1. Histórico

Segundo relatos históricos, o mel produzido por abelhas, é um dos alimentos mais antigos consumidos pelo homem desde a pré-história, 10.000 anos a.C. Pinturas rupestres e achados ( escritas, pinturas e desenhos ) comprovam que os Neandertais, povos que viveram na Europa e Ásia, eram considerados ótimos caçadores e coletores de mel silvestre e faziam isso desde o período Paleolítico Superior, cerca de 50 000 anos a.C.  ( Lambertucci, 2019).

A história registra que um dos achados mais importantes sobre a história do mel está na pintura rupestre de Toghawana Dam, nas colinas de Motopo Hills, Zimbábue-África, com idade cronológica aproximadamente de 10.000 anos.  Acredita-se, também, que os Egípcios foram os primeiros humanos a criar a abelha racionalmente para fins econômicos. Criavam as colmeias em potes de cerâmica, e achados encontrados no Templo do Sol, perto do  Cairo,  2.400 anos a.C, registra essa atividade artesanal milenar. Os gregos viam o mel não apenas como um alimento importante, mas também com fins terapêuticos. Os livros de receitas gregas estavam cheios de doces e bolos feitos de mel. Os queijos eram misturados com mel para fazer cheesecakes, descritos por Eurípides no século V a.C. como sendo “embebidos mais completamente no rico mel da abelha dourada”. Os romanos também usavam o mel como um presente para os deuses e o usavam extensivamente na culinária. A apicultura floresceu em todo o império romano. Depois que o cristianismo foi estabelecido, a produção de mel e cera de abelha aumentou muito para atender à demanda por velas de igreja. (The Honey Association, 2019).  O Novo Mundo, especialmente o Brasil, não possuía em sua fauna insetívora, até o ano de 1839, as abelhas com ferrão do gênero Apis melífera, grande produtora de mel, europeia. Coube aos jesuítas na catequização dos ameríndios introduzi-la no Rio de Janeiro, vinda de Portugal. Da mesma forma, fizeram os colonizadores alemães que imigrantes da Europa, introduziram-na no Sul do Brasil, no ano de 1845. ( CPT.com.br).

  1. Abelhas produtoras de mel

Existem no planeta milhares de abelhas produtoras de mel, porém, do ponto de vista econômico, apenas algumas centenas são aproveitadas racionalmente para a produção do mel. Em princípio, são classificadas como com ferrão (Apis) e sem ferrão ( Melipona).

Por uma questão cultural e educacional faremos nesse artigo uma descrição sucinta das principais espécies, muitas delas desconhecidas do público em geral, do mundo das abelhas.

2.1 Abelhas com ferrão (Apis sp)

2.1.1 Abelha Europeia. Também conhecida como abelha melífera ocidental ( Apis melífera ) é nativa da Europa, África e Ásia, e a mais popular e produtiva entre as espécies. Além da produção do mel é empregada na polinização das plantações, principalmente citros nos EEUU. Existe em todos os continentes com exceção da Antártica.

2.1.2 Abelha Asiática. ( Apis cerana ). Predominante no Continente asiático é semelhante à abelha europeia, porém um pouco menor. Nativa do sudeste asiático vive em vários países como: China, Índia, Japão, Malásia, Nepal e Indonésia. Sua população está sendo reduzida pela redução das matas nativas e plantações artificiais de seringueiras e palma para produção de borracha e óleo de palma.

2.1.3 Abelha Asiática Anã. (Apis florea).  Morfologicamente menor e parecida com a asiática anã, seu território alcança cerca de 7 000 km, desde o leste do Vietnã ao sudeste da China. Tem sido encontrada também no Oriente Médio e no Continente Africano, devido ao transporte global e importação de colmeias. Sua população está em decadência em virtude do mal manejo e destruição de suas colmeias.

2.1.4 Abelha Gigante. ( Apis dorsata ). Maior espécie do gênero Apis, mede entre 17 e 20 mm.  Vive nas regiões tropicais e subtropicais do Sudeste asiático, Indonésia e Austrália, construindo colônia gigantes nos galhos e troncos de árvores próximos a fontes alimentares. Muita agressiva na época da enxameação e migração para novos ninhos. Menos produtiva que as demais espécies. Fig 02

Abelha gigante

2.1.5 Abelha das Filipinas. ( Apis nigrocincta ).  Uma das menores abelhas do gênero ( 5.5 – 5.9 mm ) está presente nas Filipinas e Indonésia. Espécie que ao contrário das outras nidifica e constrói suas colônias em buracos e ocos de árvores, cavernas e túneis. Multiplica-se por todo ano, sempre que existe condições climáticas extremas e  depredação da espécie.

2.1.6 Abelha de Koschevnikov.  (Apis Koschevnikov ). Habita os países asiáticos de Borneu, Malásia e Indonésia, compartilhando seu habitat com outras abelhas asiáticas. Normalmente faz seu ninho em cavidades naturais como troncos de árvores, tocas de pedras, galerias de cavernas. Suas colônias são pequenas em relação às demais do gênero, o que permite sobreviver em climas chuvosos e úmidos.  

2.1.7 Abelha Africana ( Apis melífera sculellata ). Nativa do Centro e Norte da África, essa espécie de abelha foi introduzida no Brasil, Município de Rio Claro, pelo professor Warwick Kerr com objetivo de melhoramento genético de produção com a abelha europeia. Altamente agressiva e venenosa “ abelha assassina “,  porém com elevada produtividade de mel, rapidamente se espalhou em território brasileiro e América do Sul. Desde então, elas, em cruzamento livre  no meio ambiente,  com a espécie europeia africanizou 90% das abelhas do país. A partir do Brasil, elas invadiram quase toda a América do Sul e Central, e chegaram aos Estados Unidos em 1990, driblando os vários centros de controle construídos na fronteira deste país com o México.

2.2 Abelhas sem ferrão

Pertencente à tribo Meliponina ( Hymenoptera ) essas abelhas estão representadas e classificadas em 52 gêneros e mais de 300 espécies com distribuição geográfica na América do Sul, Central, Ásia, Ilhas do Atlântico, Pacífico, Nova Guiné e África. Na América do Sul são mais numerosas nas florestas tropicais, Cerrado e Caatinga, diminuindo sua ocorrência e população nas Regiões do Sul. ( EMBRAPA, 2020 ).

Nesse artigo, descreveremos às mais produtivas e criadas em cativeiro no Brasil.

2.2.1   Uruçu – Abelha grande  ( Melipona scutellaris ). Com três subespécies: Uruçu amarela, verdadeira e Nordeste essa abelha habita o Nordeste do Brasil, onde é encontrada no ambiente nativo e em cativeiro. Corpo robusto, coloração marrom e preto, mede de 10 a 12 mm de comprimento. Produz grande quantidade de mel,  2.4 a 4 litros por ninho/ano, mais liquido e saboroso que a abelha apis. O mel possui grande qualidade medicinal, rico em propriedades bactericidas, energéticas e antioxidantes. Baixo custo de implantação do meliponário e fácil manejo.                     ( APACAME ) Fig 03

Abelha Uruçu

2.1.2  Mandaguari, Tibuna ou Canudo ( Scaptotrigona ). As abelhas Mandaguari, variedades preta e amarela, são encontradas em todas as Regiões Sudeste e Nordeste. São excelentes produtoras de mel e própolis. Suas colônias têm uma população que varia entre 2 a 50 mil abelhas. A produção anual de mel é de 3 litros /ninho. Na natureza fazem o ninho em ocos de árvores e fendas e buracos de pedras. Adaptam-se facilmente ao cativeiro e seu manejo não é difícil. Mel claro, saboroso e valioso no comércio de méis.

2.2.3 Mandaçaia. ( Melipona quadrifasciata ). Habitando a Mata Atlântica de norte a sul do Brasil, a mandaçaia é uma abelha escura com 4 listras amarelas no abdome, tamanho entre 0.8 a 12mm, apresentando-se com três subespécies: Melipona quadrifasciata, M. anthidioides e M.mandaçaia. Constroem seus ninhos nos ocos de árvores e troncos de árvores. A população de mandaçaia é cerca de 2000 abelhas/ninho, e a produção do mel atinge 1.5 a 2.0 l por temporada. O mel é bastante procurado por ser saboroso, aromático, não enjoativo.  Adapta-se muito bem ao cativeiro e de fácil manejo.  ( APACAME )

2.2.4 Jatai, Jati  ( Tetragonisca angustula ). Uma das menores abelhas de nossa fauna insetívora ( 0.5mm), e a mais cosmopolita das Américas. Seu território abrange todos às nações da América do Sul e Central. Adaptadas ao convívio  social com humanos, aproveitam telhados, paredes, muros, etc, para construir seus ninhos. Suas colônias, geralmente não ultrapassam 1 000 indivíduos.  Produzem cerca de 1l – 1.5l de mel por temporada. São muito resistentes a doenças e de fácil adaptação ao cativeiro. São extremamente limpas e a agua que utilizam para fabricação do mel, retiram do néctar das flores. Além do mel que produzem são excelentes polinizadoras.

2.2.5 Jandaíra ( Melipona subnitida ) . Considerada a polinizadora da Caatinga, do Pantanal e da Mata Atlântica, a jandaíra é uma abelha de cabeça preta, tórax marrom e abdome preto. Responsável pela polinização de 30 % a 60% da polinização das plantas nativas dos biomas brasileiros: Caatinga, Pantanal e Mata Atlântica. Possui colônia numerosa de indivíduos, com produção de 1.5l a 2.0 l por temporada. No nordeste, onde existe a maior criação em cativeiro, seu mel é considerado medicinal na cultura popular na cura de doenças, feridas e conjuntivites. No Pantanal é usada no projeto Oásis, para a polinização e produção de mel sustentável. O mel da jandaíra é um dos mais procurados, apreciados e valorizados no mercado de mel orgânico de melíponas. ( ecoa.org.br )

3.0  Mel: Definição, características e classificação

 3.1  Definição.  Conforme a Portaria Normativa do MAPA, de 20 out 2000, que aprova o Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade do Mel, ( RTIQM ) define-se como Mel:  ( Fig 04 )

Legislação do Mel

Descrição: “ Entende-se por mel, o produto alimentício produzido por abelhas melíferas, a partir do néctar das flores ou das secreções procedentes de partes vivas das plantas ou de excreções de insetos sugadores de plantas que ficam sobre partes vivas de plantas, que as abelhas recolhem, transformam, combinam com substâncias específicas próprias, armazenam e deixam madurar  nos favos da colmeia.” 

3.2  Características do Mel.  Visando ao comércio do mel nos países do MERCOSUL, e padronização do produto nesses países, o Regulamento Técnico desse Acordo e Resolução GMC  Nº 36/93, aprova as seguintes características:

3.2.1  Características Sensoriais.

  1. Cor – Variável de quase incolor a pardo-escura, dependendo da florada de origem;
  2. Sabor e Aroma – Deve possuir sabor e aroma e acordo com sua origem;
  3. Consistência – Variável de acordo com o estado físico em que o mel se apresenta;

3.2.2  Características físico-químicas.

  1. Maturação – Açúcares redutores ( calculados como açúcar invertido ). Mel floral: 65g/100g. Melato ou Mel de Melato e sua mistura com mel floral: 60g/100g;
  2. Umidade – máximo 20g/100g;
  3. Sacarose aparente – Mel floral: máximo 6g/100g; Maleato ou Mel de Melato 15g/100g;
  4. Pureza – Sólidos insolúveis na água: 0.1 g/100g. Mel prensado 0.5g/100g; Minerais: ( cinzas ) máximo 0.6g/100g; Melato ou Mel de Melato 1.2g/100g;
  5. Pólen – O mel necessariamente deve apresentar grãos de pólen.

3.2.3  Classificação.

  1. Por sua origem. Mel floral: é o mel obtido dos néctares das flores; Mel unifloral ou monofloral. Quando o mel é originário de flores da mesma família, gênero ou espécie e possui características físico-químicas e sensoriais próprias.
  2. Mel multifloral ou polifloral. É o mel obtido a partir de diferentes origens florais.
  3. Melato ou Mel de Melato. É o mel obtido principalmente a partir de secreções das partes vivas das plantas ou de excreções de insetos sugadores de plantas que se encontram sobre elas

Feira do Mel

Apesar de o Brasil ocupar a 11ª classificação na produção  mundial do mel, realiza anualmente em Florianópolis Santa Catarina, no mês de maio, uma das maiores feiras de mel do mundo. Este ano, 2023, realizou a XXII Feira de Florianópolis, com apoio da Associação de Apicultores, Epagri, Sebrae, Senar, UFSC e a Secretaria de Estado de Agricultura. A Feira contou com a exposição de mais de 200 produtores e 23 estandes especializados na produção de méis de abelhas Apis e Melíponas, sendo comercializados mais de 52 t de mel e subprodutos apícolas.

  1. Maiores países produtores de mel (2022)

Apresentam-se, nessa tabela, os maiores países produtores de mel do mundo (FAO, 2021), bem como, a produção e consumo per/capita e o continente a que pertencem:

 

 

PAÍS

 

CONTINENTE

 

PRODUÇÃO

PRODUÇÃO PER/CAPITA CONSUMO PER/ CAPITA  

CLASSIF

CHINA Ásia 457 203 t 0.328 kg 0.100 g
TURQUIA Europa 114 113 t 1.412 kg 1.000 g
ARGENTINA América Sul   79 468 t 1.786 kg 0.285 g
EEUU América Nor   69 104 t 0.211 kg 0.960 g
INDIA Ásia   67 442 t    0.05 kg 0.070 g
RUSSIA Europa/Ásia   65 006 t 0.443 kg 1.100 g
BRASIL América Sul   42 346 t 0.202 kg  0.060 g 11º

Fonte: OMS/FAO, 2021        

Edino Camoleze. Med vet mil. MS Tecnologia de Alimentos. Zoogeografia da America do Sul. Acadêmico Titular da ABRAMVET.