Geralmente, o foco de seleção de bovinos é para a produção de carne ou de leite. Cada um desses processos de seleção sofre influência de vários fatores para que se tenha uma produção favorável.

Esses fatores de produção são representados pela adaptação do animal ao meio ambiente onde ele está sendo criado: se o espaço é adequado para ele deitar, a qualidade da água, o tipo de alimentação oferecido, os cuidados com a saúde, a prevenção de doenças, entre outros inúmeros fatores que interferem na vida do animal.

Quanto ao animal em si, muitas características de produção são independentes das características raciais: assim quando se direciona um processo de seleção somente para as características raciais, as características de produção ficam prejudicadas porque são controladas por fatores hereditários, independentes um do outro. Por exemplo, o formato da carcaça e o rendimento de cortes cárneos não estão associados diretamente às características raciais, mas vão se modificando, ano após ano, de acordo com o que é selecionado, se para corte ou leite, porém as características raciais mantém-se inalteradas.

Por outro lado, há características raciais, como cor da pele, os pelos e o formato das orelhas , que estão diretamente ligadas à adaptação do animal ao meio ambiente em que vive, o que é primordial para manter sustentável um sistema de produção.

As características raciais da raça Nelore estão intimamente ligadas à habilidade materna da vaca.

A vacada Nelore tem um hábito sui generis  em ir pastar em um local longe, enquanto seus filhos, com  idade de até 4 meses, ficam agrupados, sendo cuidados por poucas vacas do grupo. Facilmente se observa um lote de vacas paridas em um pasto grande, quando seus bezerros muito jovens precisam repousar após a mamada. As mães vão se afastando, vão andando e pastando em regiões dentro do pasto, que ficam distantes do bezerros. Enquanto isso, algumas poucas vacas permanecem junto ao grupo de bezerros deitados. As mães vão pastar mais longe, porém sempre atentas ao lugar onde deixaram os filhos dormindo.

A natureza conferiu a essas vacas o pescoço longo, o aparelho auditivo aguçado e uma visão ampla para que elas estejam muito atentas a tudo o que se passa ao redor. Com o pescoço longo elas podem observar, com facilidade, onde está o filho e, se necessário ,ir rapidamente protegê-lo ao ouvir o menor ruído ou ao sentir a menor ameaça que possa surgir. Tudo indica que essa particularidade faça com que a vaca seja mais prolífera.

O formato do crânio, da órbita ocular e do olho sui generis da raça Nelore, assim como a posição da orelha e o tamanho do pescoço, não devem ser modificados, pois isso tudo está relacionado com a boa habilidade materna.

Apesar de não ter relação com o peso, o formato do crânio tem muito a ver com a proteção da cria e a habilidade materna, tornando alta a prolificidade da vaca Nelore.

Ouve-se comentários, tanto em leilões como em exposições, que o Nelore precisa ter a boca mais larga. Certamente, que a escolha sucessiva de animais com boca larga vai modificando o formato do ataúde do crânio. Será que é adequado modificar o que a natureza criou e que está dando certo?

O crânio dos bovinos Nelore, no formato de ataúde, funciona bem e deve ser preservado para não ter perda nas habilidades que esses animais apresentam.

A audição do Nelore é tão aguçada como a de um cavalo ou a de um burro.

O órgão da visão, localizado nas laterais do ataúde, permite a visão rápida ao seu redor, e a cabeça, afixada no corpo por um pescoço relativamente longo, faz com que o animal possa ver e ouvir a uma grande distância, quando sai para pastar e fica longe do seu bezerro.

Os aprumos do bovino, representam uma característica de produção importante, um vez que no nosso país as pastagens são grandes, as distâncias a percorrer são longas e os bovinos precisam de boas pernas para caminhar, pastando durante 8 horas, diariamente.

Outras partes do corpo que são importantes para a condição adaptativa ao clima tropical, são a barbela, o couro solto e o cupim. Por isso também são importantes de serem preservados.

A barbela apresenta herdabilidade baixa, porém a natureza, ao longo de séculos, colocou-a dessa forma com o objetivo de aumentar a superfície corporal para facilitar a troca de calor entre o animal e o ambiente, importante na termorregulação.

O couro “solto” também auxilia na dissipação do calor; entretanto, tem alguns músculos menores e presos ao couro, que permitem ao animal movimentar a pele em pequenas regiões específicas, de forma que ele consiga espantar as moscas que pousarem sobre ele.

O cupim é um órgão de reserva de gordura para suprir as necessidades do animal durante a escassez de alimentos e também apresenta baixa herdabilidade. Ele não pode ser desprezado por ser um órgão de adaptação ao ambiente, uma vez que é muito útil como reserva energética do animal, devido à grande área tropical que abrange o Brasil, com estações secas cada vez mais longas, exigindo animais cada vez mais adaptados. Além disso, quando comparado ao taurino, o cupim é uma peça a mais da carcaça.

 

Reprodução parcial  de conteúdo extraído do livro
“Nelore e outros zebuínos” 
de autoria de Paulo Pereira Lima e Maria Lúcia Pereira Lima