Introdução

A veterinária brasileira surgiu oficialmente no Brasil, no Exército Brasileiro, em 06 de janeiro de 1910, conforme o Dec. Presidencial, nº 2 232, do Exmo. Sr. Presidente da República, adv. Nilo Peçanha, que reorganizou o Serviço de Saúde do Exército, subordinado à 6ª Divisão do Departamento de Guerra.

Não resta dúvidas que o Serviço de Veterinária, recém criado, no Exército, veio suprir as necessidades de apoio logístico, sanitário e de saúde, humana e animal, sentidas durante as Batalhas das Guerras Platinas, período de (1851 – 1870), em que o Exército Imperial tomou parte. A aparição de doenças humana e animal nos vários campos de batalha das Guerra do Prata, deveu-se sobretudo: a escassa alimentação, os milhares de cadáveres insepultos, às más condições higiênicas, a enorme quantidade de bactérias que assolava os acampamentos e campos de batalha. À longa lista de causas para a expansão de enfermidades e pestes deve juntar-se ao grave dano do sistema ecológico insalubre e a ruptura do equilíbrio natural que se efetuou com a presença de grande quantidade de militares e civis que se deslocavam incessantemente pelos pântanos, matas e bosques, penetrando no habitat natural dos agentes vetores e transmissores de doenças. (DOURADO, G.T. M. USP, 2010). As tropas dos exércitos beligerantes e as populações civis dos países envolvidos no extenso Teatro de Operações, não tinham educação sanitária e nem eram imunizadas contras as doenças e enfermidades que grassavam nos campos de batalha. Da mesma forma, os animais utilizados nos combates, cavalos e muares, doentes, enfraquecidos e depauperados pelo trabalho excessivo e falta de ração; e os bovinos, abatidos a céu aberto para alimentação da tropa, sem qualquer inspeção sanitária e higiene, contribuíram com a transmissão de doenças, entre humanos e animais (antropozoonoses) na época desconhecidas.

Ressalta-se que durante esse período (1851 -1870) a bacteriologia recém descoberta (Robert Koch, 1876 -1882), e as existências de doenças entre humanos e animais, eram creditadas às teorias miasmáticas: “as doenças teriam origem nos miasmas: o conjunto de odores fétidos provenientes de matéria orgânica em putrefação nos solos e lençóis freáticos contaminados “. (Sydenham & Lancisi, Séc. XVII). Não havia, ainda na América do Sul e nos países combatentes, os conhecimentos científicos de bacteriologia e epidemiologia.

Nesse longo período de Guerras, principalmente a Guerra do Paraguai, (1864-1870), onde o frio, a fome e as doenças mataram mais que as armas brancas e de fogo (DOURADO, G.T. M. USP, 2010), e baseado no Relatório Sanitário do Dr. Gen Bda Maciel Feliciano Pereira de Carvalho, primeiro brasileiro a Chefiar o Corpo de Saúde do Exército, que relatava o precário estado sanitário que envolvia as Unidades Militares e as Comunidades do Rio de Janeiro, principalmente pela falta de Higiene e Política Sanitária, evidenciado pelo alto grau de morbidade e letalidade das doenças: cólera, febre amarela, tifo, tétano, mormo, tuberculose, varíola, peste bubônica etc. fez com que o Gen Bda Med Dr. Ismael da Rocha, apoiado pelos Drs. Oswaldo Cruz, Carlos Chagas e Cardoso Fontes, implantasse o Laboratório de Microscopia Clínica e Bacteriologia do Exército (1894), primeira instituição brasileira, pedra angular, no âmbito da bacteriologia do Brasil (Valdir da Rocha. 1998, p.6). Inaugurado na cidade do Rio de Janeiro, em 2 de junho de 1896, funcionou inicialmente em um prédio da rua Senador Furtado, sendo transferido em dezembro de 1898 para Rua General Canabarro, nº 40 (Tijuca), e indo finalmente em 1905 para o 2º pavimento do Pavilhão Rodrigues Alves, no Hospital Central do Exército -HCEx, Benfica-RJ.

Moniz de Aragão

Moniz de Aragão

Foi nesse novel e reputado Laboratório de Pesquisa Militar, iniciador da pesquisa bacteriológica do Brasil que, integrando uma notável equipe de pesquisadores e cientistas, civis e militares, surgiu o 1º Ten Med Dr João Moniz Barreto de Aragão (1904), consagrado médico clínico-cirurgião, que orientado pelo prof. Pierre Paul Emile Roux, do Instituto Pasteur, dedicou-se inteiramente ao estudo da clínica hipiátrica, principalmente, das doenças parasitárias, contagiosas e infecto-contagiosas: mormo, tuberculose, tétano, aftosa, raiva etc, as principais epidemias e epizootias, que no início do século XX, dizimavam a população humana, a cavalhada e os rebanhos bovinos, civil e militar, do Estado do Rio de Janeiro e do Brasil.

Os feitos gloriosos, inéditos e pioneiros obtidos por Moniz de Aragão, de âmbito nacional e internacional, no campo da clínica, bacteriologia, produção de soros e vacinas, e também no campo da inspeção sanitária e higiene de alimentos, valeram-lhe a convocação do Ministério da Agricultura, Aviso nº 2.286, de 02 ago 2011, para Organizar o Serviço de Defesa Sanitária Animal – SDSA. Organizou o Serviço, foi seu primeiro diretor e editou o primeiro Código de Defesa Sanitária Animal, embrião do atual Regulamento do Serviço de Defesa Sanitária Animal, Ministério da Agricultura.

O Ten-Cel med Dr. Moniz de Aragão, na sua curta existência de 48 anos (1874 -1922), além de fundador e Diretor da primeira escola de Medicina Veterinária do Brasil, Escola de Veterinária do Exército, ESVEx, inaugurada no Rio de Janeiro, São Cristovão (1921), teve a oportunidade de assistir à solenidade de formatura da primeira Turma de Veterinários, composta de seis formandos: dois (2) civis e quatro (4) militares, em 15 de fev de 1917.

Outras obras, trabalhos, títulos e diplomas de instituições nacionais enobreceram e dignificaram o “Curriculum Vitae” e a brilhante carreira de Moniz de Aragão:

  • Acadêmico de Medicina, apresentou-se como voluntário ao Cmt do 3º Distrito Militar – BA, para servir no Hospital de Sangue da Guerra de Canudos, 1897;
  • Dr. pela Faculdade de Medicina da Bahia e Defesa de Tese de Doutorado “Hérnia inguinal e sua curabilidade”;
  • Membro Titular da Academia Nacional de Medicina com a memória inédita “A hérnia inguinal perante a cirurgia moderna”, Rio de Janeiro, 1906;
  • “Contribuição ao estudo do mormo no homem”. Trabalho técnico e científico inédito, descoberta do antígeno da maleína, o que lhe valeu o elogio do professor Roux, da Escola de Alfort: “a ele se deve a sobrevida do rebanho equino do Brasil e, talvez, da América do Sul”! 1907;
  • Criador do primeiro Regulamento e Diretor do Serviço de Defesa Sanitária Animal, Ministério da Agricultura, Rio de Janeiro, 1911;
  • Diretor do Primeiro Curso Prático de Veterinária do Exército, Rio de Janeiro, 27 de agosto de 1914;
  • Fundador e primeiro presidente da Sociedade Médico-Cirúrgica Miltar, Rio de Janeiro, 17 ago de 1915;
  • “A distribuição de água aos exércitos em marcha e em operações”. Trabalho que visava distribuir água potável à tropa do Exército em campanha, baseado nos conceitos higiênicos de Joseph Lister, (1917);
  • Inspetor do Serviço de Veterinária do Exército. Rio de Janeiro, 1920.
  • Decreto-lei, nº 2.893, de 20 de dez, de 1940, do Sr. Presidente da República Getúlio Vargas publica: “que o Coronel-Médico Dr. João Moniz Barreto de Aragão, durante sua carreira militar, prestou ao Exército assinalados serviços consagrando à Veterinária Militar persistentes e eficazes esforços para a fundação e desenvolvimento do respectivo serviço,” decreta: Art. Único – É considerado Patrono do Serviço de Veterinária do Exército o Coronel Médico Dr. João Moniz Barreto de Aragão. Rio de Janeiro, 20 de dez 1940.

Marechal Juarez Távora

Marechal Juarez Távora

Juarez do Nascimento Fernandes Távora. Professor, engenheiro, político e militar. Cearense de Jaguaribemirim, atualmente Jaguaribe -CE, nasceu nesse município, em 14 de jan de 1898, sendo o (15º) Filho de Joaquim Antônio do Nascimento e Clara Fernandes Távora do Nascimento. Sua família, segundo consta da historiografia familiar, estaria vinculada à nobreza de Portugal, sendo seu antepassado mais ilustre o Marquês de Távora, que se refugiou em 1759 no sertão do Ceará para fugir à perseguição do marquês de Pombal. Como militar, de 2º Ten Eng a Gen de Divisão, último posto de sua vida castrense, fez uma carreira militar vitoriosa porém, revoltosa, insurreta e turbulenta.

Considerado um Revolucionário pertinaz e intransigente na defesa da justiça social, interesses da Pátria e da democracia, participou ativamente com destaque e liderança militar nas seguintes Revoluções: “Revolta do Forte Copacabana”, 1922, “2º Movimento Tenentista”, 1924, “Coluna Prestes”, 1924 -1927, onde foi Comandante, “Golpe de Estado”, 1930, que depôs o Presidente Washington Luiz, Interventor como “Delegado Militar do Governo Provisório do Norte “, 1930-1931, nomeado por Getulio Vargas para manter os ideais revolucionários no Norte do país e da ” Revolução Constitucionalista de São Paulo “, 1932.

Sem perder a patente de capitão e vinculado ao Exército, altamente prestigiado pelo presidente Getulio Vargas, por todos os movimentos revolucionários e campanhas que fez em prol do governo Provisório de Getúlio, seu grande aliado político, foi nomeado em 22 dez de 1932 para a pasta do Ministério da Agricultura. Com objetivo de organizar e re-estruturar funcionalmente o Ministério, Juarez, logo que assumiu, deu grande dinamismo à pasta, criando os seguintes órgãos e diretorias: Diretoria de Expediente e Contabilidade e as diretorias gerais de Agricultura, Indústria Animal e Pesquisas Científicas, além de regular o exercício da profissão de agrônomo; o Instituto de Tecnologia (maio de 1933); o Instituto do Açúcar e do Álcool (junho de 1933); a Diretoria de Estatística e Publicidade (julho de 1933); o Departamento Nacional de Produção Mineral (julho de 1933) e o Instituto de Biologia Animal (agosto de 1933). Em setembro de 1933, regulamentou a profissão de veterinário.

No ano de 1934, segundo ano de sua gestão, em janeiro, Juarez aprovou os códigos de Caça e Pesca e o Florestal, instituindo o “Dia da Árvore”, a ser comemorado no dia 21 de setembro de cada ano. No mês seguinte criou a Escola Nacional de Agronomia, (ENA) e a Escola Nacional de Veterinária (ENV).

Em decorrência de seus trabalhos profícuos e pioneiros em prol da agronomia, agricultura, veterinária e da educação rural no Brasil, e ainda, por haver também compartilhado com as reformas e propostas formuladas pelos veterinários e agrônomos que o assessoraram, entre eles o prof. med vet Guilherme Edelberto Hermsdorff, ex-ministro da agricultura, Juarez do Nascimento Távora passou a ser considerado Patrono da Veterinária Brasileira. (ABRAMVET, História da Veterinária do Brasil, 2002, pg. 25).

Embora com muita honra e orgulho as entidades e instituições representativas da Veterinária Brasileira acatem e aceitem o Marechal Juarez Távora como Patrono da Veterinária, não existe, de fato, até hoje, um documento oficial do governo brasileiro, que oficializa e torna essa “Consideração” honrosa como verdadeira.