Desenvolvimento da Avicultura nas últimas décadas

ABB: Como profissional da avicultura industrial pode me dar uma ideia da evolução dessa atividade nas últimas décadas e o que justificou este progresso?

Alfredo Navarro: Nós podemos afirmar que, na realidade, a avicultura moderna nasceu no final da década de 40, quando houve o fim do registro genealógico para aves. Passou-se a ter como meta na seleção genética não mais padrões raciais (fenótipo) mas performance zootécnica (genótipo): Aves mais pesadas com menor consumo de ração.

O aumento da produção resultante do aumento da demanda em função do menor custo que as outras carnes, gerou a necessidade da automatização e modernização do processo de abate e processamento.

Os novos abatedouros criaram a necessidade de os frangos serem todos brancos. Aparecem os primeiros cruzamentos industriais – White Plymouth Rock e White Cornish.

Os custos de produção em maior escala precisavam de maior volume de aves que crescessem mais rápido para que mais lotes pudessem ser criados nas instalações mais caras.

Resultado: as empresas de melhoramento foram aprimorando seu processo de seleção enquanto os nutricionistas pesquisando constantemente uma ração que contivesse praticamente todos os nutrientes necessários para permitir que as aves expressassem todo seu potencial genético.

Com a chegada da comercialização de cortes, houve a necessidade de fazer a criação separada por sexo. Assim as aves enviadas para processamento tinham praticamente o mesmo tamanho em função de não existir no lote o dimorfismo sexual. Apareceram então as linhagens auto-sexáveis, sendo a diferença do comprimento das penas primárias e secundárias como o fator de separação dos pintinhos por sexo.

Esta evolução de tamanho das aves e dos lotes exigiu um grande desenvolvimento nos controles sanitários. Profilaxia, prevenção e tratamentos eficazes tornaram as aves mais saudáveis e com maior viabilidade.

Para se ter uma ideia desta evolução conjunta, genética, nutrição e sanidade é só compararmos a evolução dos frangos de corte nos últimos 50 anos: Levava-se 55 a 60 dias para obter um frango com 1.880-1.900 gramas com uma conversão de 2,5 – 2,8 kg de ração /kg de frango. Hoje obtém-se uma ave com mesmo peso em 40 dias com conversão de 1,6-1,8 kg de ração/kg de frango, mas ainda com uma carcaça com maior rendimento de carne. Isto sem falar na viabilidade das aves, em cujos lotes a mortalidade caiu mais de 50 %.

Toda esta evolução resultou na maior transferência de renda do produtor para o consumidor – em 1978 um kg de frango abatido custava R$ 16,32, enquanto o mesmo produto custa hoje, cerca de R$ 8,48, uma redução de 48% (deflacionado). Este ganho de eficiência econômica resultou num aumento de consumo de 5 kg/capita em 1978 para 47,5 kg em 2024. Nenhuma outra cadeia alimentar apresentou, no Brasil, maior aumento de consumo e diminuição de custo.

É importante frisar que todo este ganho foi conseguido sem o uso de qualquer hormônio ou substância nociva ao consumidor. No passado o frango era tão caro que o famoso Aparício Torelli, sob o pseudônimo “Barão de Itararé”, escreveu: Carne de galinha é tão cara, que pobre quando come um dos dois está doente. Aqui está explícito um dos grandes atestados de que carne de aves é segura para o consumo: é a proteína animal mais consumida nos hospitais mundo afora.

ABB: Supondo que a evolução dessa atividade, por mais que seja intensa, a pesquisa mundial tenha algum tipo de limite, na sua opinião? Ainda existe espaço para resultados ainda mais significativos? Que rumo pode-se prever para a Avicultura Industrial Brasileira nos próximos anos?

Alfredo Navarro: Como nos últimos anos, a preocupação ambiental e de saúde cresceram muito. Na mesma direção caminhará a avicultura. Não veremos ganhos significativos em termos de peso, mas sim de qualidade da carne e conversão alimentar. Teremos ganhos em eclodibilidade com incubadeiras mais modernas e técnicas de vacinação in ovo que garantirão maior sobrevivência nas primeiras semanas.

Ganhos importantes, na minha opinião, serão na nutrição e uso de ingredientes. Uma das restrições que ocorrerão e que são incorrigíveis é que os recursos naturais são finitos e a população humana crescente. Daí nasce a necessidade de evitar que as aves concorram com o homem como é o caso do milho e soja. As pesquisas com enzimas especiais permitirão o uso de novos ingredientes alternativos atualmente impossíveis de serem usados. Estas novas enzimas também aumentarão a disponibilidade de nutrientes hoje não digeridos ou absorvidos pelas aves.

A biotecnologia no setor de grãos mudará seu foco da resistência a insetos e maior produção para grãos com maiores concentrações de nutrientes essenciais e mais biodisponíveis. Haverá também o desenvolvimento de grãos adaptados a solos atualmente não utilizados evitando problemas de logística no atendimento de diversas áreas com carência de nutrientes.

As pesquisas de nutrigenômica permitirão a diferenciação de aptidão produtiva para aves. E farão modelos matemáticos baseados no genoma das aves para obtenção de exigências nutricionais específicas tornando as rações mais eficientes. Estes ganhos serão em todos os campos da nutrição, minerais, vitaminas, aminoácidos e aditivos nutricionais (fitoterápicos, pré e probióticos).

Veremos evoluções no campo da veterinária através da nanotecnologia e vacinas utilizando técnicas de RNA mensageiro.

Estas aves melhoradas por estas novas tecnologias, exigirão processamento melhor, embalagens inteligentes que avisarão a presença de contaminantes, estocagem e transporte em condições mais adequadas e vida de prateleira mais longa (Shelf Life).

A nova utilização de Inteligência Artificial facilitará a previsão de eventos nocivos permitindo ações preventivas mais rápidas e adequadas.

Enfim, não teremos frango de 10 kg com 10 dias de vida, mas teremos um galeto que todos poderão comer sem qualquer preocupação com sua saúde ou com o meio ambiente.

*Alfredo Navarro de Andrade – Engenheiro-Agrônomo, com Mestrado em Genética Animal e Doutorado em Nutrição Animal pela Purdue Universidade. Membro dos Conselhos Brasileiro e Latino-Americano de Nutrição Animal.