Revista Animal Business entrevista a virologista da Pesagro-Rio, Leda Kimura.
Qual o tamanho de um vírus?
O comprimento varia entre 20 e 1.000 namômetros (unidade que representa 1 milionésimo de milímetro).
Como é possível ver e identificar um vírus?
Podem ser identificados por microscopia eletrônica, por isolamento em animais, cultivo celular, PCR (reação polimerase em cadeia)
Existem muitos tipos e variedades de vírus?
Sim, existem muitos tipos e variedades de vírus. O Sistema de Classificação de Baltimore é um modo de classificação que ordena os vírus em sete grupos, com base na característica do genoma viral e na forma como este é transcrito a mRNA. Neste sistema, os vírus são assim agrupados :
Grupo I: Vírus DNA dupla fita (dsDNA);
Grupo II: Vírus DNA fita simples (ssDNA);
Grupo III: Vírus RNA dupla fita (dsRNA);
Grupo IV: Vírus RNA fita simples senso positivo ((+)ssRNA);
Grupo V: Vírus RNA fita simples senso negativo ((-)ssRNA);
Grupo VI: Vírus RNA com transcrição reversa (ssRNA-RT);
Grupo VII: Vírus DNA com transcrição reversa (dsDNA-RT).
Os vírus são seres vivos?
Um ser vivo pode ser considerado um organismo com capacidade de reproduzir-se de forma independente. A vida pode ser encarada como um conjunto complexo de processos que resultam da estimulação das instruções contidas nos ácidos nucleicos. Nos ácidos nucleicos de células vivas, essas instruções agem durante todo o tempo, no entanto, nos vírus elas somente o fazem quando o acido nucleico viral ( RNA ou DNA), depois de ter interagido a célula hospedeira e ser levada ao seu interior,tem como resultado a síntese de proteínas especificadas pelo vírus. Uma partícula viral completa, ou um virion, pode ser encarada como um bloco de material genético, envolvido ou não por uma capa que a protege do meio ambiente, serve de veiculo para sua transmissão de uma célula hospedeira para outra. Os vírus são considerados agentes patogênicos infecciosos quando os virions produzidos nacélula hospedeira são capturadas por outras células do mesmo organismo e assim causam uma infecção progressiva, com importantes alterações nas células invadidas a ponto deste organismo apresentar um quadro clínico, frequentemente culminando com a sua morte .
Como os vírus se multiplicam?
Quem replica cada partícula viral é a célula. O termo replicação viral se refere a um processo onde são feitas inúmeras cópias de vírus, no interior das células hospedeiras. É um evento primordial para perpetuação dos vírus na natureza.
As células dos homens e dos animais que atraem os vírus ou são estes que procuram as células?
O “tropismo viral” é a capacidade de epítopos em um vírus interagir com determinados receptores do exterior da célula com a qual se encontra ao acaso, e desta forma infectar especificamente determinadas células de um organismo vivo e não outras. Não existe no organismo humano ou animal, receptores específicos para vírus, por isso, eles utilizam receptores existentes para serem levados para dentro das células e a célula iniciar sua replicação. Como não possuem metabolismo próprio, o aparato enzimático da célula hospedeira é utilizado para a síntese de seus componentes e sua perpetuação na natureza.
Todos os vírus são maléficos para a espécie humana? Todos os tipos de vírus dos animais são prejudiciais para o homem?
Os receptores com os quais os vírus interagem são proteínas que fazem parte do organismo hospedeiro. Por exemplo, o vírus da Raiva se liga a receptores nicotínicos de acetilcolina na junção neuromuscular. O vírus é deslocado para o sistema nervoso central (SNC) dentro de axônios motores e axônios sensoriais por meio do transporte axonal retrógrado rápido a uma taxa de 12 -100 mm por dia.. No caso do SARS-CoV-2, um dos receptores utilizados por este vírus é a enzima conversora de angiotensina-2 (ECA-2).O vírus HIV utiliza receptores existentes nos linfócitos T CD4+.Linfócitos são um dos tipos dos nossos “glóbulos brancos” do sangue que atuam no sistema de defesa do corpo humano. Assim, esse tropismo é determinado pelos receptores já presentes em determinadas células do hospedeiro. Sendo assim os vírus podem ou não, encontrar receptores aos quais possam se ligar independente da espécie. .Alguns vírus especificamente encontram receptores em células humanas, outros em células de diferentes espécies animais e alguns produtores de zoonoses, em células humanas e de animais .
É verdade que com a aproximação dos animais selvagens para as cidades, em virtude do desmatamento, o risco de novas doenças humanas causadas por diversos novos tipos de vírus é uma realidade?
Sim, agentes causadores de zoonoses, novas ou reemergentes podem ser veiculadas através de animais silvestres .No caso do vírus da Raiva que é veiculado por quirópteros (entre outros), sabemos que na área rural é constante a presença de morcegos hematófagos devido à presença de grande fonte de alimentação para essa espécie, representada principalmente pelos bovinos. A presença de morcegos em áreas urbanas deve-se principalmente às modificações ambientais, como desmatamentos e construções que alteram os ecossistemas ocasionando procura de novas fontes de alimentos. Importante ressaltar que morcegos insetívoros, frugivoros e outros, também podem ser transmissores do agente causador da doença em questão, desde que contaminados.
Existem antibióticos ou outros tipos de medicamentos capazes de combater os vírus ou apenas as vacinas funcionam ?
Diretamente, antibióticos não são eficazes contra vírus, justamente por não serem considerados seres vivos no sentido pleno da palavra. Antibióticos podem matar bactérias que produzem substancias que promovem a interação vírus- célula e/ou sua entrada na célula, atuando assim indiretamente.
As vacinas procuram estimular o sistema imune do indivíduo vacinado, de maneira mais branda que uma infecção natural, criando uma memória imunogênica, ocorrendo uma resposta mais rápida quando o organismo entrar em contato com a partícula viral “selvagem”.
E os soros como são produzidos?
Os chamados “soros hiperimunes” são soros com concentrados de anticorpos específicos contra determinado vírus, a serem aplicados nas primeiras horas após a infecção, visando neutralizar de imediato os vírus que foram introduzidos no organismo do indivíduo. São produzidos injetando pequenas porções de vírus em um animal, de tal maneira a haver a produção de anticorpos em grande quantidade.
Quais as dificuldades em produzir vacinas contra vírus ?
As vacinas são soluções médicas eficazes para prevenir algumas infecções virais. Elas podem ser produzidas a partir de vírus inativados ou atenuados ou a partir de subunidades de proteínas virais. Uma vez introduzidos num indivíduo, os componentes das vacinas são capazes de estimular o organismo a produzir uma resposta imune humoral e/ou celular.]O indivíduo desenvolve memória imunológica quando é exposto uma ou algumas vezes aos antígenos presentes na vacina. A vacinação é empregada com o objetivo de prevenir a manifestação de doenças virais futuras. O desenvolvimento de vacinas depende fundamentalmente do conhecimento dos mecanismos imunológicos envolvidos em resposta às infecções, bem como dos mecanismos de patogênese das infecções. No caso de vírus podemos ter diferentes tipos de vacinas:
Vacinas “vivas” atenuadas
As vacinas virais com partículas capazes de serem replicadas nos vacinados tiveram como trabalho pioneiro aquele desenvolvido por Jenner, em torno do final do século XVIII, quando utilizou material obtido de lesões de pele de animais para imunizar contra a Varíola. Jenner baseou-se no fato de que ordenhadores apresentavam com freqüência lesões vesiculosas nas mãos, por contágio com bovinos com lesões semelhantes, causadas por vírus do mesmo grupo da Varíola. Ao contrário do restante da população, aquelas pessoas raramente apresentavam essa doença, de larga disseminação naquela ocasião na Europa.Pasteur criou a vacina contra Raiva, através da passagem do vírus em cérebro de coelho e posterior tratamento por métodos químicos.O ovo embrionado de galinha, introduzido na década de 1930, permitiu o cultivo de alguns vírus, como o grupo Varíola Vaccínia e o vírus da Influenza, cujas vacinas são até hoje preparadas nesse sistema. São desenvolvidas também, vacinas por deleções que representam a retirada de segmentos genômicos da partícula viral, com a eliminação de uma ou mais proteínas, conduzindo á atenuação da amostra para o hospedeiro. Ao contrário destas, temos as por inserções , nas quais fragmentos genômicos são inseridos nas partículas virais, visando à redução de sua virulência. As denominadas quimeras virais, são desenvolvidas através de partículas não existentes na natureza e que são obtidas por introdução de fragmentos de um vírus em outro, em geral, mas não necessariamente, da mesma família.
Vacinas inativadas
As vacinas inativadas oferecem como grande vantagem mais segurança, pois não há replicação do agente no organismo do vacinado, porém, tendem a estimular menos o sistema imune e por isto induzir uma imunidade menos duradoura e a exigir, com isso, a aplicação de mais de uma dose no esquema vacinal, bem como a repetição das aplicações ao longo dos anos.