Com exportação recorde e faturamento alto, a pecuária cresce sob a pressão também crescente da busca por sustentabilidade.

O Brasil nunca exportou tanta carne bovina como em 2020, impulsionada pelo consumo chinês, com 2.01 milhões de toneladas, ou 8% mais que em 2019. O faturamento atingiu US$ 8.49 bilhões, com alta de 11% segundo a Abrafrigo (Associação Brasileira de Frigoríficos).

Após dois anos de queda, o rebanho bovino voltou a crescer em 2019, segundo a última pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). São 214.7 milhões de cabeças no País de 213 milhões de habitantes.

A ligeira alta de 0,40% em relação ao ano anterior manteve o Brasil como o segundo maior rebanho bovino do mundo e o principal exportador de carne e derivados. Nesse cenário, os mercados têm cobrado mais ações de sustentabilidade no setor.

“Embora alvo de muitas críticas, algumas até com fundamento, a pecuária, precisamos reconhecer, cresceu de forma sustentável. Estamos produzindo muito mais com muito menos área”, disse Paulo Mustefaga, presidente da Abrafrigo.

Números

De 2008 a 2017, o rebanho bovino de corte passou de 166.7 milhões de cabeças para 183.7 milhões (10,10%). No período, a área de criação foi de 139 milhões de hectares para 141 milhões (1,43%).

Os números fazem parte de um estudo sobre pegada de carbono e hídrica na cadeia da carne, que integra o projeto do Instituto Escolhas intitulado ‘‘Do Pasto ao Prato: Subsídios e Pegada Ambiental da Carne Bovina”.

“Há questões a serem corrigidas, principalmente em relação a pastagens. É preciso melhorar, e o país tem potencial para aumentar mais a produção por área”, disse Mustefaga.

Equilíbrio

Segundo ele, para que isso ocorra, é preciso haver equilíbrio entre questões econômicas, ambientais e sociais.

“O econômico é o gargalo. É comum a gente ouvir palavras soltas, ‘tem de dobrar a produtividade’.  Do ponto de vista agronômico, é possível, mas, e do econômico, é viável?”, questionou o executivo, citando a necessidade de altos investimentos em pastagem e genética.

Para ele, o produtor nacional deve buscar sustentabilidade independentemente de pressões externas.

Experiência

É o que faz o pecuarista Arnaldo Manuel de Souza Machado Borges, da fazenda Ipê Ouro, em Uberaba (MG). “Meus avós eram fazendeiros, sempre tiveram cuidado de preservar reservas e nascentes, dar conforto aos animais. Cresci vendo essa necessidade”.

Na propriedade, touros ocupam áreas com sombra, o que contribui na produção de mais e melhor sêmen.
“Não é só aqui. Hoje, nos confinamentos, a maioria coloca cobertura para dar sombreamento aos animais. Os que ficam expostos a sol, chuva e vento têm carne sem a qualidade dos que estão em ambiente confortável”, disse Borges.

A fazenda de 1.000 hectares tem cinco nascentes protegidas. “Genética, que a gente desenvolve, e manejo têm de estar em perfeito equilíbrio”, destacou o produtor.

Mudança de comportamento

O setor produtivo está hoje mais interessado em garantir que o negócio não tenha impacto negativo, na visão do agrônomo Francisco Beduschi Neto, executivo da NWF (National Wildlife Federation) no Brasil. No caso da pecuária, a entidade contribui para que o setor cresça sem causar danos ao ambiente.

O engenheiro disse perceber mudança comportamental de consumidores e produtores. “Isso afunila no frigorífico, que faz o link entre sistema produtivo e consumo. Nossa abordagem é ajudar o frigorífico a entender de onde vem toda essa pressão e construir pontes entre as partes.”

Segundo Beduschi, “o frigorífico deve conhecer toda sua cadeia, não só fornecedores diretos. Saber quem vendeu o bezerro que chega ao confinamento e quem vendeu o milho para alimentá-lo”.

Problemas

“Está claro que há problemas na cadeia de produção no Brasil. Não adianta varrer a sujeira para debaixo do tapete, chegar e dizer que o País tem 66% de florestas preservadas. O consumidor vai falar: ‘Mas e queimada, desmatamento ilegal e tudo mais?’. ‘Ah, não é o agronegócio, é o grileiro’, mas está vinculado à cadeia”, comentou o especialista.

Quanto à alta nas exportações, será sustentável a longo prazo? Mustefaga disse que sim, e estima um aumento de 5% em 2021.

 

Fonte: Folha de S. Paulo

Equipe SNA