Por Sávio Freire Bruno e Ana Beatriz Marins de Negreiros

A saracura-três-potes (Aramides cajaneus) pertence à família Rallidae e à ordem Gruiforme. Habita predominantemente o solo, sendo, portanto, considerada terrestre. Seu nome “três-potes” faz referência à onomatopeia gerada pelo seu canto.

Distribuição e habitat

A saracura-três-potes habita desde o México até a Argentina, e é a saracura mais conhecida no Brasil, ocorrendo em todo território nacional (Sick, 1997). É encontrada nas matas de galeria, matas ciliares, pântanos com vegetação alta, manguezais e áreas abertas adjacentes a rios e lagos

Fig. 1: Saracura-três-potes (Aramides cajaneus) às margens do canal de Itaipuaçu. Foto: Sávio Freire Bruno, Maricá, RJ, junho de 2023.

Morfologia

Possuem em média 39 centímetros de comprimento e pesam cerca de 400 gramas. Sua plumagem segue um padrão de cores que garante uma excelente camuflagem. Sua cabeça e pescoço são de cor cinza, enquanto a região dorsal possui coloração castanho-esverdeada e a região ventral possui um tom ferruginoso bem destacado. Seus olhos são avermelhados, e quando adultos seu bico possui um tom amarelo esverdeado. Seu tarso é comprido, e a região, de cor avermelhada, sendo essa uma característica marcante das saracuras.

Fig. 2: Visão lateral da saracura-três-potes, um indivíduo adulto. Destaca-se a coloração marcante de sua plumagem, dos olhos e do bico. Foto: Sávio Freire Bruno, Itaipuaçu, Maricá, RJ, abril de 2020.

Os filhotes nascem com a plumagem negra e olhos e bico escuros (Taylor, 2020). No decorrer do seu crescimento, os jovens acentuam tons ferruginosos, e vão aos poucos adquirindo as características de coloração comuns aos adultos. (Fig.3).

Fig. 3: Grupo familiar de saracura-três-potes na margem do canal de Itaipuaçu. Ao centro da foto encontra-se um indivíduo jovem, ainda com o bico escuro e os membros posteriores sem a pigmentação avermelhada, característica dos adultos, mas já com tons ferruginosos reforçados na plumagem. Foto: Sávio Freire Bruno, Maricá, RJ, janeiro de 2020.

Alimentação 

Esta espécie costuma apresentar hábitos alimentares semelhantes aos de outras saracuras, sendo, portanto, consideradas predadoras oportunistas. Alimentam-se de itens variados como larvas de insetos, pequenos crustáceos e pequenos peixes, que são capturados com o bico (Nishida et al., 2011). Algumas vezes, utilizam da estratégia de seguir formigas de correição para se alimentar de animais espantados por elas (Lagos, 2018). Podem também se alimentar de esqueletos de animais mortos, como caramujos e pequenos caranguejos.

Fig. 4: Saracura-três-potes (Aramides-cajaneus) predando um pequeno crustáceo, o caranguejo-chama-maré (Uca sp.). Foto: Sávio Freire Bruno, Maricá, RJ, abril de 2013.

Hábitos e Reprodução

Vivem solitárias ou em casais, e vocalizam frequentemente em coro ou dueto (Fieker et al., 2014). As vocalizações podem ocorrer durante todo o dia, sendo notadas com mais frequência ao amanhecer e ao anoitecer. Assim que se prenunciam chuvas fortes, seu canto é também relatado (Sousa et al., 2023). Traduz-se em um canto estridente: “três-potes, três-potes – pot, pot, pot”.

As saracuras-três-potes são monogâmicas, e constroem os ninhos com gravetos, capim e folhas, em áreas rodeadas por água ou nas margens dos córregos em meio à vegetação densa (Sousa et al., 2023). Depositam de três a sete ovos cuja incubação dura mais de 20 dias e é realizada por ambos os pais. Além do ninho onde são incubados os ovos, podem construir “ninhos-criadeiras”, utilizados após o nascimento do filhote (Fiecker et al., 2014), que seriam análogos a um berçário. O cuidado parental com o filhote após o nascimento também é realizado por ambos os pais (Taylor, 2014).

Ameaças e conservação

A saracura-três-potes possui status pouco preocupante (LC) na Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da IUCN (International Union for the Conservation of Nature), e pode ser facilmente encontrada em sua área de distribuição. Embora não esteja em risco, a espécie pode ser bastante afetada pela destruição dos habitats em que vive (Taylor, 2014). Portanto, esta é mais uma espécie que depende da conservação de áreas úmidas e corpos hídricos em geral.

 

Referências bibliográficas

FIEKER, C.Z.; REIS, M. G.; BRUNO, S. F.. Guia de bolso: 100 aves do Parque Nacional da Serra da Canastra – MG. São Roque de Minas: ICMBio, 2014. p. 27.

HIPÓLITO, J.V.; SAZIMA I. 2016. Golpeando cadáveres: saracura-três- potes Aramides cajaneus quebra conchas e consome caramujos mortos. Atualidades Ornitológicas 190: 27

LAGOS, A. R. et al. Guia de aves: da área de influência da Usina Hidrelétrica de Batalha. Rio de Janeiro: FURNAS, 2018. p. 64. 216 p.: il.

NISHIDA, S. M. ; UBAID, F. K. ; QUINALHA, M. M. ; CARVALHO, R. S. O. ; RAMOS, S. G. ; CHECON, C. T. . Guia de Aves do Jardim Botânico do IB. Botucatu, SP 2011 (Material Didático/Apostila).

SICK, H. Ornitologia brasileira. 2ª. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997. p. 297.

SOUSA, A. E. B. A. et al. Guia de aves da Floresta Nacional da Restinga de Cabedelo [livro eletrônico]. Ilustração Cristiano Marcelo da Silva Nascimento. João Pessoa, PB: Ed. dos Autores, 2023. p. 50

TAYLOR, B. (2020). Gray-cowled Wood-Rail (Aramides cajaneus), version 1.0. In Birds of the World (S. M. Billerman, B. K. Keeney, P. G. Rodewald, and T. S. Schulenberg, Editors). Cornell Lab of Ornithology, Ithaca, NY, USA. Disponível em: <https://doi.org/10.2173/bow.gycwor1.01>

WIKIAVES (2024) [Saracura-três-potes (Aramides cajaneus)]. WikiAves, a Enciclopédia das Aves do Brasil. Disponível em: <https://www.wikiaves.com.br/wiki/saracura-tres-potes#>. Acesso em: 24/06/2024.

 

Sávio Freire Bruno é Professor Titular do Departamento de Patologia e Clínica Veterinária, Faculdade de Veterinária, Universidade Federal Fluminense; Professor Colaborador do Curso de Ciências Biológicas e do Curso de Ciência Ambiental (UFF).
Ana Beatriz Marins de Negreiros: Acadêmica do Curso de Ciências Biológicas, Universidade Federal Fluminense.
Revisão de texto: Eduardo Sánchez.
Foto de capa: Sávio Freire Bruno. São José do Barreiro, São Roque de Minas, MG. Outubro de 2008.