A febre aftosa existia no Brasil desde o final do século 19. Sua incidência foi aumentando ao longo das sete décadas iniciais do século 20.
A doença começou a ser combatida a partir de 1951 quando o governo brasileiro criou com a Organização Panamericana da Saúde – OPAS – o Centro Panamericano de Febre Aftosa, atualmente o PANAFTOSA, em Duque de Caxias, no Rio de Janeiro. Esta entidade, que é hoje o maior centro de referência da doença em todo mundo, permitiu ao Brasil e aos países da região conhecer a doença, seus agentes víricos, fabricação e controle de qualidade das vacinas, provas sorológicas para verificar a imunidade dos animais e a circulação viral no campo. Também realiza exercícios para treinamento do pessoal para eventual emergência e diferencia animais vacinados dos infectados.
A partir de 1964, o Brasil com apoio do Governo Federal criou os GECOFAs e a aftosa que oficialmente causava cerca de 20.000 focos/ano começou com a vacinação a diminuir a incidência.
Na década de 1980 com a integração maior entre governo e setor privado o combate à doença se intensificou e a incidência de focos caiu em muitos estados.
Com desenvolvimento da vacina oleosa feito pelo PANAFTOSA o controle de doença melhorou muito nos rebanhos extensivos.
O Brasil então começou a trabalhar por circuitos pecuários e um plano nacional com metas regionais, o que era necessário devido à extensão e diversidade de sistemas de criação no país.
O plano nacional de erradicação da Febre Aftosa do Brasil – PNEFA – foi desenvolvido no país com muito sucesso e responsabilidade compartilhada entre os setores públicos e privado. Santa Catarina foi o primeiro estado a retirar a vacinação com sucesso em 1999, sendo que, o último foco naquele estado ocorreu em dezembro de 1993.
Os demais estados foram considerados livres com vacinação. O quadro abaixo mostra a ocorrência dos últimos focos e o período já decorrido sem a presença da doença.
Resumo das Ultimas Ocorrências em estados brasileiros + Tempos decorridos até setembro de 2018
TEMPO DECORRIDO | REBANHO ATUAL | |
---|---|---|
Distrito Federal | Maio 1993 – 25 anos + 4 meses | 97.362 |
Santa Catarina | Dezembro 1993 – 24 anos + 9 meses | 4.386.498 |
Acre | Junho 1995 – 23 anos + 3 meses | 2.904.732 |
Goiás | Agosto 1995 – 23 anos + 1 mês | 21.846.644 |
Sergipe | Setembro 1995 – 23 anos | 1.189.119 |
Mato Grosso | Janeiro 1996 – 22 anos + 9 meses | 29.259.830 |
São Paulo | Março 1996 – 22 anos + 6 meses | 10.425.614 |
Espírito Santo | Abril 1996 – 22 anos + 5 meses | 2.221.748 |
Minas Gerais | Maio 1996 – 22 anos + 4 meses | 23.950.720 |
Piauí | Fevereiro 1997 – 21 anos + 7 meses | 1.635.919 |
Rio de Janeiro | Março 1997 – 21 anos + 6 meses | 2.323.375 |
Ceará | Abril 1997 – 21 anos + 5 meses | 2.543.636 |
Bahia | Maio 1997 – 21 anos + 4 meses | 10.783.415 |
Tocantins | Maio 1997 – 21 anos + 4 meses | 8.409.696 |
Pernambuco | Fevereiro 1998 – 20 anos + 7 meses | 1.924.280 |
20 ANOS OU MAIS | 129.903.000 | |
Rondônia | Fevereiro 1999 – 19 anos + 7 meses | 13.397.970 |
Alagoas | Setembro 1999 – 19 anos | 1.214.241 |
Amapá | Outubro 1999 – 18 anos + 11 meses | 311.646 |
Paraíba | Fevereiro 2000 – 18 anos + 7 meses | 1.249.956 |
Rio Grande do Norte | Agosto 2000 – 18 anos + 1 mês | 958.178 |
Rio Grande do Sul | Maio 2001 – 17 anos + 4 meses | 13.280.844 |
Roraima | Junho 2001 – 17 anos + 3 meses | 795.244 |
Maranhão | Agosto 2001 – 17 anos + 1 mês | 7.705.794 |
ENTRE 17 E 20 ANOS | 38.913.873 | |
Pará | Junho 2004 – 14 anos + 3 meses | 21.181.933 |
Amazonas | Setembro 2004 – 14 anos | 1.215.288 |
Paraná | Fevereiro 2006 – 12 anos + 7 meses | 9.327.651 |
Mato Grosso do Sul | Abril 2006 – 12 anos + 5 meses | 20.461.286 |
ENTRE 12 E 17 ANOS | 52.186.158 |
O mapa abaixo mostra a situação dos estados e os dados do rebanho sem a presença da aftosa.
O PANAFTOSA e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA tem avaliado a circulação viral e nada encontram.
Na América do Sul ocorreram focos na Venezuela, em 2018 que passou a doença à Colômbia, pois possuem uma longa fronteira. Para o Brasil nossa fronteira com a Venezuela é pequena e o MAPA reforçou o controle em Roraima.
Na América do Sul já são totalmente livres sem vacinação os seguintes países: Chile, Guiana, Guiana Francesa, Suriname e Peru. Os demais países possuem partes sem vacinação e outras com vacinação.
Os únicos países que possuem apenas territórios livres com vacinação são Paraguai e Uruguai.
Agora, temos o Brasil totalmente livre de aftosa, sendo que apenas Santa Catarina não vacina e tem reconhecimento internacional há 11 anos, o que prova ser possível retirar a vacinação.
A versão atual do PNEFA prevê a última vacinação no Acre e Rondônia no primeiro semestre de 2019 constituindo o Bloco I.
Os Estados de Amazonas, Roraima, Amapá e Pará (Bloco II) e Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas (Bloco III) planejam retirar a vacinação após o primeiro semestre de 2020.
Os estados de Sergipe, Bahia, Goiás, Tocantins, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo e DF constituem o Bloco IV.
Os Estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraná e Rio Grande do Sul formam o Bloco V.
Os blocos IV e V estão previstos para retirar a vacinação a partir do primeiro semestre de 2021.
O Estado do Paraná já fez auditoria do seu sistema de defesa e deseja antecipar a retirada da vacinação a partir do 1o semestre de 2019. O Rio Grande do Sul pretende também retirar na mesma época que o Paraná. Ambos estados possuem forte produção de suínos que podem desfrutar do mercado internacional com melhores preços.
O Estado de São Paulo, que já é livre sem focos desde março de 1996, portanto há 22 anos e 5 meses, dentro do Bloco IV deve encerrar a vacinação no 1o semestre de 2021.
O PANAFTOSA em seus estudos epidemiológicos sustenta que após 4-5 anos sem focos em uma região, estado ou país pode-se ir prescindindo ou retirando a vacinação, portanto existe grande segurança para eliminar a vacinação na data prevista para São Paulo.
Os focos na Venezuela em 2018 passaram a doença à Colômbia, pois os países possuem uma longa fronteira terrestre cujo ponto mais crítico é Cucuta.
São Paulo, entretanto é um estado que importa animais de unidades vizinhas onde em uma delas ainda existem dúvidas sobre país fronteiriço. Até o momento o planejamento da retirada da vacina previsto pelo PNEFA é perfeitamente possível, porém a situação na Venezuela pode recomendar que até o fim do ano se reuna as autoridades governamentais, organismos internacionais e lideranças do setor privado para analisar e discutir o planejamento do PNEFA para o período próximo, visando ampliar a segurança dos criadores.
As entidades privadas como CNPC, FAESP e SRB com aprovação da Secretaria da Agricultura e Abastecimento de São Paulo estão propondo ao Ministério da Agricultura que se faça um simpósio a este respeito ainda em 2018 na FAESP em São Paulo.
São inegáveis os benefícios da retirada da vacinação, como se pode notar no quadro abaixo tanto a nível nacional como somente para o estado de São Paulo.
Economia na Aquisição de Vacinas | 600 | 19 |
---|---|---|
Economia na Toalete das carcaças | 238 | 61 |
Economia nos Deslocamentos do Rebanho | 1.700 | 80 |
Economia na Produção Leiteira | 130 | 19,5 |
Mão de obra rural, Aquisição de Equip e Acidentes | 80 | 4,7 |
Total Estimado | 2.748 | 184,2 |
A legislação internacional prevista no código de animais terrestres da Organização Mundial de Saúde Animal (OIE em francês) foi bastante alterada desde 2002. Se houver recidiva da doença e o país for livre sem vacinação ele pode recuperar o status de 3 a 6 meses se for livre com vacinação a recuperação do status deve levar dois anos.
Em caso de reincidência de focos somente serão sacrificados os animais doentes e será realizada a vacinação perifocal no raio de 6 km.
Estes animais vacinados da região perifocal podem ser engordados ou criados sendo, entretanto considerados preferenciais para abate.
A retirada da vacinação mostrará ao mundo que o país tem defesa sanitária confiável e permitirá acesso ao mercado de carnes chamado circuito “não aftósico”, onde se estima poder exportar cerca de US$ 1,2 bilhões anuais adicionalmente. Além disso, pode facilitar o retorno dos Estados Unidos à importação de carnes “in natura” do Brasil, que foi proibida também pelas lesões e abscessos causados pela vacinação contra aftosa.
Criadores de suínos também se beneficiarão, pois poderão exportar para mercados melhor remuneradores como Japão e Coreia do Sul.
A retirada da vacina implica, entretanto em exigências para os criadores.
A retirada da vacinação contra aftosa requer:
1) Infraestrutura de defesa sanitária adequada que será auditada pelo MAPA;
2) Investimentos e treinamentos em comunicação a criadores e funcionários visando
aprimorar as vigilâncias passiva e ativa;
3) Fundo indenizatório para necessidades específicas de defesa sanitária;
- São Paulo deve planejar este fundo analisando aqueles desenvolvidos por Goiás, Paraná e Rio Grande do Sul, que mostram grande sucesso. Minas Gerais está iniciando também seu fundo neste ano.
4) Banco de reserva de vacinas e antígenos e os respectivos detalhes envolvidos. Um
país com mais de 220 milhões de bovinos deve ter banco próprio;
- O estoque de vacinas e concentrados deste banco deve estar na ordem de 4% do rebanho bovino. Com grande margem de segurança o estoque seria no máximo de 15 milhões de doses. É importante que este estoque seja de vacinas hidroxi-saponinadas que dão rápida resposta imunitária.
5) Controle de fronteiras entre territórios com diferentes status.
Para o sucesso deste plano é importante que os produtores, técnicos, comunidade acadêmica discutam estejam de acordo com as metas e sua cronologia, pois sempre existem alternativas possíveis na evolução das medidas e nos prazos.