia e Emirados Árabes.

A doença no homem

Sintomas comuns incluem febre, dores musculares, angina, cefaleia com sensibilidade à luz e lacrimejar excessivo e descarga nasal. Sintomas particulares ocorrem conforme a apresentação da infecção, se aguda: 1) cutânea, sendo localizada, com ulceração após 1 a 5 dias da arranhadura ou corte e linfonodos infartados; 2) mucosa, envolvendo a conjuntiva, mucosa nasal e do trato respiratório, com aumento da secreção mucosa nos sítios envolvidos e disseminação potencial para outras regiões do corpo uma a quatro semanas depois; 3) pulmonar, com infecção, pneumonia, abscedação e efusão pleural podendo ocorrer (radiografias do tórax mostrarão infecção lobular localizada); 4) bacteriemia, quando, sem tratamento, a infecção é geralmente fatal no prazo de 7 a 10 dias.

A infecção crônica envolve abscessos múltiplos na pele e músculos dos membros ou pulmões, baço e/ou fígado.

A doença nos animais

O período de incubação varia com a rota e intensidade da exposição e fatores intrínsecos ao hospedeiro, variando de poucos dias a muitos meses, mas contado como seis meses para aplicações de restrições sanitárias. As formas nasal e pulmonar tendem a ser mais agudas, e as formas cutâneas, crônicas. Uma forma latente foi descrita como de poucos sinais, como descarga nasal e dispneia.

Mormo nasal inicia com febre alta, inapetência, respiração difícil e tosse; descarga nasal mucopurulenta, viscosa e altamente infecciosa ocorre e podem formar crostas nas narinas; descarga ocular purulenta pode ocorrer, bem como nódulos na mucosa nasal evoluindo para úlceras, que podem se disseminar para o trato respiratório superior e culminar em perfuração do septo nasal; úlceras na mucosa nasal, traqueia, faringe e laringe podem resultar em cicatrizes em forma de estrela; linfonodos regionais (submaxilares, p.ex.) aumentam e endurecem podem romper e supurar, com aderência de tecidos.

O mormo pulmonar, que geralmente leva vários meses para se desenvolver, pode manifestar-se inicialmente com febre, dispneia, tosse paroxística ou seca acompanhada de respiração difícil. Pneumonia difusa ou nódulos pulmonares podem progredir para o estado calcificado ou caseoso, eventualmente extravasando conteúdo para o trato respiratório superior. Nódulos piogranulomatosos podem ser encontrados no fígado, baço e rins.Diarreia e poliúria podem ocorrer, levando à perda de condição corporal.

O mormo cutâneo desenvolve-se de forma crônica, começando com tosse e dispneia geralmente associadas à debilidade e lesões com enfartamento de linfonodos. Nódulos aparecem no tecido subcutâneo no trajeto linfático em membros, áreas costais e ventrais do abdômen, podendo ulcerar eliminando exsudato purulento e infeccioso; o curso linfático pode se apresentar inchado, acordonado, espessado ou coalescente (farcino). Orquite já foi reportada.

Fonte de infecção e modo de transmissão

A fonte de infecção mais comum é a ingestão de alimentos e água contaminados com descargas do trato respiratório ou da pele ulcerada de animais infectados, e portadores subclínicos são muito importantes nesta transmissão. Inalação de aerossóis e solução de continuidade através da pele e mucosas nasal e ocular na transmissão direta ou por fômites devem ser considerados.

Papel dos animais na epidemiologia

Alta densidade animal e proximidade favorecem a disseminação, bem como o estresse do hospedeiro. A transmissão entre humanos não é importante, sendo dos animais subclinicamente infectados o papel mais importante na epidemiologia. As grandes epizootias de mormo foram reportadas em cavalariças com alta densidade populacional, principalmente durante guerras. Por estes fatores, o trânsito de animais deve ser controlado. 

Diagnóstico

O diagnóstico diferencial inclui garrotilho (Streptococcus equi), linfangite ulcerativa (Corynebacterium pseudotuberculosis), botriomicose, esporotricose, pseudotuberculose (Yersinia pseudotuberculosis), linfangite epizootica (Histoplasma farciminosum), poxvírus equino, tuberculose e traumas e alergias, porém só devem ser pensados após descartar a suspeita de mormo, sendo a sorologia indispensável e a submissão de amostras para isolamento e/ou identificação procedidas sempre que disponíveis.

Amostras devem ser colhidas com especial cuidado e mantidas resfriadas. Esfregaço de exsudatos ou lesões frescas são submetidos à microscopia, e fragmentos ou lesões inteiras e secreções devem ser enviados para isolamento e/ou identificação do agente, sendo preferidas lesões fechadas e não-contaminadas e meios contendo glicerol.

A sorologia é considerada suficiente para o diagnóstico de equídeos infectados, devendo as amostras serem obtidas assepticamente e submetidas ao teste de fixação do complemento ou, alternativamente, ELISA + immunoblotting.

A maleinização deve ser evitada por questões de bem-estar animal, mas pode ser útil em áreas onde a obtenção e o transporte de amostras apropriadas se constitui um problema.

No Brasil, a Portaria SDA n° 35, de 17 de abril de 2018 definiu os testes laboratoriais usados no diagnóstico do mormo no Território Nacional.

Controle

A prevenção de casos humanos se baseia na identificação e eliminação da infecção na população animal. Não há vacina. A Instrução Normativa MAPA nº 6/2018 traz as diretrizes para prevenção, controle e erradicação do mormo no Brasil.

O sucesso do controle e prevenção depende da detecção precoce e restrição do contato com animais doentes, por isso devem ser considerados quarentena e desinfecção cuidadosa, e a doença ocupacional humana, bem como a atuação dos contactantes como vetores mecânicos devem ser preocupações constantes.